Acórdão nº 00195/04 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 21 de Junho de 2005

Magistrado ResponsávelCasimiro Gonçalves
Data da Resolução21 de Junho de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

RELATÓRIO 1.1. A Fazenda Pública recorre da sentença que, proferida no TAF de Lisboa II, julgou procedente a impugnação contra a liquidação de IRS de 1998, que ali correu termos sob o nº 618/04 e foi deduzida por V...e J..., ambos com os sinais dos autos.

1.2. Formula as seguintes conclusões: I - A Administração Fiscal procedeu à liquidação adicional de IRS do ano de 1998, baseada no entendimento de que as importâncias auferidas pelo sujeito passivo, não tinham natureza de ajudas de custo, mas sim complemento de remuneração.

II - Este entendimento baseia-se nos factos apurados e mencionados no relatório da Inspecção Tributária conforme foi referido nos pontos 10 e 11 das presentes alegações.

III - A conjugação dos factos e circunstâncias indiciantes, apontam no sentido de que as quantias recebidas a título de ajudas de custo, têm a natureza de remuneração, conforme foi referido nos pontos 8 a 10, e jurisprudência (em RJ. TCA n° 180/03 de 21/10/2003, Ac. TCA 6.5.2003, Recurso n° 5036/01).

IV - Procedeu bem a Administração Fiscal em considerar tais montantes como elemento integrante da remuneração do trabalhador, portanto sujeitas a IRS.

Termina pedindo o provimento ao recurso e a consequente improcedência da impugnação.

1.3. Contra-alegaram os recorridos, sustentando a confirmação do julgado e terminando por formular as Conclusões seguintes: 57. Nestes termos, os Recorridos concluem as suas alegações requerendo que seja o presente recurso julgado improcedente e, consequentemente, seja mantida a sentença proferida, porquanto: 58. Os fundamentos utilizados pelo Tribunal "a quo" foram os seguintes: * Em primeiro lugar que, nos termos do artigo 2° n° 3 alínea e) do CIRS (redacção em vigor no momento da prática dos factos), só pode haver lugar a tributação sobre montantes reembolsados a título de ajudas de custo se tais montantes excederam os limites legais privados anualmente; * Em segundo lugar que, de acordo com a jurisprudência dos tribunais superiores, as atribuições patrimoniais feitas a trabalhadores por conta de outrem com carácter compensatório e que visam reembolsar os trabalhadores de despesas efectuadas por conta das empresas, não estão abrangidos pelo âmbito de incidência do IRS; e, * Em terceiro lugar, que o ónus da prova relativo à (não) finalidade compensatória dos montantes reembolsados ao Recorrido cabe à Administração Fiscal que não o logrou fazer.

  1. A sentença recorrida fundamenta-se, e bem, na não tributação de ajudas de custo que não excederam os limites legais, tal como o preceituado no CIRS, e que manifestaram ter um carácter compensatório.

  2. A Recorrente não concordou com a decisão do Tribunal "a quo", argumentando que: * As importâncias recebidas a título de ajudas de custo tinham carácter permanente e que, pelo que decorre do Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho, tais importâncias devem ser consideradas como remuneração do Recorrido; e, * Que a Administração Fiscal logrou provar no relatório de inspecção fiscal a "justificação contabilista" do complemento de remuneração, em virtude de contradições entre os boletins do trabalhador e a contabilidade da sua entidade patronal.

  3. Concluímos, no entanto, que: - Quer a doutrina, quer a jurisprudência têm entendido só haver lugar a tributação de montantes reembolsados a título de ajudas de custo quando estes são subsumidos no conceito de rendimento do trabalho dependente, nos termos e para os efeitos do artigo 2° n° 3 alínea e) do CIRS e apenas na parte em que excedem os limites legais.

- A jurisprudência tem vindo, acertadamente, a defender que a característica essencial das ajudas de custo é o seu carácter compensatório, visando reembolsar o trabalhador por despesas que teve de suportar a favor da sua entidade patronal, por motivos de deslocações ao serviço desta.

- O ónus da prova de que os montantes percebidos pelo Recorrido não têm finalidade compensatória compete à Administração Fiscal nos termos da regra do artigo 100° do CPPT pela qual se estabelece o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos sobre quem os invoque.

- A Administração Fiscal num primeiro momento, e o Digno Representante da Fazenda Pública num segundo momento, nunca lograram fazer prova cabal do carácter remuneratório dos montantes reembolsados a título de ajudas de custo e quilómetros percorridos em viatura própria. E, - De acordo com a melhor jurisprudência superior e com a doutrina, qualquer referência ao regime fixado para os servidores do Estado no que respeita a despesas de transporte apenas significará uma aplicação dos limites quantitativos nele dispostos (i.e., limites legais anuais de pagamento) e não uma remissão global para o regime de processamento de ajudas de custo dos trabalhadores do Estado, maxime no que concerne ao modo de preenchimento dos boletins de deslocação e à sua fundamentação.

Terminam pedindo a confirmação da sentença recorrida.

1.4. O EMMP emite parecer no sentido do não provimento do recurso.

1.5. Corridos os vistos legais, cabe decidir.

FUNDAMENTOS 2.1. A sentença recorrida considerou provada a matéria de facto seguinte: 1 - Durante o ano de 1998, o impugnante V...exerceu funções por conta da firma "Indústrias de Carnes Nobre, S.A.", enquanto chefe de departamento e director de compras (cfr. documentos juntos a fls. 71 a 75 dos autos; cópia de relatório da inspecção tributária junta a fls. 18 a 25 do apenso administrativo); 2 - Durante o ano de 1998, o impugnante auferiu da empresa "Indústrias de Carnes...

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