Acórdão nº 394.05.1TBMGL.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Novembro de 2010

Magistrado ResponsávelÁLVARO RODRIGUES
Data da Resolução25 de Novembro de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA DA AUTORA E CONCEDIDA A DOS RÉUS Sumário : I- Os gerentes são os legais representantes das sociedades comerciais – artº 252º nº 1 do Código das Sociedades Comercias – sendo que a prestação debitória deve ser feita ao credor ou ao seu representante, nos termos do disposto no artº 769º do Código Civil.

II- Cabendo a representação de uma sociedade por quotas aos gerentes, as prestações efectuadas à pessoa de um gerente, para pagamento de dívida à sociedade sob a sua gerência e que foram aceites por este, não deixam de ser vinculativas para a própria sociedade, pois, ainda que o artº 769º do Código Civil não existisse, sempre seria de ter em atenção que, como ensina o Prof. Pereira de Almeida «a sociedade só não ficará vinculada se provar – o ónus da prova compete-lhe – que o terceiro sabia ou não podia ignorar, que o acto era estranho ao objecto social» (Pereira de Almeida, Sociedades Comerciais, 3ª edição, Coimbra Editora, 270).

Decisão Texto Integral: Acordam no SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: RELATÓRIO AA - Materiais de Construção, Lda instaurou a presente acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra BB e sua ex-mulher CC, todos com os sinais dos autos, pedindo a condenação dos Réus a pagar à Autora a quantia de €105.272,47 acrescida dos juros de mora vencidos no montante de €31.382,56, bem como dos que se venceram na pendência da presente acção até efectivo e integral pagamento, sobre aquela quantia, à taxa que se revelar legalmente aplicável.

Fundamentou a sua pretensão alegando, em suma, que no exercício da sua actividade comercial vendeu ao Réu diversos produtos do seu comércio, no valor total de €105.272,47, com vencimento na data de emissão das respectivas facturas, mas que a demandada não pagou, ascendendo os juros contadas à taxa legal supletiva ao montante de € 31.382,56.

Dívida contraída pelo Réu no concretizado proveito comum do casal que então formava com a Ré, donde a responsabilidade de ambos.

Contestaram os Réus, defendendo-se por impugnação no tocante às facturas nºs 2240, 2221, 2222 e 2224 e excepcionando, no mais, o cumprimento/pagamento da dívida.

Replicou a Autora, impugnando a matéria de excepção.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, por provada e, em consequência, condenou os Réus a pagar solidariamente à Autora o montante que vier a ser liquidado correspondente ao preço não pago dos produtos referidos em 2) e 18), acrescido de juros de mora, à sobredita taxa legal, desde a respectiva liquidação definitiva até integral e efectivo pagamento.

Inconformadas, ambas as partes recorreram da sentença para o Tribunal da Relação de Coimbra que, todavia, julgou improcedentes as respectivas Apelações confirmando a sentença recorrida.

Novamente inconformadas, as mesmas partes vieram interpor recursos de Revista para este Supremo Tribunal de Justiça, rematando as suas alegações, com as seguintes: Conclusões da Autora/Recorrente: I - Considerando a sentença de Primeira Instância, confirmada em Segunda Instância, que "Vale isto dizer que não só a Autora não conseguiu liquidar a totalidade do crédito que se arrogava, embora sempre superior a €93.670,85, como os RR. não lograram liquidar a medida do seu cumprimento, ...".

II - Equivale isto a dizer que a autora/recorrente conseguiu provar ser possuidora de um crédito, sobre os réus, no montante líquido de pelo menos €93.670,85.

III - Ora, não tendo resultado provado o acordo entre autora/recorrente quanto à existência de um prazo de vencimento das facturas, que titulam os fornecimentos efectuados por aquela aos réus, sempre deveriam estes ter sido condenados a pagar à autora juros de mora, às taxas comerciais sucessivamente em vigor, calculados sobre o capital de €93.670,85, a contar da citação dos réus para a presente acção e até efectivo e integral pagamento.

IV - Não tendo os réus sido condenados nos termos sobreditos, violaram os tribunais de Primeira e Segunda Instância o disposto nos artigos 805° e 806° do C.C., artigos estes que são de aplicação automática.

V - Perante os factos dados como assentes nos autos, sempre se acham preenchidos, pelo menos, na data de instauração da acção os elementos previstos nas alíneas a) e b) do artigo 4° do Decreto Lei 32/2003, de 17 de Fevereiro, VI - Na medida em que nesse momento foi alegado pela autora e não contraditado pelos réus a existência dos fornecimentos e a entrega das facturas de, pelo menos, € 93.670,85 Conclusões dos Réus/Recorrentes: 1º) Salvo o devido respeito por entendimento diverso, no douto Acórdão recorrido, como aliás já na douta sentença de 1a Instancia: a) confunde-se cumprimento da obrigação (que "in casu", corresponde ao pagamento do crédito reclamado pela A./recorrida) com imputação do cumprimento ( que, no caso "sub judice” corresponde à finalidade dos pagamentos efectuados pelos RR/recorrentes) e, até por isso, subvertem-se os respectivos regimes de repartição do ónus de prova; ou b) subsidiariamente, desconsiderou-se Indevidamente o regime da imputação legal supletiva previsto no artº 784° do CC. Efectivamente, 2º) Atento o disposto nos artºs 762°, n.° 1 e 342° do CC, aos RR. cumpria apenas demonstrar a entrega de dinheiros de valor suficiente para cobrir a dívida apurada nos autos, o que cumpriram cabalmente, já que, como resulta provado dos autos, "os RR. entregaram ao sócio gerente da A, a quantia de € 190.564,45 por conta e para pagamento dos fornecimentos de que deriva a dívida exigida nos autos" - no montante de capital de € 105.272,47 - (embora não se lograsse apurar em que medida concreta aquela quantia serviu para liquidar a dívida) (cfr. anterior ponto 16 e certidão de fls. 209 e ss); 3ª) Por outro, nos termos do artº 769° do C.C. ao R. era legitimo efectuar a prestação na pessoa do legal representante da A., o que também resultou provado; ainda que assim se não entendesse, in casu, atento o facto de AA se relacionar com o R. indistintamente na qualidade de gerente da A. e a título pessoal, sempre se justificaria a desconsideração da personalidade colectiva da A., confundida com o seu gerente AA, para assim se considerar que os pagamentos efectuados pelo R. foram feitos a quem tinha legitimidade para os receber; esta consideração é ainda imposta princípio da boa fé (artº 762°, n°2 do C.C.), que rege o cumprimento das obrigações e vincula quer o credor, quer o devedor.

4ª) Diferentemente, de acordo com o disposto no artº 342º da CC, era sobre a A. - e não sopre os RR. - que recaía o ónus da prova da diferente Imputação dos pagamentos efectuados pelo R., enquanto circunstância impeditiva do efeito extintivo dos mesmos em relação à divida reclamada; é que, 5ª) Sempre que um devedor excepciona o pagamento da dívida exigida em Juízo, o credor/autor, que negue a imputação desse pagamento a essa divida, não pode limitar-se a alegar e provar a existência de outras dívidas do mesmo devedor, mas...

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