Acórdão nº 823/06 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 14 de Junho de 2006 (caso NULL)

Data14 Junho 2006
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Recorrente: A....

Recorrido: B....

  1. Relatório.

    Desavindo com o despacho de não pronúncia, do arguido B..., pela prática que lhe pretende ser assacada, em autoria material, de um crime de difamação p. p pelos arts. 180º,nº1,183º,nº1,al. a), 184º e 132º, nº2,al.j), todos do Cód.Penal, proferido no processo supra referido, recorre o assistente A..., com os sinais constantes de fls. despedindo a sua diserta motivação pela forma seguinte: - A decisão instrutória proferida nos presentes autos, parece partir do pressuposto errado que a decisão em questão tem carácter provisório ou rebus sic stantibus; - Quando, em boa verdade, tem o mesmo precípuo significado de uma decisão absolutória proferida a final; - O Mmo. Juiz parece começar por reconhecer o carácter objectivamente difamatório que cabe às imputações do arguido, em concreto aquelas segundo as quais, o assistente/recorrente, na qualidade em que intervém, seria deturpador e mentiroso, “manipulador” de episódios e números, publicitador de mentiras grosseiras, “escamoteador” de documentos, etc.; - Acabando por “perdoar-lhe” a ilicitude do seu comportamento ou a respectiva punibilidade por, alegadamente, as mencionadas afirmações terem sido feitas no exercício do “direito de critica” e no âmbito da “luta politica””. Porém, - Não cuidou o Mmo. Juiz fundamentar minimamente este acervo de considerações eximentes, o que faz que o despacho de não pronúncia esteja ferido de nulidade, por violação do disposto no art. 205º da CRP e 97º do CPP; - Normas que resultam violadas por o Senhor Juiz, pura e simplesmente, as ter obliterado. E ainda, - Mal feridos resultaram, ainda, pela mesma razão, os comandos das alíneas a) e b) do nº2 do art. 180º do Cód.Penal, normas que o Mmo. Juiz ostracizou, na ponderação que lhe cabia fazer; - Pelo que o despacho de não pronúncia deve ser revogado, proferindo Vª Exas., a substitui-lo, acórdão que pronuncie o arguido/recorrido e determine o envio do processo para julgamento, onde lhe será assegurada a plenitude das garantias de defesa (artigo 32º,nº1 da Constituição da República Portuguesa.

    Em bem gizadas e facundas contra-alegações, o Exmo. Senhor Procurador da República conclui que: - A decisão de não pronúncia, quando o tribunal declara findo o processo determinando o seu arquivamento, é um acto decisório final; - Em consonância com o disposto no art. 205º,nº1 da CRP, que impõe a fundamentação das decisões dos tribunais (principio geral extensivo a todos os ramos do direito), que não sejam de mero expediente, o art. 97º, n4 do CPP estabelece que “os actos decisórios (cuja definição consta dos nºs 1 e 2, desse preceito legal) são sempre fundamentados, devendo ser especificados os motivos de facto e direito da decisão”; Contudo, não estabelecendo a lei, pormenorizadamente – como sucede, por exemplo, em relação à sentença (art.374º,nº2 do CPP), ou em relação ao despacho de pronúncia (arts. 283º, nº3, ex vi 308º,, nº2 do CPP) – os requisitos da fundamentação do despacho de não pronúncia, há-de aceitar-se que é suficiente qualquer fórmula, mesmo resumida ou sumária, da qual, em conjugação lógica e cronológica com outros actos processuais anteriores, se possa concluir que: o julgador ponderou os motivos de facto e de direito da sua decisão, isto é, não agiu discricionariamente; a decisão tem virtualidade para convencer os interessados e os cidadãos em geral da sua correcção e justiça e o controlo da sua legalidade, nomeadamente por via de recurso, não é impedido ou prejudicado pela forma como é proferida; - Assim sendo, pode concluir-se que os termos em que está fundamentado despacho impugnado satisfazem os requisitos formais exigidos pelo art. 97º, nº4 do CPP, do CPP, visto que dele constam expressamente as circunstâncias factuais, referindo, outrossim, as pertinentes disposições legais que conduziram a decisão – numa exposição que, manifestamente, não impede a apreciação critica dos destinatários ou do tribunal superior, nem revela discricionariedade - , pelo que, o valor do acto decisório não se mostra afectado; - Acresce que, na linha de alguma jurisprudência, não tendo o recorrente arguido a invalidade do despacho de não pronúncia, por pretensa falta de fundamentação, no prazo de três dias a contar do conhecimento da irregularidade, requerendo que o Snr. Juiz concretizasse as razões de direito e de facto que fundamentavam a sua decisão, sempre estaria sanada a irregularidade. Tal arguição há-de ser feita na instância em que ocorreu o dito vício e não por via de recurso; - Nos caos dos autos, a actuação do arguido limitou-se a uma apreciação critica, por muita impressiva que aos olhos do assistente possa parecer, da conduta deste enquanto titular da presidência do IPC, não se dirigindo à sua pessoa enquanto tal.

