Acórdão nº 0839/10 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Janeiro de 2011

Magistrado ResponsávelCOSTA REIS
Data da Resolução13 de Janeiro de 2011
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção do Contencioso Administrativo do STA: A…, L.DA intentou no TAF de Braga contra: MINISTÉRIO DA DEFESA NACIONAL e B…, na qualidade de contra-interessada, acção administrativa especial de impugnação de acto administrativo relativo à formação de contrato, praticado pelo Sr. Almirante Chefe do Estado Maior da Armada, em 12/10/2009, que adjudicou à contra-interessada B… a construção de 5 embarcações de salvamento marítimo de média capacidade para o Instituto de Socorros a Náufragos, pedindo (1) a sua anulação e a do subsequente contrato (2) bem como a condenação do 1.º Réu a praticar novo acto de adjudicação, desta vez a favor da Autora.

Por sentença de 1/03/2010 o TAF de Braga julgou a acção improcedente e, em consequência, absolveu os RR dos pedidos formulados.

Decisão que o TCA Norte, por Acórdão de 29/07/2010, confirmou.

Foi contra este julgamento que a Autora dirigiu a presente revista onde formulou as seguintes conclusões: a) O R. abriu concurso público 32/DGAM/09) para construção de 5 embarcações destinadas ao Instituto de Socorros a Náufragos b) Em conformidade com o Caderno de Encargos o critério de adjudicação era o do preço mais baixo - b) do n.° 1 do art. 74° do CCP.

c) Também por força o Caderno de Encargos e do disposto na norma constante do n.° 3.1.3 das Especificações Técnicas (ETs.) anexas àquele os concorrentes deveriam disponibilizar, durante 15 dias, uma embarcação igual ou similar à proposta, para análise técnica e provas de mar destinadas a testar a sua fiabilidade e adequabilidade aos requisitos constantes daquelas Especificações.

d) Tais testes e provas do mar constituíam “Informação Indispensável Para Apreciação das Propostas de Fornecimento” como expressamente consta da epígrafe da referida norma 3.1.3 e) Três dos concorrentes não apresentaram qualquer embarcação, pelo que foram, de imediato, excluídos pelo Júri do concurso.

f) Só a Autora, A…: apresentou uma embarcação, construída de acordo com as exigências das ETs., tendo a outra concorrente, a contra-interessada e adjudicatária B…, apresentado não uma, mas duas.

g) Submetidas as embarcações da B… aos testes de ar exigidos pelo Caderno de Encargos e pelas ETs. a ele anexas, concluíram os peritos que as mesmas não satisfaziam os respectivos requisitos, como se pode ver do respectivo relatório transcrito nos pontos 36 e 38 destas alegações.

h) O Relatório Técnico dos peritos conclui: “Às embarcações disponibilizadas pelo concorrente “B…”, não cumprem os requisitos exigidos nos pontos 1.2.2., 1.2.3., 1.3.6., 1.3.7., 1.3.8.3., 4.1.1., 5.2.2., 5.3.2.-, 5.3.3.,.5.4.L, 7.1.9.2., 7.1.9.3., “.1.9.4., 7.2., 8.1., 8.2., 9.1.1.8., 9.1.2.. Nos diferentes testes efectuados e aferidos pelo ITEN … (ISN) e tripulação da ESV de Cascais, todos salientam a falta de segurança em mar agitado e com vento fresco, não se sentindo confortáveis para navegação em mar alteroso com ventos fortes conforme exigido nas ETs, considerando altamente perigoso utilizar esta embarcação em salvamentos com mar agitado”.

i) Ora, não obstante a violação do Caderno de Encargos e as ETs por parte da B… ao apresentar duas embarcações sem nenhuma delas, nem ambas em conjunto, obedecerem aos requisitos concursais exigidos o certo é que lhe foi adjudicado o concurso pela simples razão de ter apresentado o preço mais baixo.

j) Em contrapartida, a embarcação disponibilizada pela A., A…, como se pode ler no Relatório Técnico, “apresenta possuir todas as condições para cumprir as missões às ESVSR constantes nas ET’s do concurso público”.

k) Mas de pouco lhe valeu cumprir o caderno de encargos e as ET’s em virtude de ter proposto um preço superior, mas dentro dos limites do concurso, à contra-interessada! l) Só que o Júri e a entidade adjudicante incorreram em violação de lei, porquanto o critério de adjudicação do mais baixo preço pressupõe, necessariamente, o cumprimento do Caderno de Encargos e das ET’s, o que de forma alguma a concorrente B… observou.

m) Isto é: satisfeitos os requisitos exigidos pelo Caderno de Encargos e pelas ET’s, por todos os concorrentes, será graduado em 1° lugar e ao mesmo adjudicada a obra, aquele que ofereceu o preço mais baixo, o que não se verificou no caso vertente, pois a B… não se encontrava em igualdade de circunstâncias com a ora recorrente, como se viu.

n) A este propósito preceitua o n.º 2 do artigo 74.º do CCP segundo o qual “Só pode ser adoptado o critério da adjudicação do mais baixo preço quando o caderno de encargos defina todos os restantes aspectos da execução do contrato, submetendo apenas à concorrência o preço a pagar pela entidade adjudicante pela execução de todas as prestações que constituem o objecto daquele”, ou seja: cumprido o caderno de encargos por todos os concorrente só depois disso é sujeito à concorrência o preço.

