Acórdão nº 3018/06. 6 TVLSB. L1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Novembro de 2010

Magistrado ResponsávelGONÇALO SILVANO
Data da Resolução25 de Novembro de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : I-O pedido de pagamento do relativo ao sinal entregue num contrato-promessa pressupõe que implicitamente foi pedida também a inerente resolução do contrato.

II- À luz dos princípios gerais enunciados quanto ao que deve entender-se no cumprimento das obrigações inerente a um contrato –promessa bilateral, quando, nos deparamos perante o incumprimento do contrato imputável, em igual medida, a ambos os contraentes (por condutas de incumprimento semelhantes),o contrato deve ser resolvido, tendo por base as normas gerais, pela compensação de culpas concorrentes, face ao disposto no artº 570º do CC.

III-A aplicação desse princípio traduz-se na restituição em singelo à parte que entregou o sinal (o tradens) ,pois não se vê a que título possa a parte que recebeu o sinal (o accipiens) reter legitimamente o sinal e reforços que lhe foram entregues.

IV-Esta restituição, não reveste natureza indemnizatória, sendo antes mera consequência da resolução, equiparada, quanto aos efeitos, à nulidade ou anulabilidade (artºs 433º e 434º do CC), que tem eficácia retroactiva, pelo que deve ser restituído tudo o que tiver sido prestado (artº 289º,ex-vi artº 433º do CC).

Decisão Texto Integral: Acordam neste Supremo Tribunal de Justiça: 1-Relatório F...& P..., Ld.ª instaurou contra T... – Clube Internacional de Férias, S.A.

a presente acção declarativa com processo ordinário, pedindo que esta seja condenada a pagar-lhe a quantia de €1.294.879,34 e juros legais desde o incumprimento definitivo da obrigação que assumiu (25 de Novembro de 1999) até ao efectivo pagamento, bem como em custas e procuradoria.

Para tanto e em síntese alegou (tal como se relatou no acórdão da Relação que aqui se acompanha), ter celebrado com a ré, em 20.03.1989, um contrato de promessa de compra e venda de um prédio rústico sito no lugar da Amoreira, freguesia do Alvor, concelho de Portimão, de que esta era proprietária.

O preço da prometida venda foi fixado em 230.000.000$00, devendo o prédio ser entregue livre de quaisquer ónus ou encargos e sem que sobre ele recaíam quaisquer direitos de terceiros, sejam de que natureza forem.

Alegou a autora ter entregue à ré, no acto de outorga do referido contrato, a título de sinal e princípio de pagamento, a quantia de 50.000.000$00,sendo que os restantes 180.000.000$00 a pagar em nove prestações sucessivas que constituiriam reforços de sinal, a liquidar nos prazos e montantes seguintes: - Em 30.06.1989: - 12.000.000$00; - Em 30.09.1989: - 24.000.000$00; - Em 30.12.1989: - 24.000.000$00; - Em 30.04.1990: - 19.800.000$00; - Em 30.08.1990: - 19.800.000$00; - Em 30.12.1990: - 20.400.000$00; - Em 30.04.1991: - 19.800.000$00; - Em 30.08.1991: - 19.800.000$00; - Em 30.12.1991: - 20.400.000$00.

As prestações correspondentes aos sucessivos reforços de sinal foram tituladas por letras aceites pela autora.

Mais alegou a autora que a escritura de compra e venda deveria ser celebrada em Cartório Notarial de Lisboa, em dia e hora a designar pela ré, durante o mês de Março de 1990, cabendo ainda à ré avisar a autora com, pelo menos, quinze dias de antecedência, por meio de carta registada com aviso de recepção, a enviar para o domicílio desta última. E a fim de o prédio estar livre e desocupado não só aquando da celebração da escritura – Março de 1990 – mas antes disso, ficou expressamente consignado na cláusula 3.ª do contrato de promessa, constituindo condição essencial do negócio, que o quinteiro e sua família teria de abandonar o prédio até 30.09.1989, dele retirando haveres e pertences, frutos e animais.

No entanto, chegado o dia 30.09.1989, a ré não tinha o imóvel liberto do quinteiro e sua família, tendo a autora, através do seu mandatário, remetido à ré uma carta em que chamou a atenção desta para o facto de o quinteiro ainda não ter abandonado o prédio, o que começava a constituir sério embaraço.

A autora sustentou ainda que, talvez por não ter o imóvel livre e desocupado, a ré, no decurso do mês de Março de 1990, não promoveu, como expressamente se obrigara, a celebração da escritura de compra e venda, mas dadas as boas relações e a muita consideração que tinha para com a administração da ré, a autora continuou a pagar os reforços de sinal de 30.06. e 30.12 de 1989 e ainda pagou o reforço do sinal que se vencia em 30.04.1990.

Porém, chegado que foi o final do mês de Agosto de 1990 – onze meses após a mora da ré, no que se referia à sua obrigação de libertar o imóvel da ocupação que dele fazia o quinteiro e cinco meses após se constituir em mora no referente à celebração da escritura de compra e venda – a autora viu-se na necessidade de suspender o pagamento das prestações, face à atitude da ré.

Pagou, assim, a autora à ré, de 20.03.1989 a 30.04.1990, de sinal e seus reforços, a quantia de 129.800.000$00.