    Prendendo-se a razão decisiva da atipicidade da conduta do arguido como objectivo da exposição, feita por este: o de procurar, eventualmente, esclarecer e pôr fim às querelas sobre a gestão das obras levadas a cabo pelos serviços centrais do IPC e ISEC, não se revelando qualquer intenção de atingir o assistente na sua honra; - Pelo que não tendo o arguido preenchido o tipo objectivo de ilícito do crime de difamação, já que não foi violado o bem jurídico em causa, não era necessário – como, aliás, se fez na douta decisão instrutória – a introdução das especificas causas de justificação (art. 180º,nº2, als. a) e b) do CP); - Com efeito, as especificas causas de justificação só relevam se e quando se encontrar o tipo legal de crime. Isto é, só depois de comprovado que o tipo legal (incriminador) da difamação foi preenchido é que se deve ou pode proceder á análise das causas de justificação para saber se, caindo a factualidade dentro da previsão do tipo-de-ilicito, poderá ser excluída a sua ilicitude; - Por tudo o exposto, em nosso entender, não houve qualquer violação das normas referidas nas conclusões da motivação do recorrente, nem de qualquer outra disposição legal, pelo que, o despacho de não pronúncia não merece qualquer reparo, devendo o mesmo manter-se, julgando-se, consequentemente, improcedente o presente recurso.

    Nesta instância, o distinto Procurador-Geral Adjunto, louvando-se nas lastradas e bem fornidas contra-alegações é de parecer que o recurso não deverá proceder.

    Em resposta, o recorrido B..., formula as seguintes conclusões: -Na pronúncia o juiz não julga a causa; verifica se se justifica que com as provas recolhidas no inquérito e na instrução o arguido seja submetido a julgamento para se julgado pelos factos da acusação. A lei só admite a submissão a julgamento desde que a prova dos autos resulte uma probabilidade de ao arguido vir a ser aplicada, por força delas, uma pena ou medida de segurança (art.º 283, n.º 2 CPP) não impõe a mesma exigência de verdade requerida pelo julgamento final.

    -Nos presentes autos existem já duas decisões de duas entidades distintas - uma do Ministério Público, outra do Juiz de Instrução Criminal – que são absolutamente coincidentes - o que deveria obstar à recorribilidade da decisão ex vi do disposto no n.º 1 do art.º 310.º e 400.º do CPP) – ambas no sentido de que da matéria probatória recolhida nos autos não existem indícios suficientes da prática do crime de difamação (…) “que é assacado no requerimento de abertura da instrução, antolhando-se com maior probabilidade a sua absolvição, em sede de julgamento.”.

    -Ainda assim, analisada mais uma vez a prova dos presente autos, desde logo consta-se que os mesmos tiveram origem numa queixa do recorrente contra o recorrido e uma outra queixa do ora recorrido contra o recorrente, tendo em sede de inquérito o MP proferido despacho de arquivamento por: “Com efeito, ter-se-á de atender a que o texto escrito pelo arguido A... o foi para ser lido e divulgado aquando da Reunião Geral de Alunos em que se iria analisar a questão das obras nos Departamentos de Engenharia Electrotécnica e de Engenharia química do ISEC e que foi em resposta a este texto, e às imputações ali feitas, que o arguido B..., após decisão neste sentido do Conselho Directivo de que é Presidente, convocou uma conferência de imprensa em que leu o texto junto a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT