Acórdão nº 06612/02 de Tribunal Central Administrativo Sul, 25 de Maio de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelCasimiro Gonçalves
Data da Resolução25 de Maio de 2004
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

RELATÓRIO 1.1. R...., Lda., com sede no Largo de Cheio, Avessadas, Marco de Canaveses, recorre da sentença que, proferida pelo Mmo. Juiz da 2ª secção do 1ç Juízo do TT de 1ª Instância do Porto, lhe julgou improcedente a impugnação que deduziu contra as liquidações adicionais de IRC e de IVA, referentes ao ano de 1996, nos montantes de 4.782.109$00 e de 1.630.107$00, acrescidos dos respectivos juros compensatórios.

1.2. Alega e termina formulando as Conclusões seguintes: 1ª. Porque a base da fundamentação do recurso aos métodos indiciários consta dos pontos 2.3, 2.4 e 2.5 do Capítulo IV do Relatório dos Serviços da Inspecção Tributária.

  1. Porque estes pontos do Relatório apenas se limitam a afirmar que «não houve cuidado rigoroso na contabilização das compras e mercadorias e as matérias primas»; que «efectuada uma amostragem da mercadoria - frigoríficos, fornos, placas, lava louça, lava roupa, exaustores - electrodomésticos adquiridos para incorporar nos produtos fabricados, verificou-se um resultado negativo de 2.367.175$00»; que «efectuado o controlo quantitativo daquelas mercadorias - frigoríficos, fornos, placas, lava louça, lava roupa, exaustores - verificou-se a existência de um desvio de 107 unidades».

  2. Porque a fundamentação para estas conclusões dos serviços da inspecção tributária, ou, o que é ainda mais grave, referem que «pressupõe a venda à margem da contabilidade.» 4ª. Porque todo o fio condutor do apuramento dos cálculos destinados à fixação da matéria colectável com o recurso aos métodos indiciários, partem do pressuposto de que as conclusões retiradas nos pontos 2.3, 2.4 e 2.5 do Capítulo IV do Relatório correspondem à realidade.

  3. Porque não existe qualquer facto no relatório que aponte nesse sentido.

  4. Porque, a ora Recorrente, para além de contestar o recurso aos métodos indiciários, ainda apresentou 22 documentos que contrariam totalmente as conclusões formuladas pelo técnico responsável pela inspecção tributária.

  5. Porque esses documentos nem sequer foram objecto de análise por parte da sentença, uma vez que não lhe foi imputada qualquer relevância, mas também não foi posta em causa a sua validade probatória.

  6. Porque a ponderação de tais documentos como elemento probatório no presente processo, não só viria confirmar a errada quantificação apurada com o recurso aos métodos indiciários, mas também a própria ausência de fundamentos para a sua utilização.

  7. Porque depois da petição de impugnação apresentada pela ora Recorrente, a Administração Tributária não só não contestou de forma expressa os argumentos apresentados pela ora Recorrente, como também não questionou a veracidade de nenhum dos documentos apresentados juntamente com a mesma, uma vez que, de acordo com o referido na douta sentença (1° parágrafo da pag. 201), a Representante da Fazenda Nacional se limitou a remeter para os elementos existentes nos Autos.

  8. Teremos de concluir que a decisão proferida na douta sentença deixou de se pronunciar sobre a validade da prova apresentada pela ora Recorrente, ficando, assim, ferida de nulidade nos termos do disposto na alínea d) do n° 1 do artigo 668° do CPC.

  9. Porque a douta sentença agora recorrida apenas considerou como provada a matéria constante do relatório da inspecção tributária, apesar da matéria ali vertida mais não ser do que meras presunções de erros na contabilidade da ora Recorrente.

  10. Teremos de concluir que o meritíssimo juiz a quo presumiu que as conclusões do Relatório eram verdadeiras, tendo, assim, imputado à ora Recorrente o ónus de provar sua falsidade.

  11. Porque actualmente deixou de existir tal presunção relativamente aos documentos elaborados pelos serviços da inspecção tributária.

  12. Teremos de concluir que ter-se-á de aplicar a regra geral sobre o ónus da prova.

  13. Porque, de acordo com o disposto no n° 1 do artigo 342° do CC, quem invocar um direito tem o ónus de fazer a prova dos factos constitutivos desse direito alegado.

  14. Teremos de concluir que, se a Administração Tributária alega o direito ao recurso aos métodos indiciários para a determinação da matéria colectável de IRC, tem o ónus de provar a existência dos factos constitutivos desse direito, o mesmo é dizer, tem de provar a existência de uma das situações previstas no artigo 87° da LGT, não pode presumir a sua existência, tem de demonstrá-la, sob pena de ser ilegal o recurso aos mesmo.

  15. Porque, no presente caso, o que acontece é que a Administração Fiscal não prova a existência de qualquer facto susceptível de justificar o recurso aos métodos indiciários, limita-se a presumir a existência de alegadas falhas na contabilidade da ora Recorrente, daí retirando a conclusão de que lhe assiste proceder ao recurso aos métodos indiciários.

