Acórdão nº 4845/01 de Tribunal Central Administrativo Sul, 19 de Fevereiro de 2002

Magistrado ResponsávelFrancisco Rothes
Data da Resolução19 de Fevereiro de 2002
EmissorTribunal Central Administrativo Sul
  1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade denominada RE (adiante Recorrente ou Impugnante) veio recorrer para este Tribunal da sentença que julgou improcedente a impugnação judicial por ela deduzida contra a liquidação adicional de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) do ano de 1993 e juros compensatórios de IVA dos meses de Março de 1994 e Abril, Junho, Julho, Setembro e Outubro de 1993.

    1.2 O recurso foi admitido, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo.

    1.3 A Recorrente alegou e formulou as seguintes conclusões: «1ª O acto tributário teve por base uma informação dos serviços de fiscalização que enferma de múltiplos vícios formais, seja por erro nos pressupostos de facto, seja por se fundar em premissas falsas, seja por extrair conclusões não fundadas nas premissas.

    1. O procedimento inerente à aplicação de métodos indiciários, ao contrário do que defende a douta sentença recorrida, não só não está devidamente fundamentado pelas razões mencionadas na conclusão 1ª, como também enferma de ilegalidade por se consubstanciar não numa presunção, mas, sim, numa multiplicidade de presunções interligadas em cascata.

    2. A douta sentença violou o disposto nos arts 1º, nºs 1, al. a), e 2, al. a), 2º, nº 1, al. a), 82º, nº 3, e 84º, do CIVA, nos arts 19º, al. b), 21º, nº 1 e 82º do CPT e o art. 349º do Código Civil.

    3. A impugnante arguiu o procedimento de aplicação de métodos indiciários de ilegalidade por se ter operado no cálculo do volume de negócios supostamente omitidos aos registos de vendas com base não numa presunção, mas, sim, em múltiplas presunções em cascata.

    4. A impugnante arguiu também a ilegalidade da aplicação de métodos indiciários de que resultou a preterição do valor declarado das vendas, de 139.255.640$00, pelo valor de 140.464.539$00, sendo a diferença de apenas 1.208.952$00 e inferior a 1% daquele, sabido que o método presuntivo assenta em critérios subjectivos e pressuposto carecidos de rigor, exactidão e certeza.

    5. A douta sentença não se pronunciou sobre tais questões (referidas nas conclusões 4ª e 5ª) pelo que violou o disposto no art. 660º, nº 2 do CPC, incorrendo na nulidade cominada na alínea d) do nº 1, do art. 668º do mesmo diploma.

    6. Tendo a douta sentença, em matéria de probatório decidido a impugnação apenas com base na prova documental junta aos autos oficiosamente, não especifica, todavia, quais os documentos que concretamente foram considerados na obtenção da prova relevante para a decisão.

    7. Tal omissão faz incorrer a douta sentença em ilegalidade por violação do disposto nos arts 653º, nº 2, e 659º, nº 3, do CPC.

    8. A impugnante requereu na P.I. a realização de diligências tendentes a demonstrar o infundado das afirmações dos serviços de fiscalização, pedido que não mereceu qualquer pronúncia ao Merit.º Juiz "a quo".

    9. A realização de tais diligências probatórias era imprescindível à boa decisão da causa, pelo que a omissão constitui nulidade e acarreta a nulidade de todos os actos subsequentes praticados no processo, nos termos do art. 201º do CPC.

    10. A douta sentença pôs a cargo da impugnante o ónus de demonstrar a veracidade da sua declaração fiscal, louvando-se, para o efeito no art. 121º do CPT.

    11. Tal proposição viola o princípio da presunção verdade da declaração que enforma a Reforma Fiscal em vigor e, bem assim, o disposto nos nºs 1 e 2 do art. 121º do CPT.

    12. Ao abster-se de ordenar a realização das diligências de prova dos factos controvertidos como lhe era exigível por imperativo dos princípios do inquisitório e do apuramento da verdade material, a douta sentença violou o disposto no art. 40º, nº 1, do CPT/,e no art. 99º, nº 1, da LGT.

    Termos em que, e nos mais de direito, e sempre com o mui douto suprimento de V.s Exas., deve ser dado provimento ao recurso, revogando-se a douta sentença recorrida, assim se fazendo JUSTIÇA» As partes entre aspas e com um tipo de letra diferente, aqui como adiante, constituem transcrições.

    .

    1.4 O Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso nos seguintes termos: «(...) tal como refere o MP na 1ª instância (Parecer de fls 342 a 344), a prova apresentada pela impugnante não foi suficiente para pôr em causa os factos suportados pelo relatório dos Serviços de Fiscalização Tributária.

    Assim tendo em conta o que consta desse relatório, não nos merece qualquer reparo a matéria de facto dada como provada na sentença recorrida e, consequentemente, a decisão de direito».

