Acórdão nº 3351/05 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 29 de Novembro de 2005 (caso NULL)
Magistrado Responsável | HELDER ROQUE |
Data da Resolução | 29 de Novembro de 2005 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA: A..., solteiro, maior, técnico de textura, residente na Rua Vale do Porto, nº 6, r/c – A, Casal da Amieira, concelho da Batalha, propôs a presente acção, com processo ordinário, contra B...
, divorciada, professora do ensino secundário, residente na Rua Vale Pousio, nº 6, Alqueidão da Serra, concelho de Porto de Mós, pedindo que, na sua procedência, seja declarada a nulidade, por vício de forma, do contrato celebrado entre ambos e que identifica, seja declarada a nulidade e inexistência do contrato de trespasse de estabelecimento, que a ré seja condenada a restituir ao autor a quantia de 17.457,93 € que dele havia recebido, por força da nulidade do contrato, acrescida de juros de mora, desde a data da citação, ou, em alternativa, que a ré seja condenada a restituir ao autor aquela quantia de 17.457,93 € , por ter usado de má fé na celebração do contrato, ocultando elementos essenciais do mesmo, determinantes da vontade de negociar do autor, acrescida de juros de mora, desde a data da citação e até efectivo reembolso, alegando, para o efeito, e, em síntese, que celebrou com a ré um contrato-promessa de trespasse de um estabelecimento pertencente a esta última, pelo valor de 17.457,93€, que pagou na totalidade, com vista à aquisição do estabelecimento, devidamente licenciado e a funcionar, e com o horário até ás 2 horas da manhã.
Em Junho de 2001, o autor passou a explorar o estabelecimento, sem que se tenha realizado o contrato de trespasse prometido, sucedendo que a ré ocultou aquele que ao mesmo faltavam requisitos, sem os quais não podia funcionar, e bem assim que o horário de funcionamento era até ás 24 horas e não até ás 2 horas da manhã, razões que inviabilizaram a sua exploração.
Na contestação, a ré impugna que ao estabelecimento faltasse qualquer requisito de funcionamento ou que tenha omitido qualquer informação ao autor, acrescentando que foi celebrado, através de documento, um contrato de trespasse e não um contrato-promessa de trespasse do estabelecimento, sendo que o valor do trespasse foi de 6.000.000$00, concluindo pela absolvição do pedido.
Em sede reconvencional, sustenta ainda que o autor explorou, durante 12 meses, o estabelecimento, em proveito próprio, e que depois o encerrou, levando consigo todos os utensílios e pertences, num valor de 14.965 €, tendo deixado de pagar 12.469,95 €, referente ao restante do preço do trespasse, concluindo com o pedido de condenação do autor no pagamento desta última importância e respectivos juros de mora.
Na réplica, o autor termina como no articulado inicial e impugna a matéria de facto em que se fundamenta o pedido reconvencional, cuja absolvição solicita.
A sentença julgou a acção, procedente por provado, e, em consequência, declarou nulo, por vício de forma, o contrato de trespasse celebrado entre autor e ré, condenou o autor a restituir o estabelecimento e a ré a entregar aquele a quantia de 17.457,93 €, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 7% ao ano, desde a data de citação, em 16 de Abril de 2002, até 1 de Maio de 2003, e, à taxa de 4% ao ano, desde esta última data e até integral pagamento, e a reconvenção, improcedente por não provada, absolvendo, em consequência, o autor do pedido correspondente.
Desta sentença, a ré interpôs recurso de apelação, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: 1ª - O escrito apresentado pelo autor como documento 1 corporiza o contrato de trespasse querido e realizado pelos contraentes, tanto material como formalmente.
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- O escrito particular subscrito pelas partes é requisito suficiente para a exigência de forma na celebração do contrato de trespasse, nos termos do artigo 115º do RAU.
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- O contrato definitivo de trespasse foi celebrado pelos contraentes através da subscrição do escrito particular, com imediata e efectiva transmissão da titularidade do estabelecimento, que o trespassário passou a explorar como dono efectivo.
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- O escrito particular não é um contrato promessa de trespasse.
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- O contrato de trespasse celebrado entre autor e ré não está ferido de nulidade por vício de forma.
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- A existir uma cláusula acessória verbal de fixação do prazo - que em todo o caso não existiu -, sempre deveria ter sido reduzida a escrito.
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- A resposta ao quesito 1º é imprecisa uma vez que não situa no tempo o aludido facto, e por outro lado está em contradição com as alíneas D, E e F dos factos assentes.
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– O autor veio exercer a sua pretensão ao arrepio da proibição de venire contra factum proprium, e em manifesto exercício de abuso de direito.
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- A trespassante tem direito a receber do autor a quantia de € 12.469.95, referente ao preço estabelecido para o trespasse e não pago, devendo, assim, ser considerada procedente por provada a reconvenção.
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– Ao julgar procedente a acção e improcedente a reconvenção fez o Mº Juiz “a quo” incorrecta interpretação e aplicação da lei e dos factos, tendo violado, além do mais, o artigo 115, nº 3 do RAU, artigos 220º, 221º, 236º, 237º, 238º, 410º, nºs 1 e 2 e 289º todos do Código Civil.
Nas suas contra-alegações, o autor sustenta que deve ser confirmada a sentença recorrida.
* Tudo visto e analisado, ponderadas as provas existentes, atento o Direito aplicável, cumpre, finalmente, decidir.
As questões a decidir na presente apelação, em função das quais se fixa o objecto do recurso, considerando que o «thema decidendum» do mesmo é estabelecido pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo daquelas cujo conhecimento oficioso se imponha, com base no preceituado pelas disposições conjugadas dos artigos 660º, nº 2, 661º, 664º, 684º, nº 3 e 690º, todos do CPC, são as seguintes: I – A questão da alteração da decisão sobre a matéria de facto.
II – A questão da celebração pelas partes de um contrato-promessa de trespasse ou de um contrato de trespasse, propriamente dito.
III – Suas consequências.
I DA ALTERAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO Entende a ré que a resposta ao quesito 1º é imprecisa, uma vez que não situa, no tempo, o aludido facto, e, por outro...
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