Acórdão nº 00516/05 de Tribunal Central Administrativo Sul, 10 de Maio de 2005
Magistrado Responsável | Eugénio Sequeira |
Data da Resolução | 10 de Maio de 2005 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
A. O Relatório.
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J...e mulher, M..., identificados nos autos, dizendo-se inconformados com a sentença proferida pela M. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa - 2.º Juízo - que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida, veio da mesma recorrer para este Tribunal formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem: 1. A sentença recorrida não confere qualquer relevância ao depoimento das testemunhas ouvidas, 2. Tal como não indica sequer as razões por que não valorizou o respectivo depoimento, não fazendo pois o exame crítico das provas que lhe cumpre conhecer.
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As testemunhas tinham conhecimento directo dos factos, mostrando-se o seu depoimento relevante para a boa decisão da causa e, aparentemente, terá sido "esquecido" pelo Tribunal "a quo".
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A sentença recorrida violou assim o disposto no art. 659° n° 3 do C.P.C..
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O Tribunal "ad quem" pode alterar a matéria de facto fixada pela 1ª instância uma vez que do processo constam todos os elementos que serviram de base à decisão recorrida, sendo também certo que o depoimento das testemunhas se mostram devidamente transcritos - art. 712° n° 1 al. a) do C.P.C..
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O próprio contrato com fundamento no qual foi efectuada a liquidação oficiosa de IRS refere expressamente na sua cláusula 2ª que a quantia de Esc. 23.400.000$00 se refere não apenas à contrapartida pela cessão, mas à liquidação das quantias entregues por J..., 7. O que só por si não permitia imputar a totalidade daquela quantia à contrapartida da cessão de exploração.
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Do próprio teor do contrato outorgado em 26/10/93 resulta provada a existência de um empréstimo de J....
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Existe pois contradição entre as alíneas P) e Q) dos factos provados com a conclusão de que não se mostra provada a existência de qualquer empréstimo.
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Padece de erro de raciocínio, face quer aos factos dados como provados, quer ao integral teor do contrato de 26/10/93, a conclusão vertida na sentença recorrida que tudo indica que a exploração pecuária era dos dois, devendo-se entender que as verbas recebidas são provenientes da cedência da quota parte do impugnante na exploração.
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Se tal factualidade existia ou melhor, esperava-se que viesse a existir, aquando da celebração do acordo celebrado em 1990, o certo é que a mesma deixou de existir com o acordo celebrado em 1993 - alínea M) dos factos provados.
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E foi precisamente porque foi revogado o acordo de 1990 que, no contrato de 1993, as partes acordaram e acertaram as quantias que C... devia a J..., tendo-as feito reflectir no contrato em causa.
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Padece assim a sentença recorrida de manifesto erro na apreciação da prova.
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Existem letras juntas aos autos e respectivos documentos bancários atestando a titularidade da conta onde foram debitadas que não foram consideradas pela sentença recorrida.
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A letra de DM 144.961,64 foi paga através da conta titulada por J... e as letras de DM 31.193,75 e DM 116.064,38 pagas pela conta titulada pelo impugnante e C... (presumindo-se, no mínimo, que as quantias depositadas/pagas pertencem a ambos, em parte iguais), mostrando-se tal facto devidamente provado nos autos.
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A sentença recorrida não releva o pagamento da letra de DM 114.961,64, porquanto "não se sabe a que respeita tal importância" e não interessa em princípio aos autos porquanto a letra foi paga em 29/07/93 e os rendimentos objecto de liquidação de IRS respeitam a 1995 e 1996.
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Consta dos autos documento emitido pelo BCA atestando que aquelas letras respeitam a aquisição de novilhos.
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Foi precisamente pelo facto de a letra ter sido paga pelo impugnante em 29/07/93, que a mesma foi reflectida no contrato outorgado posteriormente - 26/10/93 - como dívida de C... ao impugnante e o que está em causa são as quantias referidas neste mesmo contrato de 26/10/93! 19. Verifica-se assim existir erro notório na apreciação da prova - art. 669º n° 2 als. a) e b) do C.P.C..
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É irrelevante o facto de as restantes letras terem sido feitas, formalmente, por sociedades de que o impugnante era sócio, sendo que o acerto de contas com as referidas sociedades é perfeitamente alheio aos presente auto.
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Tanto que C... se confessou devedor do impugnante por aquelas quantias e como tal foram reflectidas no contrato.
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O impugnante não recebeu qualquer quantia como contrapartida da cessão, referindo-se antes tal quantia exclusivamente a valores emprestados ao C... e que o impugnante pretendia receber, tendo cedido a propriedade por forma a permitir que o devedor, com a exploração, lhe pudesse liquidar a dívida.
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O que se mostra demonstrado quer pela prova documental junta, quer pelo depoimento das testemunhas ouvidas.
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Cabia à Administração Fiscal fazer prova da existência do facto tributário, o que não logrou fazer - o contrato em que se fundamentou refere aquela quantia também como liquidação das quantias entregues pelo impugnante a C....
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Toda a prova produzida pelo impugnante - documental e testemunhal - é, no mínimo, suficiente para suscitar fundadas dúvidas acerca da existência e quantificação do facto tributário, 26. Pelo que, nos termos do art. 100° do C.P.P.T., deveria o acto impugnado ter sido anulado.