  16. Porque a Administração Fiscal se limita a presumir e a retirar conclusões, porque nos pontos 2.3, 2.4 e 2.5 do Capítulo IV do Relatório a Administração Fiscal não identifica nenhum facto concreto para justificar a conclusão retirada, nem tão pouco identifica qualquer documento justificativo dessa sua presunção de irregularidade.

  17. Porque, quando refere que «não houve cuidado rigoroso, quer na contabilização das compras de mercadorias, quer das matérias primas» (ponto 2.3 do Capítulo IV do Relatório), não identifica os motivos porque retira essa ilação, nem aponta qualquer facto justificativo para essa afirmação.

  18. Porque o mesmo se passa com os restantes pontos do relatório já identificados, referindo, por exemplo, quanto à falta de electrodomésticos não contabilizados, que a sua conclusão é retirada de uma amostragem efectuada, não identifica nenhuma factura que não tenha sido contabilizada, nem identifica qualquer aparelho que não tenha sido objecto de facturação, presume, de imediato a sua comercialização à margem da contabilidade.

  19. Teremos de concluir que a douta sentença ficou ferida de nulidade por força do disposto na alínea d) do n° 1 do artigo 668° do CPC.

  20. Porque a aplicação prática dos métodos indiciários está também ela ferida do mesmo vício.

  21. Porque, não basta à Administração Fiscal provar a existência dos pressupostos que lhe permitam recorrer aos métodos indiciários para apuramento da matéria colectável de IRC de um sujeito passivo, é também necessário que a mesma Administração Fiscal justifique do ponto de vista factual e legal a utilização prática de tais métodos.

  22. Porque, no presente caso, apesar do ónus da prova pertencer à Administração Tributária, uma vez que é ela que invoca esse direito, a ora Recorrente junta documentação comprovativa da errónea quantificação efectuada pela Administração Fiscal, elaborando de forma pormenorizada todo o material incluído em cada tipo de cozinha, para além de demonstrar que o exemplo utilizado pela Administração Tributária não estava identificado, nem tão pouco se reportava a uma cozinha de castanho, como pretendia fazer crer a Administração Tributária, no entanto, a douta sentença agora recorrida limitou-se a ignorar essa prova.

  23. Porque se a factura que fundamentou a quantificação dos métodos indiciários não corresponde à verdade, se ela efectivamente é demonstrativa de outra realidade que não a referida pela Administração Fiscal, teria a douta sentença de retirar daí as sua ilações e, consequentemente, decidir de forma diferente da que decidiu.

  24. Teremos de concluir que a douta sentença ao ter decidido como decidiu, não avaliou correctamente a prova juntas aos Autos, não se tendo assim pronunciado sob questões de prova que competia pronunciar e decidir, ficando, assim ferida de nulidade por força do disposto na alínea d) do n° 1 do artigo 668° do CPC.

  25. Porque o n° 2 do artigo 107° da CRP determina que a tributação das empresas incidirá fundamentalmente sobre o seu rendimento real.

  26. Porque, esta norma constitucional implica que a regra para a tributação das empresas seja efectivamente incidente sobre o lucro real das empresas.

  27. Teremos de concluir que o recurso aos métodos indiciários para a determinação da matéria colectável, acaba por ser uma derrogação deste princípio constitucional.

  28. Porque a norma constitucional determina que a tributação incida fundamentalmente sobre o lucro real das empresas, não afasta a possibilidade de, excepcionalmente, se poder utilizar outro método de determinação da matéria colectável sem ser o lucro real, ou seja, está prevista a possibilidade de recurso aos métodos indiciários para a determinação da matéria colectável e, consequentemente, a tributação dessa mesma empresa.

  29. Porque, no entanto, este recurso a forma diferente de tributação terá de ser excepcional, não poderá ser a regra.

  30. Teremos de concluir que o recurso aos métodos indiciários terá de, obrigatoriamente ser devidamente fundamentado, sob pena de ficar ferido de inconstitucionalidade.

  31. Porque se for entendido que as normas do artigo 87° da LGT, tal como defendeu o meritíssimo juiz a quo, consagram que basta uma mera referência a possíveis erros na contabilidade e à apresentação de presunções de irregularidades para o recurso aos métodos indiciários para a determinação da matéria colectável.

  32. Teremos de concluir que tal norma é inconstitucional por violar o n° 2 do artigo 104° da CRP.

  33. Porque, caso se entenda que, a contrário, as normas do artigo 87° da LGT defendem a excepcionalidade do recurso aos métodos indiciários e, em simultâneo, exigem que tal recurso seja devidamente fundamentado; 36ª. Teremos de concluir que a utilização dos métodos indiciários no presente caso foi ilegal, não só porque viola do disposto no artigo 87° da LGT, mas também o próprio n° 2 do artigo 104° da CRP.

  34. Tal como de concluir que, ao ter decido da forma como decidiu a questão da fundamentação do recurso aos métodos indiciários na sentença ora recorrida, ficou a mesma ferida de ilegalidade e mesmo inconstitucionalidade, sendo, por isso nula por força do disposto nas alíneas c) e d) do n° 1 do artigo 668° do CPC.

  35. Porque no requerimento da ora Recorrente para a Comissão de Revisão foi requerida a intervenção de...

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