Acórdão nº 2847/05 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 30 de Novembro de 2005 (caso None)
Magistrado Responsável | DR. JORGE DIAS |
Data da Resolução | 30 de Novembro de 2005 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam, em audiência, no Tribunal da Relação de Coimbra:*No Processo Comum Singular nº 690/03.2PAMGR do 2º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca da Comarca da Marinha Grande, por sentença de 05.01.26, foi, no que para a apreciação do presente recurso interessa, decidido: - Absolver os arguidos A..., B... e C..., do crime de furto qualificado p. e p. pelos artºs. 203º e 204º nº 1 f) CP, de que vinham acusados, bem como do pedido de indemnização contra eles formulado.
Inconformado, o assistente interpôs recurso da sentença, em cuja motivação produziu as seguintes conclusões ( sic): " 19. Com efeito a este propósito refere o Senhor Juiz Conselheiro Campos Costa num artigo publicado In revista dos tribunais Ano 74 pág. 130 a 143 intitulado " para uma melhor organização da Oralidade em Portugal ": De nada terá valido o esforço do legislador em promulgar as melhores leis para a resolução das questões de Direito, se os Tribunais não são capazes de averiguar com verdade os factos ou matérias ocorridas".
Ora: 20. A produção e Gravação de elementos de prova, designadamente testemunhal é aquela que mais duvidas e angustias suscita quanto á respectiva valoração pelo Tribunal. Decerto os depoimentos não são bacteriologicamente puros, resultando de um certo circunstancialismo, principalmente quando em causa então elementos objectivos e subjectivos dos quais resulta a perca do meio de transporte pelo Assistente em prol da Absolvição dos arguidos.
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Mas por sua vez o dever de fundamentação da decisão não constitui algo a que corresponda uma soma de depoimentos ou outros elementos sobre determinado facto, como aliás referiu Eurico Lopes Cardoso, in BMJ nº 80 " Os depoimentos não são só palavras, nem o seu valor pode ser medido apenas pelo tom em que foram proferidos. Todos sabemos que a palavra é só um meio de exprimir o pensamento sendo por vezes também um meio de o ocultar " 22. Porém o tribunal recorrido nada fez, bastou-se com a Pseudo prova que revelou lacunas, contraditórias, e obscuras, nem sequer se atendeu á confissão feita pelos Arguidos ao Assistente e sua mãe.
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Face ao exposto caberá ao tribunal de Recurso, na reapreciação da decisão impugnada, proceder a uma valoração autónoma de todos os meios de prova utilizados pelo Tribunal a quo para fundamentar a decisão.
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Existe pois um erro notório na apreciação da prova nos termos do aludido artigo 410° nº 2 c) do C.P.P.
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Caberá pois ao Tribunal de Recurso na reapreciação da decisão impugnada, proceder á valoração autónoma dos meios de prova utilizados pelo Tribunal a quo, para fundamentar a decisão digna de reparo.
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Face aos apontados vícios elencados nas presentes alegações requer-se que relativamente ao Assistente, ora recorrente, seja revogada a decisão proferida pelo Tribunal de 1ª instancia, que absolveu os Arguidos pela pratica de crime de furto qualificado, devendo estes ser condenados." O Ministério Público e os arguidos A... e C... responderam à motivação, concluindo que a sentença recorrida deverá ser mantida.
Nesta instância o Exmº Procurador Geral Adjunto é de parecer, que o recurso merece provimento.
Colhidos os vistos, cumpre decidir, após a realização da audiência.
FUNDAMENTAÇÃO A matéria fáctica considerada provada na sentença recorrida foi a seguinte: " 1. No dia 22 de Agosto de 2003, o ciclomotor de matrícula 3-MGR-03-07 foi entregue ao ofendido desprovido do conta-quilómetros, contra-rotações, farol dianteiro, ignição, espelho e pneu da roda traseira.
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O ofendido estimou em € 2.000,00 o montante de prejuízos sofridos e atribuiu ao ciclomotor antes de ser danificado, o valor de €2.999,00, pelo qual a adquiriu.
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O arguido B... frequenta o curso de serralharia mecânica, na Escola Calazans Duarte.
