Acórdão nº 07088/02 de Tribunal Central Administrativo Sul, 04 de Abril de 2006

Magistrado ResponsávelJosé Correia
Data da Resolução04 de Abril de 2006
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam nesta Secção do Contencioso do Tribunal Central Administrativo Sul: I-RELATÓRIOI - A... - ARMADURAS, PLÁSTICOS E ACESSÓRIOS DE ILUMINAÇÃO, SA, com os sinais identificadores dos autos, impugnou judicialmente a liquidação do IVA relativo ao ano de 1996 e respectivos juros compensatórios.

O Tribunal Tributário de 1ª Instância de Lisboa julgou a impugnação improcedente.

Inconformada com tal decisão, a impugnante interpôs o presente recurso, formulando as seguintes conclusões: 1.- Nos termos do art° 132°, n° l, do CPT, a possibilidade de o Juiz conhecer imediatamente do pedido sem promoção das diligências de prova requeridas só se pode verificar quando: a. a questão seja apenas de direito; b. sendo também de facto, o processo fornecer os elementos necessários para a boa decisão da causa; 2. O Meritíssimo Juiz a quo nada refere quanto à suficiência dos autos para avaliação da questão de facto decisiva para efeitos de boa decisão da causa; 3.- Ao negar a possibilidade de audição das testemunhas, o Meritíssimo Juiz a quo impossibilita ao recorrente fazer a prova de que não lhe é imputável a discrepância entre os números extraídos do VIES e aqueles que decorrem da análise da sua contabilidade; 4. De acordo com jurisprudência do Venerando STA, "a não audição de testemunhas implica a denegação do direito de defesa, não permitindo a produção de prova" (cfr.

decisão da reclamação n° 478, proferida pela 2a Secção do STA em 29 de Setembro de 1998), jurisprudência que bem se aplica ao caso concreto, uma vez que a questão de facto é central para a boa decisão da causa; 5. Afirma-se a fls. 392 da sentença, que "(...) cabia à impugnante não só alegar factos como também provar os mesmos factos, o que não fez".

Ora - como poderia a impugnante fazer a prova do alegado, se lhe são negados os meios para fazer essa prova? E como é que, negando-se os meios probatórios à impugnante, se nega a sua pretensão com fundamento em esta não fazer prova do alegado? 6. Pelo que, a não audição das testemunhas arroladas pelo recorrente configura clara violação do disposto no art° 132°, n° 2, do CPT, tendo em particular atenção a necessidade de a interpretação e aplicação daquele preceito dever ser efectuada conforme ao disposto no art° 20°, maxime n° 5, da Constituição da República.

7. Através do artigo 78° do CPT e, hoje, pelo art° 75° da LGT, é imposta à administração fiscal a produção de prova suficiente para que possa ser ilidida a presunção de veracidade dos documentos contabilísticos e dos apuramentos deles constantes; 8. Apela a sentença recorrida ao texto do n° 2 do art° 75° da LGT por forma a inverter esse ónus da prova, remetendo-o para o ora recorrente; 9. As omissões, erros, inexactidões ou indícios fundados de que padece a contabilidade do ora recorrente serão, de acordo com a sentença: a. as aquisições intracomunitárias de bens "nem sequer" se encontravam registadas contabilisticamente conforme o disposto no art° 32° do RTTI; b. a administração tributária diligenciou junto do ora recorrente esclarecer as discrepâncias verificadas e, mesmo com toda a colaboração por este oferecida, não encontrou na contabilidade do ora recorrente justificação para a discrepância entre os dados resultantes da sua contabilidade e os dados fornecidos pelo VIES; 10. Mas se foi possível à administração tributária determinar que a liquidação e entrega do imposto correspondente foi efectuada, não é pelo desrespeito da regra do art° 32° do RITI, que a contabilidade se encontra de tal forma inquinada, ao ponto de não reflectir ou impedir o conhecimento da matéria tributável real do ora recorrente; 11. O que se pretende é, em grosseira violação do princípio da veracidade da contabilidade, que a discrepância de dados com o VIES: a. torna incredível a contabilidade da ora recorrente; b. pelo que se inverte o ónus da prova; c. pelo que cabe à ora recorrente comprovar que os dados do VIÉS estão incorrectos, e não à administração tributária fazer a prova, que legalmente lhe incumbe, que é a contabilidade da ora recorrente que não reflecte a realidade dos factos; 12.

Assim sendo, a douta sentença recorrida viola claramente o preceituado nos art°s 76° e 78° do CPT - matéria hoje regulada nos art°s 59° do CPPT e 75° da Lei Geral Tributária (LGT), porquanto não se verificam na contabilidade da ora recorrente quaisquer omissões, erros, inexactidões ou indícios fundados para que se considere que a mesma não reflecte ou impede o conhecimento da matéria tributável real do ora recorrente - cabendo assim à administração tributária fazer prova suficiente para que possa ser ilidida a presunção de veracidade dos documentos contabilísticos e dos apuramentos deles constantes. O que não fez!; 13. Não é lícito que, num Estado de Direito como o nosso pretende ser, a administração pública - neste caso a administração tributária - faça prevalecer, sobre os princípios gerais e sobre a lei, dados estatísticos acumulados numa base de dados; 14. Deve, outrossim, pugnar pela correcta aplicação da lei, o que no caso vertente passaria por (i) tentar apurar qual a origem da discrepância entre os dados do VIES e os dados da contabilidade da ora recorrente e (ii) não o conseguindo, e tendo em devida atenção que a contabilidade da ora recorrente faz fé (na medida em que as eventuais incorrecções verificadas não justificam o afastamento da presunção legal), tomar por boas as declarações, dados e documentação da ora recorrente; 15.

Termos em que, quer a actuação da administração tributária no caso concreto e, ao dar-lhe guarida, quer a sentença recorrida, violam o disposto nos entretanto revogados art°s 16° e 17° do CPT e do art° 266° da Constituição da República.

16. No que respeita à questão da aplicação do art° 80° do CIVA, o que a administração tributária fez foi, em face da discrepância verificada entre os dados contabilísticos da ora recorrente e os elementos recolhidos do VIES, entender que, nos termos do art° 80° do OVA, se deveria presumir (i) a compra de bens pela ora recorrente e (ii) posteriormente a venda dos mesmos bens; 17. Também as liquidações adicionais de IVA respeitantes às presumidas compras assentam na presunção estipulada pelo referido preceito; 18.

Pelo que, ao recusar-se a examinar a aplicação ao caso concreto da presunção estabelecida, quanto às compras, no art° 80° do OVA, o Meritíssimo Juiz faz com que a sentença recorrida se encontre ferida por omissão de pronúncia.

Termos em que entende que deve o recurso interposto da douta sentença recorrida ser julgado como provado e procedente, com as legais consequências.

Só assim se decidindo SERÁ CUMPRIDO O DIREITO E FEITA JUSTIÇA.

Não foram apresentadas contra - alegações.

A EPGA pronunciou-se no sentido de que o recurso não merece provimento na consideração de que a pretensão da recorrente fica "...desacompanhada de prova que não foi produzida nos autos e que contraria os documentos (nomeadamente o conteúdo do relatório de fiscalização) e outros elementos de prova mencionados na sentença recorrida"... que "...fez uma correcta apreciação da prova existente nos autos e uma correcta interpretação dos preceitos legais que fundamentam a decisão, não merecendo censura"- cfr. fls. 423.

A fls. 425 veio a recorrente requerer a junção de cópia do Relatório e respectivos anexos, documentos referentes a uma peritagem efectuada à sua contabilidade e que pretende esclarecer dúvidas suscitadas quanto á contabilização de facturas que terão determinado as liquidações adicionais de IVA de 1995, dizendo confiar que os mesmos merecerão uma adequada apreciação na busca da verdade material dos factos.

A EPGA veio manifestar-se contra a admissão de tais documentos no entendimento de que são as liquidações de IVA de 1996 que se encontram aqui em causa, pelo que os documentos apresentados em sede de recurso, não têm qualquer justificação, devendo ser indeferida a requerida junção.

Satisfeitos os vistos legais, cumpre decidir.

*2.- FUNDAMENTAÇÃO 2.1.- DOS FACTOS: Compulsados os autos e vista a prova produzida, consideram-se provados os seguintes factos na sentença recorrida: A). - A impugnante tem como objecto social a industria de armaduras e transformação de plásticos para iluminação, adquirindo junto de diversas entidades sediadas em território da União Europeia bens e prestação de serviços de variada natureza; B). - Em cumprimento da Ordem de Serviço n.° 72.298 de 14.11.96, foi a escrita da impugnante objecto de fiscalização ao exercício de 1996, com o objectivo de verificar as anomalias nas transacções intracomunitárias, nomeadamente as diferenças entre as aquisições indicadas pela impugnante nas declarações periódicas do IVA e as constantes do sistemas VIES, conforme documentos de fls. 20 a 28, 36 a 63, 95 a 116 e 123 a 340, dando-se todos os documentos por reproduzidos; C) - A impugnante está enquadrada em sede de IVA no regime normal mensal, estando raramente em crédito de imposto, muito embora a impugnante venha ao longo dos anos a canalizar as suas vendas para o mercado comunitário - fls. 102; D) - No que respeita à organização contabilística e análise fiscal, o PFT verificou que os documentos arquivados na contabilidade da impugnante encontram-se classificados e lançados de acordo com o POC, sendo utilizados para as operações de lançamento suportes informáticos.

E) - As aquisições intracomunitárias de bens, contudo, não estão registadas contabilisticamente conforme o disposto no art. 32° do RITI, ressalvando o facto de a liquidação e entrega ser efectuada, como se provou pelas declarações periódicas respeitantes a tais períodos - fls. 103; F) - As compras indicadas pela impugnante na declarações periódicas do IVA feitas a fornecedores sediados no espaço comunitário, em certos trimestres dos anos de 1993 a 1996, são inferiores ao registado no sistema VIES, que são os indicados pelos fornecedores das mercadorias nos seus países de origem - fls. 103; G) - Para se tentar acertar essas diferenças, o PFT fez uma recolha de...

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