o) Acresce que o n.° 1 do art.° 42.° do CCP “O caderno de encargos é a peça do procedimento que contém as cláusulas a incluir no contrato a celebrar”, podendo o mesmo remeter para as Execuções Técnicas (ET’s), como dispõe o art. 49° do mesmo diploma legal.

p) Por outro lado, a cláusula 1.ª do Caderno de Encargo; estatui que: “O presente Caderno de Encargos compreende as cláusulas a incluir no contrato a celebrar na sequência do procedimento pré-contratual que tem por objecto principal a aquisição de cinco embarcações de salvamento marítimo de média capacidade para o Instituto de Socorros a Náufragos, conforme especificações técnicas em Anexo ao presente clausulado”, o que significa que todos os requisitos do caderno de Encargos e das ET’s anexas têm que ser observados antes da adjudicação e antes da celebração do contrato, sob pena de se violarem os princípios constitucionais da transparência, igualdade, da concorrência leal, imparcialidade e da boa fé, tão caros ao legislador do CCP, como salientou no respectivo preâmbulo.

q) Nem se diga que as violações evidenciadas no Relatório Técnico ao caderno de encargos e às Especificações Técnicas anexas não são verdadeiras violações mas meros aspectos a adaptar e corrigir nas embarcações a fornecer já que a conformidade com as especificações definidas no caderno de Encargos será efectuada no momento da entrega das embarcações à entidade adjudicante, o que relevará apenas em sede de eventual incumprimento contratual.

r) Mas se é assim, como o entendem o R, a contra-interessada B…, e a aliás douta decisão recorrida porque razão se epigrafou a norma do n.° 3.1.3 das Especificações Técnicas anexas ao Caderno de Encargos que impõe aos concorrentes a “Disponibilização de uma embarcação, por um período de 15 dias igual ou similar à proposta, para análise técnica e provas de mar destinadas a testar a fiabilidade e adequabilidade da embarcação aos requisitos dessa especificação”, de “Informação Indispensável Para Apreciação das Propostas de Fornecimento”? Anote-se que para o Júri, entidade adjudicante e para o acórdão recorrido, os resultados dos testes e provas de mar das embarcações não constituíram informação indispensável para apreciação das propostas de fornecimento, muito antes pelo contrário. Foram inúteis, desnecessárias, ignoradas e sem interesse, o que revela o desprezo pela violação do caderno de encargos e das Especificações Técnicas anexas.

s) Mas se é assim, porque razão se excluíram 3 concorrentes por não terem disponibilizado cada um uma embarcação? Porquê, se o que interessa são as embarcações construir respeitarem o caderno de Encargos e as ET’s no entender da decisão recorrida ? t) Mas se é assim, porque razão se consagrou a norma do n.° 3.1.3 das Especificações anexas ao caderno de encargos? u) Mas se é assim, porque se exigiu a realização de provas e testes, durante 15 dias, às embarcações disponibilizadas pelos concorrentes para esse efeito, o que levou A., A…, a construir uma? v) Mas se é assim, então os concorrentes poderiam disponibilizar um barco de papelão ou de borracha! w) Mas assim sendo, disponibilizar um barco sem obedecer à maioria dos requisitos constantes do Caderno de Encargos e das Especificações anexas, como fez a adjudicatária B…, é o mesmo que não apresentar barco nenhum, pelo que o Júri deveria, desde logo, exclui-la do concurso, como fez em relação a três concorrentes.

x) Um concurso, seja ele qual for, está sujeito a regras e estas são para se cumprir, sob pena de se cometerem as maiores ilegalidades.

y) No caso vertente, ao exigir-se aos concorrentes uma embarcação igual ou similar à proposta para análise técnica e provas de mar destinadas a testar a fiabilidade e adequabilidade da embarcação aos requisitos das Especificações Técnicas - n°313 das ET’s - não foi por lapso ou sem fundamento mas para permitir à entidade adjudicante ter algo de concreto, construído de acordo com os requisitos concursais e para aquilatar da competência técnica construtora dos concorrentes e afastar do concurso um concorrente meramente curioso, sem experiência ou capacidade construtora.

z) Sem esse modelo a construção da embarcação será sempre uma incógnita, causando graves e complexos problemas a fiscalização por parte da entidade adjudicante havendo, quase sempre, alterações aos requisitos previstos nas ET’s, o que normalmente leva a um aumento de custos sob qualquer pretexto.

aa) Daí que todos os requisitos previstos no Caderno de Encargos e das ET’s têm que se mostrar satisfeitos antes da adjudicação, sob pena de se violar a cláusula 1 do caderno de encargos e o n.° 1 do art. 42° do Código dos Contratos Públicos. E abrir a porta à violação dos princípios da transparência, concorrência leal, igualdade, imparcialidade e da boa fé.

bb) Acresce que a concorrente B… apresentou duas embarcações, o que viola o ponto 3.1.3 das ET’s que só permite e impunha disponibilização de uma.

cc) Por outro lado, a mesma declarou, na sua proposta, sob compromisso de honra, que cumpria integralmente o Caderno de Encargos e, consequentemente as ET’s anexas, o que é manifestamente falso, como se referiu, pois nenhuma das...

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