Acórdão nº 00195/03 de Tribunal Central Administrativo Sul, 08 de Novembro de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelFrancisco Rothes
Data da Resolução08 de Novembro de 2005
EmissorTribunal Central Administrativo Sul
  1. RELATÓRIO 1.1 A Administração tributária (AT), tendo verificado que A...e mulher, J... (adiante Recorridos, Contribuintes ou Impugnantes), na declaração de rendimentos que apresentaram relativamente ao ano de 1995 não declararam qualquer valor respeitante às vendas de duas fracções autónomas de um edifício sujeito ao regime da propriedade horizontal, efectuadas pelo preço global de esc. 17.500.000$00, em cujos contratos, celebrados naquele ano, constam como proprietários e vendedores, fez acrescer este valor aos rendimentos declarados e liquidou-lhes adicionalmente Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) e respectivos juros compensatórios, do montante de esc. 9.204.389$00.

    1.2 Os Contribuintes, na sequência do indeferimento tácito da reclamação graciosa que deduziram contra a referida liquidação adicional, pediram ao Juiz do Tribunal Tributário de 1.ª instância do Porto, em processo de impugnação judicial, a anulação deste acto com fundamento em inexistência de facto tributário.

    Alegaram, em síntese, o seguinte: - em 1993 celebraram com a sociedade denominada "Pereira & Ferreira Pinto, Lda." um contrato promessa de compra e venda relativamente a um prédio de que eram proprietários; - na mesma data, receberam a totalidade do preço e efectuaram a tradição do prédio para aquela sociedade; - «para facilitar registos e outras questões legais, nomeadamente a passagem notarial para o Comprador, ou para uma terceira pessoa por ele indicada, foi elaborada a respectiva Procuração Forense» (1-2); - assim, «os factos tributários ocorreram precisamente, e tão apenas, em 1993»; - «dos factos económicos, constatam-se duas realidades distintas: a venda do prédio do Impugnante para a empresa PEREIRA & FERREIRA PINTO, LDª. em 1993; e a partir de 1994, a transformação do prédio em propriedade horizontal e subsequente venda a terceiros, é efectuada pelo Comprador»; - «da mesma "coisa" o impugnante não pode vender à empresa, e mais tarde vender fraccionadamente a terceiros!...

    »; - «As vendas subsequentes, e a titularidade dos rendimentos subjacentes, são realidades económicas do Comprador, e nunca do Impugnante como a Administração pretende considerar».

    1.3 O Juiz do Tribunal Tributário de 1.ª instância do Porto proferiu sentença na qual considerou, em resumo, que: - para que ocorra facto tributário em sede de IRS é necessário que existam rendimentos sujeitos àquele imposto; - no caso sub judice ficou provado que das vendas em causa não resultou qualquer rendimento para os Impugnantes, pois ficou demonstrado que, à data em que as mesmas tiveram lugar, os Impugnantes, na sequência de um contrato-promessa, já tinham operado a tradição do prédio onde as fracções autónomas vendidas foram construídas, como reconheceu a AT em informação vinculativa solicitada pela Impugnante mulher para efeitos de sisa, e já tinham recebido o respectivo preço do construtor; - a intervenção dos Impugnantes nas escrituras de compra e venda (3) «foi meramente formal e imposta pela circunstância de aqueles não terem celebrado o contrato definitivo com a sociedade [construtora] e, portanto, serem eles, em termos jurídicos, os proprietários das fracções e os únicos com legitimidade para a sua alienação»; - que ao Direito Fiscal «não é indiferente a tributação dos efeitos económicos pretendidos pelas partes que, na realidade, se tenham produzido».

    Assim, com fundamento em inexistência de facto tributário, porque as vendas em causa não produziram qualquer rendimento para os Impugnantes, julgou a impugnação judicial procedente.

    1.4 A Fazenda Pública, através do seu Representante junto do Tribunal Tributário de 1.ª instância do Porto, recorreu daquela sentença para este Tribunal Central Administrativo e o recurso foi admitido com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

    1.5 A Recorrente apresentou as alegações de recurso, que concluiu nos seguintes termos: « 1. A douta sentença sob recurso julgou procedente a presente impugnação por haver concluído padecer de ilegalidade a liquidação de IRS referente ao ano de 1995, por inexistência de facto tributário, entendendo ter ficado provado que, em resultado das vendas das fracções autónomas em causa nos autos, os impugnantes não auferiram qualquer rendimento, dado que quando essa venda foi efectuada, já os mesmos haviam operado a tradição do prédio onde essas fracções foram construídas para a sociedade "Pereira & Ferreira Pinto, Lda", que por seu turno, já havia pago o respectivo preço aos impugnantes.

