Acórdão nº 00830/05 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 17 de Janeiro de 2006
Magistrado Responsável | Eugénio Sequeira |
Data da Resolução | 17 de Janeiro de 2006 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul: A. O Relatório.
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P..., S.A., identificada nos autos, dizendo-se inconformada com o despacho proferido pelo M. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa que julgou o Tribunal incompetente em razão da matéria por a competência para o efeito se radicar nos tribunais administrativos de círculo, veio da mesma recorrer para este Tribunal formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem: 1) A douta sentença omitiu a pronúncia sobre a natureza tributária do acto de alteração da classificação pautal de mercadorias, sem que fosse dada à recorrente o direito de contraditar tal alteração; 2) Ora acto posto em crise decorria de um acto de certas autoridades aduaneiras, de eivado manifesta ilegalidade, 3) Pelo que a douta sentença erra a pronúncia quando não considera a vertente tributária daqueles actos das autoridades aduaneiras, incompetentes para alterar a classificação, 4) E ao mesmo tempo ignora o conteúdo dos DUs em que as autoridades aduaneiras, que tiveram contacto físico com as mercadorias e eram as competentes para decidir a classificação, sempre se pronunciaram pela correcção do código pautal declarado; 5) Conforme consta das declarações que essas autoridades exararam nos DU e nos certificados de exportação.
6) Ao não seleccionar os factos relevantes e ao não considerar que se estava perante uma questão de hermenêutica pautal a douta sentença abriu o caminho para um erro de pronúncia quanto à competência material para julgar.
7) A jurisprudência sobre matéria igual é silenciada pela douta sentença, apesar de junta ao processo um acórdão, para ser invocada outra de todo inaplicável ao caso Preceitos violados ETAF- art 62°; CRP art 268° DL 281/91, de 9/8- art 10° Termos em que se requer a revogação da douta sentença agravada.
Foi admitido o recurso para subir imediatamente, nos próprios autos e no efeito meramente devolutivo.
Também a entidade que proferiu o acto em causa - Instituto Nacional de Intervenção e Garantia Agrícola (INGA) - veio a produzir as suas alegações e nestas as respectivas conclusões, as quais igualmente na íntegra se reproduzem: 1. Mal se compreendem as conclusões da agravante quando é certo que a sentença de que se recorre julgou o Tribunal "a quo" materialmente incompetente para conhecer do pedido apresentado, julgando assim a impugnação improcedente.
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O presente litígio tem por objecto um acto imputado ao presidente do INGA contendo uma decisão que, no âmbito da medida relativa a Ajudas Comunitárias e denominada como "Restituições à exportação de carne de aves" - Reg. CEE n° 3665/87, de 27/11, ordena a reposição de quantias recebidas pela agravante, sendo a sua pretensão a anulação de tal acto com fundamento em que o mesmo é ilegal por se entender que há vício de forma e de violação de lei induzido por erro nos pressupostos de facto e de direito.
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Nos autos de que se recorre, estão em causa as chamadas "restituições à exportação", definindo a agravante estas restituições como uma modalidade de benefícios fiscais, para, assim, fundamentar a alegada competência do tribunal tributário.
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O cerne da questão estará em saber se estamos perante uma questão fiscal que abrangerá os benefícios fiscais, por forma a determinarmos a competência dos tribunais tributários face ao disposto no ETAF, ou seja, determinarmos os actos administrativos respeitantes a questões fiscais que não sejam atribuídos à competência de outros tribunais.
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A este respeito, o acórdão do Plenário do STA de 29/10/2003, considerou questões fiscais "tanto as resultantes de imposições autoritárias que postulem aos contribuintes o pagamento de toda e qualquer prestação pecuniária, em ordem à obtenção de receitas destinadas à satisfação de encargos públicos dos respectivos entes impositores, como também das que as dispensem ou isentem, ou, numa perspectiva mais abrangente, as respeitantes à interpretação e aplicação de normas de direito fiscal, com atinência no exercício da função tributária da Administração Pública, em suma, ao regime legal dos tributos".
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A restituição do montante objecto da presente impugnação é pura e simplesmente o regresso do que foi indevidamente pago pelo INGA, pelo que, não traduz a ordem de restituição de benefícios fiscais mas antes, uma ordem de restituição de benefícios financeiros.
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E, o próprio INGA, por força das normas comunitárias está obrigado a garantir a realidade e a regularidade das operações financiadas pela União Europeia, assim evitando e combatendo as irregularidades detectadas, o que passa, necessariamente, por recuperar verbas atribuídas irregularmente (cfr. artº 11° n° 1 e artº 23°, n° 1 do Reg. (CEE) n° 3665/87, alterado pelo Reg. (CEE) n° 495/97 da Comissão, de 18 de Março de 1997).
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As restituições à exportação destinam-se a salvaguardar a participação da Comunidade no comércio internacional, nada tendo que ver com qualquer questão fiscal (aduaneira), nem com benefícios fiscais.
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Assim, é evidente que não se trata aqui de um acto tributário aduaneiro, nem a restituição à exportação uma modalidade de benefício fiscal como erradamente entende a agravante nas suas alegações, mas sim um puro e simples acto administrativo que visa a reposição de quantias ilicitamente recebidas e que nos termos da legislação comunitária está o Estado Português, mais concretamente o INGA, obrigado a recuperar.
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Pelo que realmente o tribunal tributário é incompetente, em razão da matéria, para conhecer da pretensão da agravante.
Termos em que, deve ser julgado improcedente o recurso ora interposto, confirmando-se a sentença recorrida.
O Exmo Representante do Ministério Público (RMP), junto deste Tribunal, no seu parecer, pronuncia-se por ser negado provimento ao recurso, por não nos encontrarmos perante a liquidação de quaisquer direitos aduaneiros mas sim perante uma questão de restituição de natureza financeira, para a qual os tribunais tributários carecem de competência em razão da matéria.
Foram colhidos os vistos dos Exmos Adjuntos.
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A fundamentação.
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A questão decidenda. A única questão a decidir consiste em saber se os tribunais tributários são competentes em razão da matéria para conhecer da presente impugnação judicial.
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A matéria de facto.
Em sede de probatório o M. Juiz do tribunal "a quo" fixou a seguinte factualidade a qual igualmente na íntegra se reproduz: 1) Através do ofício n.º 052344, de 27/12/2000, foi a ora impugnante notificada da intenção do INGA de recuperar o valor pago, acrescido dos valores exigidos pela Regulamentação Comunitária aplicável, no montante total, ora impugnado, de € 147.748,18.
2) A ora impugnante deduziu a presente impugnação em...
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