Finalmente alegou a autora que foi surpreendida, em Janeiro de 2003, em plena audiência de julgamento no âmbito de uma acção de execução específica para entrega do imóvel em causa que intentara contra a ora ré, que esta o vendera, em 25.11.1999, por escritura celebrada, não em Grândola, nem em Lisboa, mas no 6.º Cartório Notarial do Porto à sociedade A... – Investimentos Turísticos, S.A. a qual no próprio dia o permutou com S... – Sociedade de Investimentos Hoteleiros, S.A.,sendo que cerca de um mês depois, em 21.12.1999, a última adquirente celebrou finalmente um acordo com o quinteiro, pelo qual, mediante uma indemnização de 25.000.000$00, este se obrigou a abandonar a propriedade até 27.04.2000.

Concluiu a autora que com a venda do referido imóvel, a ré incumpriu definitivamente o contrato celebrado consigo e que tal incumprimento definitivo foi posterior à propositura daquela acção de execução específica pois só se deu em 25.11.1999 com a venda do imóvel objecto do contrato promessa à sociedade A... – Investimentos Turísticos, S.A.,adiantando ainda que o crédito da autora, emergente do incumprimento definitivo, é posterior à sentença homologatória da medida de Gestão Controlada da ré, proferida em 27.11.1997, pelo que não está abrangido pela moratória de cinquenta anos prevista naquela medida.

E tendo a ré incumprido deliberada e definitivamente o contrato de promessa de compra e venda que celebrou com a autora, constituiu-se na obrigação de restituir a esta, em dobro, o sinal e reforços recebidos.

Em contestação a ré pugnou pela improcedência da acção tendo alegado, em síntese, que só a debilidade da sua tesouraria e a premência de obter fundos para poder cumprir com alguns dos seus compromissos, nomeadamente, o pagamento pontual dos salários dos seus trabalhadores, é que a levou a celebrar com a autora o contrato promessa de compra e venda a que aludem os autos.,pois era sua intenção que a compra e venda fosse efectuada de imediato e que o preço acordado fosse pago de imediato.

Contudo, a falta de liquidez da autora para poder pagar, no imediato, a integralidade do preço entre elas acordado e a existência de um quinteiro instalado no imóvel, impediram que tal compra e venda fosse efectuada de imediato.

Por outro, dado que a autora pretendia levar a cabo a construção de um imóvel para o qual ainda não dispunha nem de plano de urbanização nem das licenças necessárias, acabaram, segundo alega, por acordar que, para obviar às prementes dificuldades financeiras da ré, o preço seria titulado por letras de câmbio aceites pela autora que seriam, de imediato, apresentadas a desconto bancário, a fim de dotar a ré da liquidez que necessitava.

Alegou a ré que, quanto ao quinteiro, acordou com a autora que seria a ré a pagar-lhe toda e qualquer indemnização que ele pretendesse para desocupar o imóvel, no entanto, caberia à autora fazer as diligências e negociações com vista a obter o seu acordo e da sua família para efectuarem a desocupação, tendo sido mesmo a autora que informou a ré que o quinteiro só se dispunha a sair do imóvel após 30.09.1989 que foi a data que veio a constar da cláusula 3.ª do contrato.

Também alegou a ré que a existência do quinteiro no imóvel não era impedimento para que a autora pudesse iniciar terraplanagens ou qualquer tipo de infra-estruturas, existindo entre esta e o quinteiro uma relação bastante cordial que levava a que a autora pudesse entrar à vontade no imóvel e nele permanecer, o mesmo não sucedendo com qualquer representante da ré.

Porém, chegados a 30.09.1989, ninguém havia transmitido à ré qual o montante a ser pago ao quinteiro, a fim de que a autora tentasse obter o valor necessário para efectuar o pagamento, tendo esta só no final de Agosto de 1990 solicitado a colaboração da ré com vista a tentarem lograr obter a desocupação do imóvel.

A ré reconheceu que embora não tenha marcado a escritura de compra e venda durante o mês de Março, também a autora não efectuou qualquer diligência junto da ré no sentido de fazer cessar a sua mora e/ou transformá-la em incumprimento definitivo ou tão simplesmente no sentido de a interpelar para promover a marcação da escritura.

Finalmente alegou a ré Alega que, em 27.08.1990, a autora enviou-lhe uma carta através da qual informa que o plano de urbanização já está concluído, constituindo, nessa data, a permanência do quinteiro no imóvel uma dificuldade e na sequência dessa carta datada de 27.08.1990, a autora não pagou junto do banco o seu aceite com vencimento em 30.08.1990, criando uma situação aflitiva para a já preocupante situação financeira da ré que se viu contactada pelo banco para proceder ao pagamento do aceite da ré, vencido em 30.08.1990, o mesmo sucedendo com as prestações de 30.12.1990, 30.04.1991, 30.08.1991 e 30.12.1991.

A ré, em 18.02.1991,enviou à autora carta registada com aviso de recepção nos termos da qual considerava o contrato incumprido em definitivo pela autora com a consequente perda do sinal e das prestações subsequentes e refere ainda a ré que, na mesma data em que é citada (25.11.1999) para a acção de execução específica...

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