Acórdão nº 00072/03 de Tribunal Central Administrativo Sul, 15 de Fevereiro de 2005 (caso NULL)
Magistrado Responsável | Casimiro Gonçalves |
Data da Resolução | 15 de Fevereiro de 2005 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
RELATÓRIO 1.1. Sociedade Agrícola da ..., SA., com sede na Herdade da ..., Campo Maior, NIPC n° 501..., interpõe o presente recurso contencioso de anulação do despacho de 17/7/2002, do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, proferido no uso da delegação de competências atribuídas pelo Ministro das Finanças (conforme n° 2.6 do Despacho n° 14386/2002, de 13/6/2002, publicado no DR II Série, n° 145, de 26/6/2002), que lhe indeferiu o recurso hierárquico interposto em 27/3/2001, da decisão da AT que determinou as correcções de natureza quantitativa ao lucro tributável em sede de IRC, no valor de 14.271.527$00 (a que correspondem 71.186,07 Euros), ao abrigo do disposto no art. 57° do CIRC e referentes ao exercício de 1997.
1.2. Sustenta, em síntese, que o acto recorrido padece dos vícios de: - Falta de fundamentação dos pressupostos de aplicação do artigo 57° do CIRC e das correcções efectuadas; - Violação de lei (desvio de poder), por o artigo 57° do CIRC não visar a finalidade prosseguida pelo acto recorrido; - Violação de lei (artigo 21° do CIRC), por não aceitação, como proveitos fiscalmente relevantes, de montantes correspondentes a operações derivadas da actividade normal da recorrente.
Isto porque, em síntese: I - Ao contrário do que entende a AT, não foram estabelecidas relações especiais com a cooperativa a que pertence, nem foram acordadas condições diferentes daquelas que seriam normalmente acordadas entre pessoas independentes e que a inexistência destes dois primeiros requisitos conduz necessariamente à não verificação dos restantes requisitos mencionados no art. 57º do CIRC.
Aceita a doutrina e jurisprudência que entendem existirem relações especiais quando existam situações de dependência, mas, no entanto, não basta que exista uma relação societária entre os seus cooperantes e a cooperativa para que logo se conclua existir uma situação de dependência entre ambos, sendo que, no caso, nem a participação da recorrente no capital social da C... lhe dá qualquer controlo de facto ou de direito na cooperativa nem a existência de negócios entre a recorrente, enquanto cooperante, e a cooperativa C..., constituem, só por si, uma situação de relação especial (para efeitos fiscais), constituindo, antes, a razão de ser da própria cooperativa.
Pelo que a AT não logrou demonstrar a existência da verificação do primeiro requisito - existência de relações especiais entre os intervenientes.
Atenta a dependência entre os vários requisitos, não só por serem cumulativos, mas também por o primeiro dos requisitos constituir condição de existência dos restantes, enquanto parte integrante da sua definição, temos que concluir não se terem verificado os requisitos que permitem a aplicação do artigo 57° do CIRC.
Quanto a não se terem estabelecido entre os intervenientes condições diferentes das normalmente acordadas entre pessoas independentes, também a AT não demonstrou a inexistência deste requisito.
E inexistindo os dois primeiros requisitos, não poderá subsistir o terceiro, enquanto parte integrante da definição deste requisitos, sendo ainda que, contrariamente ao concluído pela AT, a verificação dos dois primeiros requisitos não conduz necessariamente a um lucro apurado diverso do que se apuraria na sua ausência, pois este lucro poderá não existir e verificarem-se os restantes requisitos.
II - Quanto às prestações de serviços agrícolas (máquinas agrícolas) a). No contexto global da actividade da C... a que a recorrente pertence, estes serviços representam aproximadamente 62% do seu volume total de negócios; b). Os preços praticados pela C... e pagos pela recorrente, em 1989, tiveram por base a Tabela de "Preços máximos admitidos aos alugadores de máquinas agrícolas beneficiários de subsídio de gasóleo" publicada pelo Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação; c). Em 1989, a C... era beneficiária do subsídio de gasóleo; d). A referida Tabela não foi publicada para os anos posteriores ao de 1989; e). Na ausência dessa publicação, a C... socorreu-se do Índice de Preços no Consumidor, publicado pelo Instituto Nacional de Estatística, para tomando como base os preços praticados em 1989, proceder à sua actualização; f). Os preços praticados pela C... nos serviços prestados às suas empresas cooperantes, entre as quais a ora recorrente, foram fixados de acordo com um critério objectivo, critério esse que se manteve inalterado ao longo dos anos; g). É evidente a uniformidade e consistência do critério utilizado; h). Os preços que a recorrente e restantes empresas cooperantes teriam que suportar caso não utilizassem os serviços da C..., não seriam nunca inferiores ou significativamente inferiores àqueles que a cooperativa praticou; i). Se recorrente adquirisse toda a maquinaria agrícola necessária à sua actividade, cujos custos teriam forçosamente que ser aceites pela AT, obteria piores resultados da exploração e consequentemente piores resultados fiscais: j). Não foram estabelecidas, entre a cooperativa e a recorrente, condições diferentes das que seriam normalmente acordadas entre pessoas independentes; l). inexistindo diferentes condições, o lucro apurado pela C... com base na sua contabilidade não pode ser diferente do que se apuraria na ausência dessa relação, o mesmo acontecendo com o lucro apurado pela ora recorrente; m). A C... é uma cooperativa registada no Instituto António Sérgio para o Sector Cooperativo, do Ministério do Trabalho e de Solidariedade, cumpridora das suas obrigações legais; n). Não existe, consequentemente, qualquer fundamento para que a AT tivesse procedido às correcções da matéria colectável relativamente ao exercício de 1997, razão pela qual se deve manter o resultado declarado e em consequência anular o despacho recorrido que indeferiu o recurso hierárquico apresentado.
