Acórdão nº 00565/03 de Tribunal Central Administrativo Sul, 03 de Novembro de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelJoaquim Pereira Gameiro
Data da Resolução03 de Novembro de 2004
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

I - M... - Compra, Venda e Reparação de Automóveis, L.da., inconformada com a sentença do Mmo. Juiz do Tribunal Tributário de 1ª Instância de Aveiro que julgou procedente a questão prévia da caducidade do direito da impugnante suscitada pela Fazenda Pública e pelo MP e que, em consequência, não conheceu do mérito da impugnação por ela deduzida contra a liquidação de imposto automóvel praticado pela Alfândega de Aveiro, em 27.5.96, no montante de 254.735$00, recorreu da mesma para o STA pretendendo a sua revogação e procedente o pedido, o qual, por Ac. de 26.3.2003, se declarou incompetente, em razão da hierarquia, para conhecer do recurso e considerou competente este TCA para onde, posteriormente, foram remetidos os autos.

Nas suas alegações de recurso, formula as conclusões seguintes: 1 - A douta sentença a quo não cumpriu o dever prescrito no n.° 2 do art. 668° do CPC de resolver todas as questões submetidas à sua apreciação. Não se pronunciou sobre a inaplicabilidade das tabelas de redução do IA (ilegalidade abstracta de liquidação), nem sobre a alegada violação do conteúdo essencial dos direitos fundamentais de propriedade e de o contribuinte não poder ser obrigado a pagar impostos contra normas de DC, de hierarquia superior. Por conseguinte, enferma do vício de nulidade.

2 - As tabelas de redução do IA, previstas no DL n.° 40/93, no que concerne aos automóveis usados importados do espaço comunitário, contrariam o art. 90.° do TR, por não garantirem sempre que o montante do imposto devido não excede o montante do imposto residual incorporado no valor dos veículos similares já matriculados no território nacional, como sentenciou o TJCE no ac. do caso António Gomes Valente.

Em consequência, atento o princípio do primado do DC e a sua aplicabilidade directa, são inaplicáveis na ordem jurídica portuguesa e até já deviam ter sido abrogadas expressamante pelo Legislador, por respeito ao princípio da segurança jurídica.

3 - Tais tabelas, bem como o DL em que foram inseridas, são posteriores ao art. 90.° do TR, pelo que, segundo a jurisprudência do TJCE, firmada, entre outros, no caso Simmenthal, no mínimo, são «desprovidas de qualquer eficácia» (no sentido de que são inaplicáveis a qualquer caso, ou ineficazes); ou, mais apropriadamente, mostra-se «impedida a sua formação válida», o que deve entender-se como estando «desprovidas de existência jurídica». O que, em qualquer das hipóteses, em termos práticos (ao nível dos efeitos), corresponde melhor à figura da nulidade ou da inexistência jurídica (embora haja quem as não autonomize) do que à mera anulabilidade.

Com efeito, nulidade e inaplicabilidade são conceitos distintos, sendo a inaplicabili-dade uma figura mais próxima da ineficácia e da nulidade do que da anulabilidade, que a sentença indevidamente privilegiou.

4 - Assim sendo, e sob pena de esvaziamento de tal proibição de aplicação, os actos administrativos de liquidação e cobrança do IA que a esta tenham procedido não são anuláveis, mas ineficazes ou então nulos por natureza, conforme a tese que se perfile.

5 - A existência no ordenamento jurídico nacional de mecanismos como a oposição à execução com fundamento em ilegalidade abstracta da liquidação e de revisão dos actos tributários em prazos bem superiores ao de 90 concebido para a impugnação judicial e graciosa é a prova de que o direito de atacar o acto tributário e de exigir a restituição do tributo indevidamente cobrado não está necessariamente sujeito àquele curto prazo de caducidade, concebido para sindicar apenas os actos anuláveis, mas que o legislador não impôs, nem expressa, nem claramente, para os actos que violem o DC, tanto mais que a enumeração dos actos nulos no n.° 2 do art. 133.° do CPA não é taxativa.

6 - O vício da não conformação com o DC, por gerar um desvaler jurídico que, no mínimo, corresponde ao da nulidade do acto de liquidação impugnado, acarreta a suspensão da contagem dos prazos processuais, porquanto a mesma pode ser arguida a todo o tempo, nos termos do art. 134.° do CPA, aplicável ao processo tributário.

7 - Impõe-se a mesma conclusão pelo facto de não existir qualquer base normativa válida aplicável que autorize a liquidação e cobrança de tal tributo, sendo certo que a aplicação da tabela de redução do IA, por contrária ao DC, a cujo cumprimento a AT também está vinculada, representa um erro imputável ao órgão administrativo.

Este, por não existir norma nacional aplicável, facto que tem a obrigação de conhecer, incorreu em erro grosseiro, só a si imputável, exorbitou das suas competências ao praticar o acto impugnado e agiu sem base jurídica válida, pois sendo a tabela de reduções inaplicável é como se não existisse.

Deste modo, a aplicação da "lei nacional" corresponde a agir sem lei ou contra lei fundamental, de hierarquia superior (constitucional e comunitária).

8 - Estando a fixação dos aspectos essenciais dos impostos sujeitos à reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República e à reserva de lei, e não existindo lei conforme ao DC que valide a liquidação e cobrança do IA, as tabelas de redução do IA também são materialmente inconstitucionais.

9 - A inconstitucionaalidade reside ainda no facto de o DL n.° 40/93, de 18 de Fevereiro, ter sido adoptado com base na Lei n.° 2/92, de 3 de Março, cujo prazo de habilitação expirou em 31.12.1992, tendo o DL versado elementos essenciais do IA, tais como a sua incidência, taxas e benefícios fiscais.

10 - Por força dos princípios fundamentais do primado e do efeito directo, quer as normas nacionais contrárias ao DC e respectivos actos de execução são inaplicáveis de pleno direito. Pode tal inaplicabilidade ser invocada a todo...

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