Acórdão nº 0642/10 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Novembro de 2010
Magistrado Responsável | ANTÓNIO CALHAU |
Data da Resolução | 10 de Novembro de 2010 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo tribunal Administrativo: I – A…, Lda., com os sinais dos autos, não se conformando com a sentença da Mma. Juíza do TAF de Leiria que julgou totalmente improcedente, por não provada, a impugnação judicial por si deduzida contra as liquidações de IVA e respectivos juros compensatórios referentes ao primeiro trimestre do ano de 2005, e, em consequência, absolveu a AT do pedido, dela vem interpor recurso para este Tribunal, formulando as seguintes conclusões:
-
A impugnante desde 1998 procedeu à construção e instalação de equipamento para lar de idosos, após o que iniciou a prestação de serviços em Janeiro de 2002 liquidando IVA sobre as prestações de serviços e deduzindo o IVA que havia sido cobrado a montante.
-
Durante três anos a impugnante liquidou IVA aos seus utentes que entregou à Administração Fiscal.
-
Por ter sido concedido alvará em Março de 2005, tal obrigava a sua passagem ao regime de isenção tendo-lhe sido comunicado pela administração fiscal que a alteração do seu regime de tributação implicava a regularização do IVA deduzido relativamente a bens e investimentos cuja utilização perdurasse no tempo.
-
A AT fundou o seu entendimento no art.º 3.º, n.º 3, al. g) do CIVA que sujeita a imposto “A afectação de bens por um sujeito passivo a um sector de actividade isento (…) quando, relativamente a esses bens ou aos elementos que os constituem, tenha havido dedução total ou parcial de imposto”, norma em que a mesma se sustenta para basear a bondade da liquidação.
-
Ora, a verdade é que em 2005 não houve afectação dos bens à actividade que a impugnante continuou a exercer pois que essa afectação ocorreu logo que o prédio foi construído e os equipamentos instalados.
-
Tal prédio e equipamento foram afectos à actividade logo aquando do início das prestações de serviços em Janeiro de 2002 e estiveram ininterruptamente ao serviço desta actividade de exploração de lar de idosos sem qualquer alteração em 2005 ou em qualquer outra data até à actualidade.
-
Sustentar-se que ocorreu uma “afectação a um sector de actividade” em 2005 é uma ficção que não tem qualquer correspondência com a realidade, porquanto a expressão “afectação a um sector de actividade” significa um bem passar a estar adstrito a uma actividade, o que não se passou com os bens em questão que há anos estavam adstritos à mesma (não se pode afectar uma coisa que já está afectada).
-
Esta ficção não é sustentada na lei nem autorizada por ela.
-
Embora o art.º 3.º do CIVA ficcione a existência de transmissões que na realidade para o direito civil não existem, de que é exemplo a própria al. g) do n.º 3 do art.º 3.º, estas ficções são legítimas porque previstas na lei.
-
Mas não é admissível que, em cima destas ficções, o intérprete crie outras que nele não estão previstas em clara violação dos princípios da legalidade e da tipicidade fiscal.
-
Também não é justificável qualquer raciocínio de tipo extensivo ou analógico, o primeiro porque o elemento literal o não permite, sendo claramente a norma dirigida para sujeitos passivos mistos, o segundo porque a norma tem por objectivo evitar a evasão fiscal deste tipo de sujeitos passivos, através da manipulação de afectações de bens entre o sector sujeito e o sector isento de IVA.
-
Esta manipulação não pode acontecer no caso de afectação obrigatória como é o caso da impugnante pois esta não teve nem tem qualquer possibilidade de escolha já que a mudança de regime é obrigatória já que a isenção em causa não permite renúncia.
-
Ademais, no caso em presença, a liquidação em causa é flagrantemente injusta pois que desconsidera completamente o facto de durante três anos a actividade da impugnante ter estado sujeita a IVA, tendo os bens em questão contribuído para a prestação de serviços dos quais resultaram imposto a favor do Estado.
-
...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO