Acórdão nº 2237/99 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01 de Outubro de 2002 (caso None)

Magistrado ResponsávelFrancisco Rothes
Data da Resolução01 de Outubro de 2002
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade denominada A...(adiante Recorrente, Impugnante ou Contribuinte) veio recorrer para este Tribunal da sentença do Juiz do Tribunal Tributário de 1.ª instância do Porto, que julgou improcedente a impugnação judicial por ela deduzida contra a liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) e respectivos juros compensatórios, do ano de 1993, do montante global de esc. 6.482.528$00.

Essa liquidação foi efectuada por a Administração tributária (AT), na sequência de uma fiscalização, ter concluído que, por falta de documentação, não podiam ser deduzidos para efeitos de determinação do lucro tributável diversos custos contabilizados pela Contribuinte, respeitantes a compras e a amortizações, motivo por que procedeu às pertinentes correcções A AT, inicialmente, procedeu à fixação do lucro tributável com recurso a métodos indiciários, mas, na sequência do deferimento da reclamação apresentada pela Contribuinte ao abrigo do disposto no art. 84.º do CPT, apenas subsistiram as correcções técnicas.

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1.2 Na petição inicial a Contribuinte alegou, em síntese, que a liquidação impugnada enferma dos seguintes vícios: - preterição de formalidades legais, por não lhe ter sido dada a oportunidade de exercer o direito de audição prévia, aplicável por força do disposto no art. 2.º do Código de Procedimento Administrativo (CPA), omissão que constitui violação do disposto nos arts. 8.º e 100.º a 103.º do mesmo Código e do disposto no art. 267.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa (CRP) Na redacção da Lei Constitucional n.º 1/1992.

; - falta de fundamentação do acto impugnado, em violação do disposto nos arts. 21.º e 82.º do Código de Processo Tributário (CPT), 124.º e 125.º do CPA e 268.º, n.º 3, da CRP Idem.

, porque os motivos apontados para efectuar a liquidação «não satisfazem as exigências que a lei estabelece no plano substancial para que um acto se considere devidamente fundamentado» As partes entre aspas e com um tipo de letra diferente, aqui como adiante, constituem transcrições.

, não sendo claros, nem suficientes, nem congruentes; - violação de lei, por, para a não aceitação dos custos em causa, a AT se ter fundado exclusivamente no facto de estes não estarem documentados, quando é certo que o estavam no momento em que foram contabilizados e, apesar dos documentos não terem sido encontrados quando da fiscalização, é admissível a prova por qualquer meio quer de que os custos estavam documentados quando foram levados à contabilidade quer de que aqueles custos foram realmente suportados e foram comprovadamente indispensáveis para a realização dos proveitos.

1.3 Na sentença recorrida considerou-se, em resumo, o seguinte: - não há preterição de formalidade por falta de audição da Contribuinte antes da liquidação impugnada pois, sendo certo que não pode arredar-se de todo a aplicação do CPA ao procedimento tributário, o procedimento administrativo-tributário, «ao contrário da maioria dos restantes procedimentos administrativos, assenta numa relação constante com a Administração fiscal», como resulta, entre outros, dos arts. 70.º e 78.º do CPT, motivo por que «a necessidade da prévia audição do interessado, segundo a forma invocada pela impugnante está relacionada com aquelas situações em que o impulso para a prática do acto emerge da administração», situações em que, «aí, sim, compreende-se a exigência do sujeito ser ouvido sob pena de ser tomada uma decisão completamente à revelia dos motivos e razões deste»; no caso, porque «foi com base nos elementos fornecidos pelo contribuinte - ou nalguns casos na omissão de os apresentar - que a administração formou todo o processo que levou à prática do acto», «importar para aqui as considerações e os estudos que envolvem aquele [procedimento administrativo em geral], não revestia outro carácter que não fosse o de uma exegese manifestamente dilatória, que só nos envolveria num diálogo doutrinal em nada relacionado com o caso»; - a liquidação impugnada está devidamente fundamentada por remissão para o relatório dos serviços de fiscalização, como o permite o disposto no art. 125.º do CPA, e a Impugnante entendeu as razões que levaram à prática do acto, como resulta da leitura da petição inicial; aliás, «na notificação efectuada ao contribuinte consta sumariamente as razões que levaram à prática do acto, nomeadamente as razões de facto e de direito» e, se assim não fosse, «face à remissão para o relatório dos serviços de fiscalização, a impugnante poderia sempre ter usado da faculdade concedida no artº 22º do CPT»; - o acto impugnado não viola a lei ao ter considerado que não podem ser deduzidos, para efeitos de determinação do lucro tributável, os custos não documentados pois «é o próprio legislador quem de forma expressa e inequívoca exige a prova documental daqueles factos» e «admitir-se que a prova dos custos suportados pudesse ser feita através de qualquer meio de prova, significava por banda da Administração Fiscal a renúncia ao seu direito de controle, permitindo a evasão fiscal», sendo que «a forma que o legislador estabeleceu para que esse controle fosse efectuado, no que respeita ao comércio interno, foi a da exigência da factura ou documento equivalente».

1.4 A Recorrente apresentou alegações de recurso, que terminou com as seguintes conclusões: A) A douta sentença recorrida julgou improcedente a impugnação, considerando não se verificarem os vícios de preterição de formalidades essenciais, falta de fundamentação e violação de lei no acto impugnado.

B) Contudo, a douta sentença sob recurso interpretou erradamente e, consequentemente, violou o preceituado nos artºs. 2.º, 100.º e segs. do CPA bem como o art.º 267.º, n.º 5 (na redacção actual) da CRP, ao não assacar ao acto impugnado o vício de violação do direito fundamental de audiência prévia C) A omissão do dever de ouvir previamente a impugnante antes das liquidações impugnadas configura, pelo menos, preterição de formalidade legal essencial D) A omissão desse dever sanciona a liquidação impugnada com a nulidade ou, caso assim se não entenda, pelo menos com a anulabilidade, o que deveria ter sido judicialmente declarado na douta sentença sob recurso E) A liquidação impugnada não preenche os requisitos legalmente definidos para a fundamentação dos actos administrativos deste tipo, nomeadamente por delas não constarem os fundamentos de direito F) Ao decidir em sentido contrário, a douta sentença violou o preceituado nos artºs. 82.º do CPT e no art.º 125.º do CPA G) A douta sentença recorrida não se pronunciou sobre questões que deveriam ser apreciadas, pelo que é nula nos termos do art.º 668.º, n.º 1, al. d), do CPC H) A douta sentença, ao não dar como provado que existiam os documentos de suporte dos custos contabilizados ao tempo da contabilização, apreciou erradamente as provas produzidas I) A douta sentença igualmente apreciou erradamente as provas produzidas ao não dar como comprovados os custos expurgados pela Administração Fiscal J) Ao não julgar procedente o vício de violação de lei (art.ºs 17.º e 23.º do CIRC e art.º 104.º., n.º 2, CRP), violou estes preceito legais.

Nestes termos, deve ser concedido provimento ao presente recurso, com a revogação da sentença recorrida e a consequente procedência da impugnação, como é de justiça».

1.5 O recurso foi admitido, a subir imediatamente e nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

1.6 Não foram apresentadas contra-alegações.

1.7 O Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal emitiu parecer no sentido de que a sentença deve revogada, assim se dando provimento ao recurso.

Isto, em síntese, porque considerou que assiste razão à Recorrente no que respeita à...

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