    Entendeu ainda que: "A intervenção dos impugnantes nas vendas das referidas fracções foi meramente formal e imposta pela circunstância de aqueles não terem celebrado o contrato definitivo com a sociedade "Pereira & Ferreira Pinto, Lda" e, portanto, serem eles, em termos jurídicos, os proprietários das fracções e os únicos com legitimidade para a sua alienação." 2. A Administração Tributária considerou como rendimentos da categoria C de IRS a tributar na esfera jurídica dos recorridos, os valores referentes à alienação das fracções autónomas "E" e "F" do prédio urbano em propriedade horizontal sito na Rua do Meiral, Campanhã, com entrada pelo nº 629, correspondendo ao 1º andar esquerdo e direito, por escrituras celebradas, respectivamente, em 12/10/95 e 26/07/95, em que os mesmos figuram como vendedores.

  2. O contrato promessa de compra e venda com tradição da coisa objecto do contrato, é o primeiro passo para a concretização da intenção dos promitentes, que se virá a realizar através do contrato de compra e venda, tomando definitiva a transferência dessa coisa.

  3. Não ficou provado nos autos que o contrato prometido se tenha realizado antes da venda das fracções autónomas citadas, pelo que não se deu igualmente antes dessa data, a transferência definitiva e titulada do imóvel objecto do contrato promessa de 30/12/93, antes pelo contrário, retira-se da cláusula quinta desse contrato promessa, que a concretização definitiva do mesmo se faria pela outorga das escrituras públicas de compra e venda, que teriam por objecto as fracções após a constituição da propriedade horizontal.

  4. O conceito fiscal de transmissão por força da tradição do bem para a promitente compradora, aquando da realização do contrato promessa de compra e venda, só opera para efeitos de incidência da Sisa, face ao disposto no nº 2 do § 1º do artº 2º do CSISD, sujeitando a adquirente ao pagamento deste imposto, mas não releva para as regras de incidência de IRS sobre rendimentos da categoria C, não relevando igualmente o pagamento desses rendimentos.

  5. O que releva é o momento da verificação dos factos tributários sujeitos a tributação, que ocorreram na data da celebração das escrituras de compra e venda das fracções autónomas "E" e "F" acima citadas, que constituem actos de comércio sujeitos a IRS, categoria C, nos termos do artº 4º do CIRS, sendo os sujeitos passivos do imposto os ora recorridos, que foram quem se assumiu como tal, ao tomarem a posição de vendedores nas referidas escrituras, embora outorgadas por procurador munido de procuração irrevogável, Manuel Fernando Coimbra Pereira, sócio-gerente da já citada "Pereira & Ferreira Pinto, Lda".

  6. A procuração irrevogável não afasta a tributação em IRS na esfera jurídica dos recorridos, pois nos termos dos artºs 262º e 258º do CC, os negócios jurídicos celebrados por procurador a quem foram dados poderes de representação para a sua conclusão, produzem os seus efeitos em relação aos representados.

  7. A douta sentença recorrida, ao concluir pela inexistência de facto tributário por considerar que os recorridos não auferiram qualquer rendimento no ano de 1995 pela venda das referidas fracções, desconsiderando os elementos essenciais definidores da incidência do imposto, está a violar o princípio da tipicidade legal, implícito no principio da legalidade fiscal, garantido no nº 2 do artº 106º da CRP e o artº 4º do CIRS.

    Nestes termos, deve ser dado provimento ao presente recurso revogando-se a douta decisão recorrida, com as legais consequências».

    1.6 Os Recorridos contra-alegaram, pugnando pela manutenção da sentença recorrida.

    1.7 Foi dada vista ao Representante do Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo, tendo o Procurador-Geral Adjunto emitido parecer no sentido de que o recurso merece provimento pelas razões invocadas nas alegações da Recorrente.

    1.8 Colhidos os vistos dos Juízes adjuntos, cumpre apreciar e decidir.

    1.9 As questões sob recurso, suscitadas e delimitadas pelas conclusões da Recorrente, são as seguintes: 1.ª - se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento quanto à matéria de facto na medida em que deu como provado que os Impugnantes não auferiram qualquer rendimento com as referidas vendas das fracções autónomas; 2.ª - se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento de direito por ter considerado inexistir facto tributário.

    * * * 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO 2.1.1 Na sentença recorrida fixou-se a matéria de facto nos seguintes termos: «2.1 Matéria de facto provada, não provada e respectiva motivação a) Com data de 30 de Dezembro de 1993, os impugnantes celebraram com "Pereira & Ferreira Pinto, Lda", o "contrato promessa de compra e venda" que teve como objecto o prédio composto de casa de cave, rés-do-chão e andar com logradouro e terreno junto sitos na freguesia de Campanhã, concelho do Porto e inscrito na respectiva matriz urbana sob os artigos 722, 723, 724 e 725, e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

    b) Nos termos que constam desse "contrato", e entre o mais, os impugnantes transferiram a posse do prédio para a "Pereira & Ferreira Pinto, L.da".

    c) Mais convencionaram: "O pagamento do preço acordado será efectuado pela forma seguinte: a) no acto da assinatura do contrato será paga a importância de doze milhões e sessenta mil duzentos e dez escudos, que declaram ter recebido e de que dão competente quitação, titulada pelo cheque número nove três zero zero cinco seis...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT