Acórdão nº 2872/03 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 13 de Janeiro de 2004 (caso NULL)
Magistrado Responsável | DR. JORGE ARCANJO |
Data da Resolução | 13 de Janeiro de 2004 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de COIMBRA I – RELATÓRIO O Autor – RUI – instaurou, no Tribunal Judicial da Comarca da Figueira da Foz, a presente acção declarativa, com forma de processo ordinário, contra os Réus – CECÍLIA e marido MANUEL.
Alegou, em resumo: No dia 3 de Janeiro de 1998, pelas 18,45 horas, já de noite, ao circular com o motociclo de matrícula 55-10-IR, no lugar de Quinta dos Vigários, no sentido Ribas/Quinta dos Vigários, pela faixa de rodagem do lado direito e em velocidade moderada, foi embater num dos animais de raça bovina que a Ré conduzia na mesma faixa de rodagem.
O acidente deveu-se a culpa exclusiva da Ré, por não levar sinalização luminosa, violando o art.93 nº1, 3 e 4 do CE.
Em consequência da colisão, sofreu danos patrimoniais e não patrimoniais, cuja responsabilidade se comunica ao Réu marido.
Pediu a condenação dos Réus apagar-lhes da quantia de 6.467.464$00, acrescida dos juros de mora, desde a citação.
Contestaram os Réus, defendendo-se por impugnação, ao imputarem a culpa exclusiva do acidente ao Autor.
Requereram a intervenção principal provocada da Companhia de Seguros O Trabalho, e em reconvenção, alegando prejuízos patrimoniais, pediram a condenação do Autor e da Seguradora, no pagamento da quantia de 2.585.000$00, acrescida de juros legais.
Replicou o Autor, mantendo a posição inicial.
A chamada Seguradora contestou o pedido reconvencional, arguindo a sua ilegitimidade por não haver seguro válido e eficaz na data em que ocorreu o acidente.
Chamado Fundo de Garantia Automóvel invocou a excepção peremptória da prescrição, alegando ter decorrido já o prazo prescricional de três anos.
No saneador decidiu-se absolver da instância a Companhia de Seguros O Trabalho e absolver do pedido o Fundo de Garantia Automóvel, com fundamento na prescrição do direito exercitados pelos Réus/reconvintes.
Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença que absolveu os Réus do pedido.
O Autor interpôs recurso de apelação, em cuja motivação concluiu, em resumo: 1º) – A pretensão do Autor situa-se no âmbito da responsabilidade civil extra-contratual, prevista no artigo 493 do CC., impendendo sobre os Réus uma presunção legal ( “ juris tantum “ ) de culpa, pelo que só estariam exonerados da obrigação de indemnizar os prejuízos por si sofridos, caso provassem que o acidente tinha ocorrido sem qualquer culpa sua.
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) – Estando provado que a Ré mulher circulava com os animais sem qualquer sinalização luminosa, os Réus, para ilidirem a presunção, teriam que fazer prova inequívoca de que o acidente ocorrera sem culpa sua, ou seja, mesmo que os animais circulassem com iluminação, sempre o acidente teria ocorrido.
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) - Os Réus não lograram fazer tal prova, tanto mais que, assentando a sua defesa no excesso de velocidade por parte do recorrente, não provaram tal matéria, por o quesito referente à mesma haver sido dado como não provado.
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) - Nos termos da presunção que onerava os Réus, era a estes que incumbia provar que nenhuma culpa tinham tido na ocorrência do acidente e não ao A. provar o contrário.
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) - O facto de na sentença recorrida se ter dado por provado que existiam dois postes de iluminação próximos do local do acidente, um a 16 metros e outro a 25 metros, não era bastante para se considerar que os Réus tinham ilidido a presunção de culpa.
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) - Por um lado não se provou, e nem sequer se quesitou, que tais postes estivessem activos, isto é em funcionamento no momento do acidente. Por outro, que, sendo isso verdade, fosse suficiente parar o recorrente avistar os animais a tempo de evitar o acidente, ignorando-se ainda que a existência de dois focos de luz próximos um do outro, sobretudo com tempo húmido cria dificuldades acrescidas quando se sai do local iluminado para o escuro.
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) - Ficou também por provar, porque também não foi quesitado, se mesmo atendendo à existência dos postes de iluminação e se os mesmos estivessem ligados, que era possível ao recorrente avistar os animais a tempo de evitar o acidente e mesmo sem os mesmos estarem acompanhados de qualquer sinal luminoso, questão de primordial importância.
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) – Os Réus não lograram ilidir a presunção de culpa que os onerava, mantendo-se a obrigação de indemnizar os prejuízos causados ao recorrente.