    1.5 Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

    1.6 As questões sob recurso, delimitadas pelas conclusões da Recorrente, são as seguintes: 1ª - se o processo enferma de nulidade por não terem sido realizadas as diligências probatórias requeridas na petição inicial; 2ª - indagar se a sentença recorrida enferma das nulidades que lhe são assacadas, a determinar a sua anulação, por, alegadamente: a) não se ter pronunciado sobre as questões a).1 - da ilegalidade do «procedimento de aplicação de métodos indiciários» «por se ter operado no cálculo do volume de negócios supostamente omitidos aos registos de vendas com base não numa presunção, mas, sim, em múltiplas presunções em cascata», a).2 - da «ilegalidade da aplicação dos métodos indiciários», na medida em que deles resultou uma diferença no valor das vendas inferior a 1% do declarado e «sabido que o método presuntivo assenta em critérios subjectivos e pressupostos carecidos de rigor, exactidão e certeza», b) por não especificar «quais os documentos que concretamente foram considerados na obtenção da prova relevante para a decisão»; 3ª - verificar se a sentença padece dos erros de julgamento que a Recorrente lhe imputa, conducentes à sua revogação, o que passa por indagar: a) se está fundamentada a decisão da Administração Tributária (AT), de recorrer a métodos indiciários para a fixação da matéria tributável da ora Recorrente; b) se estão verificados os pressupostos que permitiam à AT o recurso a métodos indiciários para a fixação da matéria tributável; c) se o critério utilizado na fixação da matéria tributável está ou não estribado em factos concretos ou, ao invés, resulta de «presunções em cascata».

    d) se a sentença «pôs a cargo da impugnante o ónus de demonstrar a veracidade da sua declaração fiscal», assim violando o disposto no art. 121.º do CPT; e) se a sentença, «ao abster-se de ordenar a realização das diligências de prova dos factos controvertidos como lhe era exigível por imperativo dos princípios do inquisitório e do apuramento da verdade material» violou o disposto no art. 40.º, n.º 1, do CPT , e 99.º da Lei Geral Tributária (LGT).

    * * * 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos, que ora se submetem a alíneas: a) A Impugnante é tributada em imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas, na 1ª Repartição de Finanças de Santa Maria da Feira, pelo exercício da actividade de comércio e indústria transformadora de produtos de cortiça, encontrando-se integrada, em termos de imposto sobre o valor acrescentado, no regime normal de periodicidade mensal; b) A Impugnante é uma sociedade familiar constituída por escritura pública lavrada no dia 14 de Dezembro de 1990, no 1.º Cartório Notarial de Santa Maria da Feira, por A...e os seus sete filhos; c) O seu objecto consiste no comércio e indústria transformadora de produtos de cortiça - importação e exportação -, sendo a sua actividade principal o comércio de fardos de cortiça para pequenos fabricantes de rolhas e, a sua actividade secundária, o fabrico de rolhas, essencialmente de calibre 38 x 24, cujos clientes são exportadores de rolhas; d) Adquire a sua matéria prima no mercado nacional; e) A Impugnante dispõe de instalações fabris artesanais e de dimensão média, para uma empresa familiar; f) A gerência dessa empresa ficou afecta exclusivamente a Alírio Soares Peixoto; g) Os Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária, fizeram uma visita às instalações da Impugnante, em 1996, com referência aos exercícios de 1992 a 1995, tendo elaborado em 10 de Outubro de 1996 a informação que consta a fls. 14 a 289 destes autos; h) A Impugnante possuiu contabilidade organizada registando e arquivando os documentos em vários diários; i) Paga aos seus fornecedores habituais: J..., M..., Lda., em cheque, efectuando pagamentos em numerário a A..., J..., Lda., A..., J..., e A...; j) A contabilidade da Impugnante regista o pagamento ao fornecedor na conta corrente pelo recibo. Todavia, pela análise das contas correntes dos fornecedores, verifica- -se que, apesar de terem sido emitidos cheques para pagamento a certos fornecedores, na respectiva conta corrente apenas se fez registo da facturação, sem se terem registado os pagamentos que foram sendo efectuados, o que permite manter a conta de caixa com um saldo elevado; l) A Impugnante durante os anos de 1992, 1993 e 1994, face aos valores inscritos nas suas declarações periódicas de imposto sobre o valor acrescentado encontra-se sempre em situação de crédito de imposto, sem solicitar qualquer reembolso; m) A Impugnante registou na sua contabilidade a aquisição de vários materiais de construção civil, cimento, areia, tijolos, vigas, tintas, vidros e outros, especificados no quadro de fls. 21, vº, que, pelas quantidades envolvidas, não podem ter sido utilizadas nas instalações fabris da empresa; n) A viatura Volvo, matrícula DQ - 34 - 33, ligeiro de mercadorias pertence ao sócio gerente da Impugnante encontrando-se registadas na contabilidade despesas efectuadas com a reparação e seguro dessa viatura, recibo 643410 e factura 472, de 1994 e facturas 1689, 1739, 37663 e 21.524$00 de reintegrações e amortizações; o) A Impugnante registou compras aos seguintes fornecedores: - J..., factura n.º 580, de 92.02.18, de 6.188.832$00, e 899.232$00 de IVA, cujo documento de quitação só foi registado pela impugnante em Fevereiro de 1995 e que terá sido paga em numerário, - A..., factura n.º 586, de 92.11.16, de 2.946.400$00, e...

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