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Aliás, não foi por mero acaso que a Digna Procuradora da Républica se pronunciou no sentido da procedência da impugnação, atento o princípio vertido no citado art. 100° do C.P.P.T.
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A sentença recorrida violou o disposto nos arts. 659° n° 3, 668° n° 1 als. b), c) e d), art. 669° a) e b) do C.P.C., art. 74° da LGT e art. 100° do CPPT.
Termos em que, Deverá o presente recurso ser julgado procedente, revogando--se a decisão recorrida, com o que se fará Justiça! Foi admitido o recurso para subir imediatamente, nos próprios autos e no efeito meramente devolutivo.
O Exmo Representante do Ministério Público (RMP), junto deste Tribunal, no seu parecer, pronuncia-se por ser negado provimento ao recurso, por caber aos recorrentes provar a existência do referido empréstimo, não lhe bastando lançar a fundada sobre a sua existência.
Foram colhidos os vistos dos Exmos Adjuntos.
B. A fundamentação.
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A questão decidenda. São as seguintes as questões a decidir: Se deve ser alterada a matéria de facto contida no probatório no sentido proposto pelos recorrentes nas suas várias alíneas das conclusões do recurso; Se a AT logrou efectuar o ónus probatório que sobre si impendia quanto à existência dos factos tributários; E se os recorrentes lograram, colocar em dúvida séria, fundada, tais pressupostos em que assentaram os actos de liquidação em causa.
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A matéria de facto.
Em sede de probatório, a M. Juiz do Tribunal "a quo" fixou a seguinte factualidade, a qual igualmente na íntegra se reproduz: A) - Entre o impugnante, Joaquim António Coelho Palminha, e António C... da Silva foi efectuado, em 4 de Julho de 1990, o "Acordo" escrito de fls. 27 a 28, que se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais; B) - Nesse "acordo", declara-se que o impugnante é o dono e possuidor dos prédios rústicos denominados "Courela do Sorraia" e que António C... da Silva " é o requerente do projecto metido ao IFADAP para uma exploração pecuária a instalar no terreno do 1°", ou seja do impugnante (n.ºs 1° e 2º do escrito); C) - No mesmo acordo foi declarado por ambos os subscritores que o impugnante entraria com a cedência do terreno durante a vigência do contrato e que António C... da Silva entrava com o seu trabalho e experiência, não remunerada, para a exploração agrícola, bem como que todas as despesas e receitas, na 1ª fase, seriam sempre aprovadas, pagas e recebidas em percentagens iguais por ambos (nº 3, als. a a c); D) - Os subscritores ainda declararam que "Logo que o financiamento do IFADAP esteja concluído, e que não haja qualquer inconveniente de qualquer natureza, ambos os intervenientes constituirão uma sociedade de exploração pecuária, com nome e pacto social a designar, e a aprovar com quotas iguais, e iguais poderes, que ficará a fazer a exploração no devido terreno enquanto durar a cedência do terreno, de acordo com o projecto, e, se os seus sócios não decidirem terminar atempadamente." (al. f do nº 3); E) - No mesmo "acordo" os subscritores ainda declararam que "No acto da escritura da referida sociedade, será feito contrato de cedência do terreno do 1 ° para a sociedade de acordo com o texto deste contrato."; F) - Dá-se por reproduzido o documento de fls. 29 a 30, constituído por uma fotocópia de uma carta do impugnante endereçada ao Banco Comercial Português, onde o impugnante pede o aval bancário do mesmo Banco para as letras a aceitar ao vendedor de 74 novilhas (primeiro 37 e cerca de seis meses depois mais 37), sendo quatro as letras: 57.627,5 f x 80$00= 4.610 c com vencimento em Setembro/92 41.844,69 f x 80$00 = 3.347 c com vencimento em Setembro/93 38.691,13 f x 80$00 = 3.095 c com vencimento em Setembro/94 35.531,56f x 80$00= 2.892 c, com vencimento em Setembro/95, tudo num total de 13.944 contos (fls. 30); G) - O impugnante informa o Banco, no mesmo documento, de que: "pretendo fazer na minha propriedade de Courela do Sorraia, Couço, Coruche, uma exploração pecuária em sociedade com o Sr. António C... da Silva. Eu dou o terreno, projecto e demais demarches e o Sr. C... a mão de obra local e assistência permanente.
Foi metido em nome do Sr. António C... da Silva, por ser considerado jovem agricultor, um projecto ao IFADAP, que mereceu aprovação, tendo sido concedido a importância de 7.533.065$00 (. . . . . . .) a fundo perdido, conforme fotocópia de documento anexo (doc. 1).
Destina-se esta verba à aquisição de tractor (já na exploração) e uma ordenha mecânica para 12 novilhas em simultâneo.
Pretendemos agora adquirir 37 novilhas e mais tarde - 6 meses após - mais 37 cuja proposta se anexa (doc. 2) em condições altamente vantajosas - basta referir que só pagamos juros e amortizações de capital daqui a 2 anos.
A rentabilidade líquida da exploração e de acordo com estudo feito e explorações análogas na -zona é...
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