Acórdão nº 4594/06.9TTLSB.L1-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 26 de Janeiro de 2011

Magistrado ResponsávelJOSÉ FETEIRA
Data da Resolução26 de Janeiro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa I – RELATÓRIO A instaurou no Tribunal do Trabalho de Lisboa a presente acção emergente de contrato de trabalho, com processo comum, contra a ré “B, LDª”, alegando, em síntese e com interesse que, no dia 19 de Novembro de 1982, foi admitido ao serviço, por conta e sob a direcção da ré, por contrato sem termo, tendo desempenhado as suas funções de professor de desenho, educação visual e área de projecto, com zelo, aptidão e assiduidade, em regime completo.

Até Setembro de 2005 auferia o vencimento de € 2.256,32 e a partir de Outubro de 2005, auferia o vencimento base de € 1.926,54.

Em Novembro de 2005, a ré deixou de pagar a totalidade do vencimento ao autor, ficando a dever-lhe a quantia de € 1.300,00.

Em Dezembro de 2005, a ré ficou a dever-lhe € 540,96 e não lhe pagou a totalidade do subsídio de Natal, no valor de € 2.317,85.

Em 5 de Janeiro de 2006 a ré declarou que não previa a possibilidade das quantias serem pagas no prazo de 60 dias sobre a data do seu vencimento. Todavia, outros funcionários da ré recebiam a totalidade do salário.

Em 5 de Janeiro de 2006, a autora resolveu com justa causa, o contrato de trabalho que a vinculava à ré e comunicou esse facto à Inspecção-Geral do Trabalho.

Após a referida resolução de contrato, a ré contratou duas professoras, uma para a disciplina de área de projecto e outra para a disciplina de educação visual, as quais receberam a totalidade dos respectivos vencimentos.

Devido ao comportamento da ré, o autor viu-se na situação de não dispor de outros meios de subsistência e teve de se endividar, situação que o deixou profundamente traumatizado psicológica e emocionalmente, passando a perspectivar o seu futuro com muita instabilidade face à escassez de oportunidades para exercer a sua profissão quer no sector público, quer no sector privado e à sua idade de 48 anos.

Era uma pessoa calma e tranquila e passou a ter dificuldade em dormir, acorda amiudadas vezes durante a noite, manifesta grande irritabilidade, grita com os seus familiares e os seus amigos têm vindo a afastar-se progressivamente do seu convívio.

Para além dos créditos salariais, tem direito a receber uma indemnização a título de danos morais e uma indemnização por antiguidade.

Conclui que a presente acção deve ser julgada procedente e que, em consequência, a ré deve ser condenada no pagamento a título de:

  1. Créditos salariais e subsídio de Natal de 2005 - € 4.158,81; b) Indemnização por antiguidade - € 74.997,14; c) Férias e Subsídio de Férias de 2005 - € 4.347,66; d) Juros vencidos até 30.10.06 - € 2.781,92; e) Juros legais vincendos até integral pagamento da quantia em dívida.

    Frustrada a tentativa de conciliação realizada em audiência das partes e notificada a ré para contestar, veio fazê-lo, alegando, em síntese e com interesse, que é titular de um estabelecimento de ensino particular e, desde 1981, ininterruptamente, que vem celebrando com o Estado, através da DREL, contratos de associação nos termos do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo (DL n.º 553/80 de 21.11), com a finalidade de possibilitar a frequência da escola pelos alunos do ensino recorrente nocturno (3º ciclo do ensino básico e ensino secundário) nas condições de gratuitidade do ensino público.

    No ano lectivo de 2004/2005, a ré ministrou ensino a 350 alunos do ensino recorrente nocturno, previamente inscritos até Outubro de 2004 e devidamente comunicados ao Ministério da Educação (DREL). Contudo, em 14 de Julho de 2005, já no final do ano lectivo em causa, a DREL determinou que só pagaria 200 alunos.

    No ano lectivo de 2005/2006, a ré ministrou o ensino a 259 alunos do ensino recorrente previamente inscritos até Outubro de 2005 e devidamente comunicados à DREL. No entanto, em 8 de Fevereiro de 2006, já com o ano lectivo há muito a decorrer, a DREL comunicou à ré que apenas pagaria 150 alunos.

    Como é natural, atentos os compromissos assumidos com os alunos e com o pessoal contratado para o efeito, a ré ministrou ensino ao referidos 259 alunos até ao final do ano lectivo e questionou o Ministério da Educação sobre a impertinência daquela determinação de 150 alunos.

    Nunca o Ministério da Educação informou ou deu qualquer indicação de que o número de alunos a pagar seria diferente do número de alunos matriculados e nos anos anteriores a 2004/2005, sempre o Ministério da Educação aceitou e pagou o correspondente aos alunos matriculados e comunicados.

    Com o não pagamento pelo Estado, a ré ficou em sérias dificuldades financeiras e não pôde pagar atempadamente aos seus trabalhadores incluindo o autor.

    O não pagamento ao autor das suas remunerações e a resolução por alegada justa causa, devem-se, exclusivamente, ao incumprimento do Estado, pelo que a ter vencimento a presente acção e na medida em que o venha a ter, assiste à ré direito de regresso sobre aquele, pelo que deve o mesmo intervir nos autos.

    Alega ainda que até Novembro de 2005, inclusive, o autor auferia a remuneração mensal ilíquida de € 1926,54, tendo mudado de escalão em Dezembro de 2005 e passado a auferir a remuneração mensal ilíquida de € 2.256,32.

    Não é verdade que a ré não tenha rateado os valores para ordenados.

    Face à falta de pagamento do Ministério da Educação, foi acordado com todos os trabalhadores, incluindo o autor, que em Novembro de 2005, perante o dinheiro disponível, seriam pagos € 500,00 líquidos a cada trabalhador, surgindo, contudo, casos como o do autor em que se ultrapassou ligeiramente este valor por força do arredondamento face ao escalão de IRS, o que foi cumprido.

    Em Dezembro de 2005, também face ao dinheiro disponível por ausência do cumprimento pelo Estado, ficou acordado com todos os trabalhadores, incluindo o autor, que seriam pagos a cada trabalhador 65% da remuneração líquida devida, com o mínimo de € 650,00, o que foi cumprido.

    Também ficou estabelecido entre todos que não havia dinheiro para satisfazer o subsídio de Natal, subsídio que a ninguém foi pago e nos meses subsequentes manteve-se o rateio para todos os trabalhadores ainda que a partir de Março na base dos 85% da remuneração.

    A ré pagou sempre atempadamente os salários aos trabalhadores, ainda que por vezes, face aos sistemáticos atrasos de pagamento pelo Estado, tivesse de recorrer a empréstimos bancários.

    No caso presente, já não estamos perante atraso mas recusa injustificada de pagamento pelo Estado depois de lhe ter sido prestado serviço de ensino da sua exclusiva responsabilidade, faltando, com isso, dinheiro para as remunerações e para solver compromissos bancários contraídos para os ordenados anteriormente pagos.

    A ré fez tudo quanto pôde para assegurar o pagamento das remunerações a todos os seus trabalhadores, mesmo sem receber do Estado e daí que, independentemente da impugnação dos factos, nenhuns danos morais sejam devidos.

    Não existe culpa da ré e a ser devida indemnização ao autor não será pelos montantes peticionados.

    Concluiu que:

  2. Deve ser admitida a intervenção acessória, ou na modalidade que se entender, do Estado, notificando-se o autor para se pronunciar, seguindo-se a citação do chamado e os demais trâmites até final; b) Deve ser julgada improcedente a acção na parte impugnada.

    Respondeu o autor ao requerimento de intervenção acessória formulado pela ré, no sentido do mesmo dever ser julgado improcedente.

    Por despacho proferido em 04.10.2007 (fls. 114) foi admitida a intervenção do Estado Português na presente acção.

    Citado, veio o Estado apresentar contestação na qual começa por excepcionar a incompetência absoluta, em razão da matéria, do Tribunal do Trabalho para a apreciação da declaração de invalidade parcial de dois contratos de associação que a ré celebrou com o Ministério da Educação, respectivamente, em 18/8/2005 e 19/12/2005 já que os mesmos têm fim e natureza administrativos.

    Alega, por outro lado, que a ré carece de razão para requerer a intervenção provocada do Estado nos presentes autos, já que as razões pela mesma invocadas para não ter procedido ao pagamento atempado da retribuição do autor não se relacionam com qualquer conduta imputável ao Estado, mormente à DRELVT, tratando-se tal chamamento de um mera manobra de diversão para desviar a atenção do único e verdadeiro causador da situação descrita, a ré.

    A Directora Regional de Educação por despacho de 8-7-04, decidiu não renovar o paralelismo pedagógico para o ensino secundário recorrente à ré, para o ano lectivo 2004/2005 e, por despacho do Secretário Adjunto e da Administração Educativa, foi determinado que os actos que negaram paralelismo pedagógico à ré, entre outros estabelecimentos de ensino particular, produzissem efeitos apenas no ano lectivo de 2005/2006, o que, em rigor, inviabilizaria qualquer contrato de associação para o referido nível de ensino.

    Entendeu, no entanto, o Estado não inviabilizar o contrato de associação para o ano de 2005/2006, a título excepcional, considerando a existência de um paralelismo pedagógico ficcionado, para efeitos de celebração do contrato.

    Por Informação/Proposta da DREL n.º 178/05 de 18-2-05, homologada pelo referido Secretário Adjunto em 28-05-05, aquela apresentou uma proposta provisional de celebração de contrato de associação para o ano lectivo de 2005/2006 no qual se referia que o...

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