Acórdão nº 0699/10 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Janeiro de 2011
Magistrado Responsável | RUI BOTELHO |
Data da Resolução | 13 de Janeiro de 2011 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I Relatório INFARMED – INSTITUTO NACIONAL DA FARMÁCIA E DO MEDICAMENTO NACIONAL veio recorrer, nos termos do artigo 150º do CPTA, do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 18.4.10, que, julgando totalmente procedente a acção administrativa especial para condenação à prática de acto devido intentada pelo A…, o condenou a proferir decisão expressa sobre o requerimento que lhe dirigiu para atribuição de licença e alvará para abertura de farmácia ao abrigo do n.° 4, da Base II, da Lei 2125, de 20 de Março de 1965 e a atribuir-lhe licença para instalação de farmácia, sujeita apenas à obrigação de apresentar a documentação que deve instruir o processo de concessão da farmácia.
Para tanto alegou, vindo a concluir como segue: 1ª O Recurso de Revista prevista no art. 150º do CPTA tem carácter excepcional, não consubstanciando uma segunda instância de recurso.
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O Recurso de Revista deve ser admitido quando cumulativamente tenha como fundamento a fundamento a violação de lei substantiva e, quando em causa esteja uma questão de relevância jurídica ou social, que revista importância fundamental ou quando a admissão de recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação de direito.
Com efeito, 3ª O âmbito da discussão nos autos, quanto a saber a que critério está ou não o INFARMED obrigado a pronunciar-se quando solicitado o pedido de instalação de farmácia privativa, corresponde ao requisito de relevância social.
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O requisito de relevância social tem em vista abranger questões que tenham impacto na comunidade social, seja pela matéria em causa (ambiente, saúde, etc.), seja porque a questão colocada possa ter incontroversa aplicabilidade a um universo alargado de outros casos, extrapolando-se assim a aplicação a outros casos.
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Acontece que, a questão suscitada perante o Supremo Tribunal Administrativo preenche o requisito da relevância social nas duas acepções, porque por um lado estamos a tratar da cobertura medicamentosa, questão relacionada com a saúde pública, e por outro, porque a sua abrangência extrapola o caso concreto.
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Nos autos em análise verificam-se o elemento da relevância social e a invocação da violação da lei substantiva, pelo que estão reunidos os pressupostos de admissibilidade do presente recurso de revista.
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A Base II da Lei n.° 2125, de 20 de Março de 1965, começa por estabelecer e distinguir dois momentos essenciais nas farmácias de oficina: (1) o que é necessário para se pôr em funcionamento uma farmácia - deter um alvará; (2) quem pode deter tal alvará - o proprietário da farmácia/quem pode ser proprietário de farmácia.
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Nesta decorrência, e excepcionalmente, o n.° 4 da mesma Base II vinha dispor que as Misericórdias e as instituições de assistência e previdência social podiam ser proprietárias de farmácias, em expressa derrogação da restrição genérica ao direito de propriedade de farmácia a não farmacêuticos, ficando limitadas aos seus serviços privativos.
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Complementarmente, o n.° 5 determinava os termos em que seriam atribuídos alvarás às farmácias supra excepcionalmente detidas: quando houvesse interesse público na sua abertura e não houvesse farmacêutico interessado na sua instalação.
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Assim a atribuição de alvará a farmácias privativas implicava a interpretação e junta dos n.°s 4 e 5 da Base II, prevendo o primeiro destes preceitos a de Misericórdias a possibilidade de Misericórdias e instituições de assistência e previdência social serem proprietárias de farmácias e o segundo os termos em que lhes podia ser atribuído alvará.
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A letra dos preceitos (n.° 4: “as misericórdias e outras instituições de assistência (...) poderão ser proprietárias de farmácias...”; n.° 5: “poderá ser passado alvará às instituições de assistência (..)”) e a sua ratio e sistematicidade na própria Base II (assentes na distinção que já vinha dos nos anteriores, entre propriedade de farmácia e funcionamento de farmácia mediante alvará) impunha esta complementaridade interpretativa.
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Em especial, a tese da Recorrida sufragada pelo Tribunal a quo, em reservar o âmbito de aplicação do n.° 5 a situações de falta de provimento pelas farmácias regulares das necessidades de determinada população não só força a letra e a teleologia da norma, criando implícita e consequentemente uma excepção à já excepcional propriedade de farmácias por parte daquelas entidades, como retira qualquer âmbito de aplicação à Base VI da mesma Lei. Neste sentido, concluíram igualmente o Ministério Público junto deste venerando Tribunal, em parecer de 21/06/2006, proferido no Processo n.° 00648/04.4BEPRT, e os Professores Diogo Freitas do Amaral e Carla Amado Gomes.
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Depois, in casu, dado o excesso de farmácias no local onde a Recorrida pretendia instalar a sua, manifestamente capazes de responder às necessidades dos beneficiários daquela, não havia interesse público em atribuir o referido alvará, não ficando, assim, preenchidos os pressupostos do n.° 5 da Base II da Lei n.° 2125.
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Pelo que, andou mal o Tribunal a quo ao condenar o INFARMED à prática de um acto que não é de todo devido, uma vez que no cumprimento do principio da legalidade a que o INFARMED está sujeito, não lhe era possível atribuir o alvará à Recorrida, sendo legal e válido o acto de indeferimento do seu pedido. Com o Douto suprimento deste Venerando Tribunal, deve o presente recurso ser considerado procedente e alterado o Acórdão Recorrido, Só assim se fazendo a tão acostumada Justiça A recorrida contra-alegou formulando as seguintes conclusões: 1. Os nºs 4 e 5 da Base II da LPF têm campos de aplicação distintos, o primeiro respeita a farmácias privativas enquanto...
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