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) - Em qualquer caso, e ao contrário do que se afirma na sentença recorrida, sempre seria de aplicar o disposto no artigo 502 do Código Civil, dado que, tratando-se de animais de raça bovina e leiteira, a sua utilização deverá ser feita predominantemente em estábulo e no campo, comportando a circulação dos mesmos na via pública um risco acrescido, com uma especial perigosidade, e daí que os Réus teriam que ser responsabilizados pelo risco.
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) – A sentença recorrida violou o disposto nos artigos 97, 1 e 4 do C. Estrada, 493 e 502, ambos do C. Civil.
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) – A não se entender assim, a sentença é nula, nos termos do artigo 668 n° 1, alíneas b) c) e d) do CPC, por não fundamentar de facto e de direito, por a decisão estar em oposição com a matéria dada por provada, e a sentença não se pronunciou quanto à aplicação do artigo 502 do C. Civil.
Os apelados não apresentaram contra-alegações.
II - FUNDAMENTAÇÃO 2.1. – O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões dos recorrentes ( arts.684 nº3 e 690 nº1 do CPC ), impondo-se decidir as questões nelas colocadas, bem como as que forem de conhecimento oficioso, exceptuando-se aquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras ( art.660 nº2 do CPC ).
Considerando as conclusões formuladas pelo apelante, as questões essenciais que importa decidir são as seguintes: a) - A culpa na produção do acidente; b) - Se os Réus ilidiram a presunção de culpa estabelecida no art.493 nº1 do CC; c)- A responsabilidade nos termos do art.502 do CC.
d) - A nulidade a sentença recorrida.
2.2. – Os factos Provados: 1) - No dia 3 de Janeiro de 1998, pelas 18 horas e 45 minutos, o Autor conduzia o motociclo de matrícula 55-10-IR, propriedade do seu irmão Paulo Jorge Rodrigues Eulálio, na EM —593 atravessando a localidade de Quinta dos Vigários, no sentido Ribas/Quinta dos Vigários e pela metade direita da faixa de rodagem atenta essa direcção de marcha.
2) - A Ré CECÍLIA, seguia também no sentido Ribas/Quinta dos Vigários, conduzindo dois animais de raça bovina.
3) - A Ré transitava à frente dos animais que seguiam lado a lado.
4) - E sem trazer consigo qualquer dispositivo de sinalização luminosa para assinalar a presença dos animais a quem circulasse nessa estrada em ambos os sentidos de trânsito.
5) - Nas circunstâncias de tempo e lugar referidas em 1, já anoitecera e o tempo estava húmido; 6) - A estrada onde transitava o motociclo de matrícula 55 – 10 - IR, a Ré Cecília Cunha e os Bovinos que esta conduzia tinha a largura de 5,50 metros.
7) - O motociclo de matricula 55 - 10 - IR embateu no animal de raça bovina que circulava mais à esquerda, considerando o sentido de marcha Ribas/Quinta dos Vigários.
8) - O embate ocorreu a uma distância de 0,80 metros da berma do lado direito atento o apontado sentido de marcha.
9) - Após a colisão, o motociclo de matrícula 55 – 10-IR foi imobilizar-se a uma distância de 11,30 metros do local do embate, sobre a metade direita da faixa de rodagem, considerando a direcção de marcha referida.
10) - Ficando o Autor, inanimado, sobre a metade esquerda da faixa de rodagem, considerando a mesma direcção de marcha, e a cerca de 6,20 metros do local do embate.
11) - Em virtude da colisão morreu o animal referido em 7.
12) - Os dois animais de raça bovina pertenciam aos Réus Cecília Cunha e MANUEL.
13) - Os quais se dedicavam à venda do leite produzido por esses animais, assim como à venda das sua crias.
14) - Os animais de raça bovina conduzidos pela Ré Cecília ocupavam, na quase totalidade, a metade direita da faixa de rodagem, atento o sentido de marcha Ribas/Quinta dos Vigários (resposta ao quesito 1º).
15) - No local onde ocorreu a colisão referida em 7, existia um poste de iluminação pública situado a cerca de 16 metros para nascente, considerando o sentido de marcha Ribas/Quinta dos Vigários e um outro poste que desse local se situava a cerca de 25 metros para poente, atenta a mesma direcção de marcha (resposta aos quesitos 8º e 9º).
16) - Em virtude do embate referido em 7, o Autor sofreu: fractura dos ossos do antebraço direito; traumatismo craniano sem perda de conhecimento e fractura exposta da órbita direita (resposta ao quesito 18º).
17) - Tendo ficado internado durante nove (9) dias no Hospital Distrital da Figueira da Foz para onde foi transportado após o embate (resposta ao quesito 19º).
18) - Durante o período de internamento acima referido foi o Autor submetido a uma intervenção cirúrgica (osteossintese) do rádio e cúbito (resposta ao quesito 20º).
19) - E a uma outra intervenção (osteossíntese) à órbita malar direita (resposta ao quesito 21º); 20) - Tendo tido alta hospitalar em 16 de Janeiro de 1998 (resposta ao quesito...
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