Acórdão nº 00352/97 de Tribunal Central Administrativo Sul, 06 de Julho de 2000

Magistrado ResponsávelJosé Francisco Fonseca da Paz
Data da Resolução06 de Julho de 2000
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 1ª SECÇÃO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO: 1.

José ....

, residente na Rua ..., no Porto, interpôs recurso contencioso de anulação do despacho, de 3/9/97, da Ministra da Saúde, pelo qual foi negado provimento ao recurso hierárquico que interpusera do despacho, de 31/12/96, do Inspector-Geral da Saúde, que lhe aplicara a pena disciplinar de inactividade pelo período de 1 ano.

A entidade recorrida respondeu, concluindo que devia ser negado provimento ao recurso.

Cumprido o preceituado no art. 67º do RSTA, o recorrente apresentou alegações, onde enunciou as seguintes conclusões: "1ª O recorrente observou o doente Sr. Manuel ... que fizera um implante de pacemaker modo VVI, no Serviço de Cardiologia do HGSA, em 8/11/90; o referido doente não apresentava sinais de falência cardíaca, mas referiu sintomas de síndroma de portador de pacemaker, designadamente cansaço após esforço, conforme confirma em depoimento prestado nos autos (vd. fls. 92 do processo disciplinar); 2ª Era do interesse do doente que lhe fosse implantado um pacemaker com resposta em frequência, que é indispensável para pessoas jovens activas; 3ª O Dr. Preza Fernandes solicitou ao Director do Serviço, Professor Dr. Álvaro ..., autorização para substituir o aparelho inicialmente implantado no doente, autorização que lhe foi recusada, com fundamento de que o doente não apresentava sinais de falência cardíaca e que a implantação era recente, recusou autorizar a substituição do aparelho V V I, aliás na sequência da prática que sempre seguiu, como confirmou no processo disciplinar (vd. fls. 81 e ss. do processo disciplinar); 4ª Respondendo a solicitação do doente, que lhe referiu que "se é para melhor, faça-se o mais depressa possível", o Dr. P... aceitou, posteriormente, efectuar a implantação de novo pacemaker em Hospital Privado, onde exercia funções, não tendo sido imputado ao recorrente qualquer defeito no acto médico praticado; 5ª O doente expressamente declara que não tem motivo de reclamação do recorrente; 6ª O processo disciplinar teve por único escopo obter a condenação do arguido, ora recorrente, como decorre da transcrição das declarações do doente a fls. 92 do processo disciplinar; 7ª Foi cometida nulidade, por não ter sido cumprido o disposto no art. 100º do C.P. Administrativo, não tendo sido notificado o recorrente para se pronunciar sobre as provas produzidas e o relatório final do instrutor; 8ª Carecem de fundamento as conclusões do relatório do instrutor, que é assumido pelo parecer, que mereceu despacho concordante da autoridade recorrida; 9ª É inequívoco que o Director do Serviço recusou e recusaria a substituição do pace por um outro com resposta em frequência, o que é omitido no relatório final do processo disciplinar; 10ª Por outro lado, era dever deontológico do recorrente informar o doente de que com outro aparelho, com resposta em frequência, poderia exercer melhor a sua actividade profissional; 11ª O recorrente agiu na consciência de zelar pelos interesses do doente, sendo certo que o doente nunca apresentou qualquer reclamação; 12ª A instrução do processo disciplinar não é clara, nem profunda, tendo-se omitido nas acareações as perguntas necessárias para esclarecer a verdade, procurando-se apenas os fundamentos que prejudicassem o recorrente; 13ª A sanção aplicada é injusta, incorrecta e ilegal, não tendo fundamento na lei invocada pela Administração; 14ª O douto despacho recorrido é, pois, ilegal e anulável, encontrando-se ferido de vício de violação de lei, erro nos pressupostos de facto e deficiente fundamentação e vício de forma, violando designadamente o disposto nos arts. 4º, 6º e 100º do C.P.Administrativo e 3º, 11º e 25º do Estatuto Disciplinar, aprovado pelo D.L. 24/84".

A entidade recorrida contra-alegou, tendo formulado as conclusões seguintes: "1ª O acto impugnado não padece de vício de forma por violação do art. 100º do CPA, uma vez que esta compilação por força do seu art. 2º, nº 7, não se aplica aos procedimentos especiais como é o caso dos autos; 2ª o processo disciplinar prevê uma forma própria de audiência dos arguidos, que se inicia com a notificação da acusação ou nota de culpa; 3ª Todas as garantias de defesa atribuídas aos arguidos em matéria disciplinar foram inteiramente observadas no caso em apreciação; 4ª a matéria de facto provada condiz com o suporte da punição, não enfermando o acto punitivo de erro de facto nos pressupostos; 5ª a pena aplicada configura-se adequada, justa e proporcional ao interesse público ofendido".

A digna Magistrada do M.P. emitiu parecer, onde concluiu que devia ser concedido provimento ao recurso, por o acto recorrido enfermar de vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto, visto não existir prova suficiente de que o recorrente tenha agido com dolo, ou sequer com culpa.

Colhidos os vistos legais, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

x 2.1. Consideramos provados os seguintes factos:

  1. Após apresentação de uma exposição subscrita por Manuel ... e dirigida ao Director do Serviço de Cardiologia do Hospital Geral de Santo António, o Inspector-Geral da Saúde, por despacho de 19/4/95, ordenou a instauração de processo de inquérito, com vista ao apuramento de factos relacionados com o encaminhamento de doente para clínica privada com pagamento pelo serviço aí prestado.

  2. Após a realização de várias diligências instrutórias foi elaborado Relatório, de onde constam as seguintes conclusões e propostas: "5 conclusões Em face do exposto e apreciado, cabe formular, em síntese, as seguintes conclusões: 5.1 - O Sr. Manuel ..., fez um implante de pace-maker no serviço de Cardiologia do Hospital Geral de Santo António em 8/11/90, tendo sido seguido regularmente em consulta externa do citado serviço pelo Dr. L...; 5.2 - Em 11/1/93 foi observado na Consulta Externa do Serviço de Cardiologia do HGSA pelo Dr. José ..., assistente eventual de Cardiologia do HGSA que, apesar de registar que o doente apresenta uma situação clínica controlada e sem alterações, incute no utente a necessidade de reimplante de um outro pace-maker a efectuar fora dos serviços hospitalares, tendo-o encaminhado para a realização de implante no Hospital da Venerável Ordem Terceira de Nossa Senhora do Carmo, onde dirige o Departamento de Cardiologia; 5.3 - Nos dias 15 e 16/1/93 o Sr. Manuel ... foi internado e intervencionado, para reimplante de pace-maker de modo DDD-R, pelo Dr. Preza Fernandes no Hospital da Venerável Ordem Terceira de Nossa Senhora do Carmo. Pelos serviços hospitalares o utente pagou ao Hospital 1.182.942$00 e ao Dr. Preza Fernandes 185.000$00; 5.4 - Esta conduta, traduzida no encaminhamento do doente comum do Hospital Geral de Stº. António para clínica particular, com o objectivo de obter para si vantagens patrimoniais consubstancia a violação dos deveres gerais de imparcialidade, isenção, zelo e lealdade e é imputada ao Dr. José Manuel Duarte Preza Fernandes 6-Propostas: Atentas as conclusões propõe-se: 6.1 - Que seja instaurado processo disciplinar ao Sr. Dr. José ...., assistente eventual de cardiologia do Hospital Geral de Stº. António, por ter violado os deveres...

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