III - Quanto à prestação de serviços agrícolas (mão de obra)
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A situação é algo similar à que sucede com a cedência de equipamento agrícola, obviamente com as devidas adaptações; b) A cedência processa-se ao nível da mão de obra indiferenciada e de alguns motoristas especialmente habilitados para a condução da mais variada maquinaria agrícola propriedade da cooperativa e igualmente cedida às suas empresas cooperantes; c) Pretendeu-se, igualmente, evitar que a recorrente e restantes cooperantes tivessem ao seu dispor um quadro significativo de pessoal, com elevados custos fixos, que não se revelaria necessária à prossecução da actividade de cada uma das cooperantes; d) Situação que só contribuiria para anular os custos de cada uma das empresas e consequentemente diminuir o seu resultado fiscal; e) A sazonalidade de algumas das tarefas próprias do sector agrícola, conjugada com a diferenciação da actividade das empresas cooperantes, umas em relação às outras, permite uma melhor utilização e rentabilização dos recursos humanos disponíveis; f) A cedência de mão de obra representa, no contexto da actividade total da C..., apenas cerca de 6%; g) Nada justifica por isso as correcções efectuadas nesta sede pela AT, carecendo de fundamentação a aplicação do disposto no artigo 57° do CIRC, razão pela qual deve ser anulado o despacho recorrido, que indeferiu o recurso hierárquico apresentado.
IV - Quanto à Prestação de Serviços administrativos
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A AT não levou em linha de conta a totalidade dos custos suportados pela C... para prestação dos serviços administrativos, já que os mesmos não foram de apenas 7.800 contos, mas sim de 11.786 contos; b) As verbas debitadas à recorrente e restantes empresas cooperantes visam repartir os custos suportados pela C..., não constituindo qualquer transferência de custos, tendo em vista alterar o resultado fiscal das empresas; c) Tanto mais que nos últimos anos a C... nem sequer procedeu à actualização de alguns dos valores debitados às empresas cooperantes; d) Nada justifica, por isso, as correcções efectuadas pela AT no que diz respeito à comparticipação pela recorrente e restantes empresas cooperantes nas despesas de carácter administrativo suportadas pela C..., pelo que também nada justifica as correcções efectuadas nesta sede pela AT, carecendo de fundamentação a aplicação do disposto no artigo 57° do CIRC, razão pela qual deve ser anulado o despacho recorrido, que indeferiu o recurso hierárquico apresentado.
V - Quanto à comercialização de produtos agrícolas
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A C..., para além dos encargos gerais de administração, tem que suportar os custos inerentes à negociação prévia à compra de diversos produtos por si comercializados, para além dos custos financeiros inerentes aos recursos que se toma imperioso reunir para honrar os compromissos assumidos; b) As empresas associadas, para além de beneficiarem de melhores condições de pagamento, acabam por adquirir os produtos a um melhor preço, do que aquele que teriam que suportar se os viessem a adquirir directamente às empresas fornecedoras, para além de uma melhor assistência técnica pós-venda; c) Se tal acontecesse, a AT teria que aceitar custos mais elevados para as empresas cooperantes e resultados fiscais necessariamente inferiores.
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Nada justifica, por isso, as correcções efectuadas nesta sede, razão pela qual deve ser anulado o despacho recorrido que indeferiu o recurso hierárquico apresentado.
VI - Desvio de Poder Resultando dos diversos actos constantes do processo, designadamente do Relatório da Inspecção, que a discordância da AT está na existência de lucros, na actividade empresarial da recorrente e na prática de actos de comércio pela recorrente, em suma, do respeito pelo Código Cooperativo, o que é verdade é que o art. 57° do CIRC não tem por fim assegurar o cumprimento do Código Cooperativo, nem a AT tem competências para tal, pelo que o acto recorrido visa uma finalidade não consentida na lei tributária aplicável, daí advindo o vício de desvio de poder que, consistindo na prática de um acto visando uma finalidade não consentida na lei, constitui causa de invalidade do acto.
VII - Falta de...
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