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Vive com o seu pai, em casa arrendada, o qual lhe proporciona o sustento.
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Não tem antecedentes criminais.
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O arguido C.. tem o 9º ano de escolaridade.
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Vive com os pais, em casa arrendada, os quais lhe proporcionam o sustento.
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O arguido A.. frequenta o 9º ano na Escola Pinhal do Rei .
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Vive com os seus pais, os quais lhe proporcionam o sustento.
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Por sentença transitada em julgado em 29/09/2004 no âmbito do processo sumário nº723/04.5 PAMGR, deste Tribunal foi condenado na pena de 60 dias de multa à razão diária de 2.00, pela prática em 13/09/2004 de um crime de condução sem habilitação legal" Factos não provados: " Produzida a prova e discutida a causa, não resultaram provados os seguintes factos com pertinência para a decisão da mesma: 1.No dia 15 de Agosto de 2003, os arguidos A..., B... e C... planearam apoderar-se do ciclomotor de matrícula 3-MGR-03-07, propriedade de D..., que sabiam encontrar-se na garagem do prédio onde o mesmo habitava, o nº6 da Rua da segurança Social, nesta cidade.
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Quando já passava das 22.00 horas, para lá se deslocaram mas, ao constatarem que o portão possuía código de acesso, decidiram esperar que entrasse alguma viatura, o que veio a acontecer.
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Então, aproveitando o momento em que o portão se encontrava aberto, introduziram-se na garagem e dali retiraram o identificado veículo, que guardaram em casa do arguido C....
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Nessa noite, desmontaram algumas peças e introduziram-lhe outras e alteraram-lhe a cor.
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Alguns dias depois o veículo ficou a guarda do arguido A..., que lhe substituiu outras peças.
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O ciclomotor foi utilizado por todos os arguidos.
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Os arguidos agiram livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era punida por lei.
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Actuaram em comunhão de esforços e de intentos, bem sabendo que o ciclomotor não lhes pertencia e que ao fazê-lo seu, estavam a actuar contra a vontade do dono.
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Os arguidos alteraram-lhe a cor, retiram-lhe o conta-quilómetros, o conta rotações, o farol dianteiro, a ignição e a roda traseira.
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Mudaram as peças, o guarda-lamas traseiro e dianteiro, o guiador, o farol dianteiro, o pneu de trás e o escape.".
Motivação da decisão de facto: " Na formação da sua convicção o Tribunal atendeu aos meios de prova disponíveis, atentando nos dados objectivos fornecidos pelos documentos dos autos e fazendo uma análise das declarações e depoimentos prestados. A factualidade que considerou provada e não provada baseou-se na análise crítica e ponderada do conjunto da prova produzida, segundo juízos de experiência e fazendo-se uma apreciação crítica da mesma.
Os arguidos não prestaram declarações.
O assistente não presenciou os factos, no decurso das suas declarações descreveu as diligências a que procedeu após encontrar o seu ciclomotor. Relatou as várias deslocações a casa dos arguidos no intuito de reaver as peças da motorizada.
A testemunha Severino Rosa, comerciante de motos, não presenciou os factos, apenas vendeu e fez um orçamento do arranjo que o ciclomotor, referido nos autos, necessitava.
A testemunha Rui Rodrigues, não presenciou os factos, apenas afirmou em Tribunal que o seu filho encontrou a motorizada em casa do arguido A.... Afirmou que o seu filho, na altura, lhe referiu que o arguido A... teria dito ser um dos autores do furto ciclomotor.
Ora, não pode o Tribunal valorar o depoimento da testemunha, supra referida, no que concerne às declarações prestadas sobre a pretensa confissão do arguido, pois, o mesmo não tomou conhecimento directo desse facto. As declarações proferidas nestas circunstâncias não podem servir como meio de prova, pois, o depoimento resulta do que se ouviu dizer, e o seu filho não foi chamado a prestar depoimento. Contudo prestou depoimento Vanessa Gonçalves, que segundo a supra identificada testemunha teria presenciado os factos, o que não se verificou, pois no seu depoimento, a mesma referiu não ter...
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