Acórdão nº 2046/05 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 18 de Outubro de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelARTUR DIAS
Data da Resolução18 de Outubro de 2005
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: 1.

RELATÓRIO A Massa Falida de “A...”, que teve a sua sede na Av. Almirante Afonso Cerqueira, Bloco Tevisil, r/c, em Viseu, representada pelo seu Liquidatário Judicial, Dr. E..., intentou acção declarativa, com processo comum e forma ordinária, contra “B...”, abreviadamente designada por “C...

”, com sede no Edifício nº 9 do Forte da Barra, freguesia de Gafanha da Nazaré, concelho de Ílhavo, pedindo a condenação da R. a restituir à A. o valor correspondente à obra com que infundadamente se enriqueceu à custa daquela, de 877.230,03 euros, acrescido de juros moratórios vencidos, à taxa legal, a partir da citação.

Para tanto, a A. alegou, em síntese, que tomou de empreitada à firma “D...” os trabalhos de construção civil de uma unidade industrial para a congelação e transformação de pescado, a executar em terrenos sitos na freguesia de Gafanha da Nazaré, concelho de Ílhavo, pelo preço global de 155.000.000$00, acrescido de IVA; que executou os trabalhos acordados assim como outros trabalhos adicionais imprevistos encomendados pela dona da obra, ascendendo o seu valor global a Esc. 175.868.882$00, que não lhe foi pago; que instaurou contra “D...” acção onde pediu a condenação da dona da obra no pagamento dos trabalhos realizados e o reconhecimento da garantia do direito de retenção do respectivo crédito, tendo sido condenada a dona da obra no pagamento de 175.868.882$00, acrescido de juros vencidos e vincendos às taxas sucessivamente aplicáveis desde a citação, por sentença proferida em 13-05-1999, que não reconheceu à autora o benefício do direito de retenção, o qual apenas veio a ser reconhecido em sede de recurso interposto daquela sentença, pelo Tribunal da Relação de Coimbra, que decidiu que as obras sobre que incide tal direito devem ingressar na massa falida de “D...”; que veio a saber, por força de decisão judicial proferida em 9-01-2003, transitada em 23-01-2003, em acção proposta pela ora ré com vista à separação e restituição do prédio onde foi implantada a obra, que “D...” não era proprietária desse prédio, o qual tinha sido arrolado e apreendido no processo falimentar da dona da obra, tendo sido, naquela acção, reconhecido à ora ré o direito à separação e restituição do aludido prédio que tinha sido concessionado à falida e no qual se integra a obra por si executada, a qual valorizou o prédio restituído à ré, pelas forças do património da autora, sendo que o enriquecimento patrimonial obtido pela ré não é justificado por não ter sido suportado pelas forças do património da falida e por aplicação do clausulado na licença de utilização emitida, que não foi objecto de registo apesar de ter sido constituída hipoteca sobre as instalações fixas a construir nos terrenos cedidos à falida; que o enriquecimento foi directamente obtido pela ré, já que, tendo sido a falida detentora precária do referido prédio, a obra executada não se incorporou no seu património, sendo injustificado o enriquecimento que engrandeceu o património da ré, relativamente à qual vem peticionado o pagamento do valor dos trabalhos realizados pela autora por ser considerada impossível a restituição em espécie; e que é impossível obter da dona da obra o pagamento do referido crédito, por já se ter esgotado o prazo para reclamação do mesmo no processo de falência à data em que foi proferido o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra que reconheceu o direito de retenção à ora autora, sendo que a restituição do prédio à ré descaracterizou o crédito da autora como crédito privilegiado pelo direito de retenção, reduzindo-o a um crédito comum incobrável.

A R. contestou, pugnando pela improcedência da pretensão formulada em juízo, por não estarem reunidos os pressupostos do enriquecimento sem causa, já que o eventual enriquecimento da ré tem causa justificativa, fundando-se na sentença proferida na acção sumária nº 87-E/99 que correu termos por apenso ao processo de falência da dona da obra e na qual viu reconhecido o direito à separação e restituição do prédio identificado na petição inicial, por ter expirado em 28-02-1999 o prazo das licenças que titulavam a atribuição à falida do direito ao uso privativo dos terrenos do domínio público em que se integrava o aludido prédio sem que aquela tenha pago as taxas devidas ou requerido a prorrogação do prazo de utilização, operando-se naquela data a caducidade dessas licenças e a reversão a favor do Estado de todas as obras ali executadas e dos terrenos até então ocupados.

Mais alegou que não lhe pode ser imputado o incumprimento da dona da obra, em cujo património se incorporaram as obras executadas; que a autora poderia ter reclamado tempestivamente o seu crédito no processo de falência da dona da obra; e que o eventual enriquecimento da ré não corresponde ao valor peticionado, atenta a depreciação dos trabalhos realizados, que deve ser descontada ao valor da obra, assim como as benfeitorias entretanto realizadas por terceiros.

No despacho saneador, entendeu-se que o estado do processo permitia, sem necessidade de mais provas, conhecer imediatamente do mérito da causa, o que se fez, julgando-se a acção improcedente e absolvendo-se a R. do pedido.

Irresignada, a A. recorreu e, na alegação apresentada, formulou as conclusões seguintes: 1) Não se verifica identidade entre os pedidos, causas de pedir, e sujeitos entre a presente acção e a acção de restituição que, ao abrigo do art. 205º do D.L. nº 132/93, de 23/04, a Recorrida deduziu por apenso à falência da “D...”; 2) Quer pela natureza incidental da acção de restituição, quer pela natureza edital da citação ali processada, o caso julgado da respectiva decisão é de carácter formal, não produzindo efeitos fora do respectivo processo; 3) Acresce que o caso julgado formado sob aquela decisão não abrangeu qualquer direito de indemnização por virtude das obras executadas pela Recorrente, pois tal matéria não foi um pressuposto necessário à decisão; 4) A Apelante, não tendo sido credora admitida na falência da “D....”, não pode ser considerada como parte na acção de restituição ali deduzida pela recorrida; 5) Desta forma, o caso julgado formado sobre a sentença proferida naquela acção de restituição não obsta à apreciação da pretensão apresentada na presente acção.

6) Por outro lado, a sentença proferida naquela acção não constituiu a causa directa e necessária do enriquecimento; em consequência, 7) Porque ofendeu, nomeadamente, os arts. 473º e segs., do C. Civ., e o art. 673º, do Cód. Proc. Civil., deverá, no provimento do presente recurso, ser revogado o douto despacho saneador-sentença impugnado, ordenando-se o prosseguimento dos autos nos termos legais.

A apelada respondeu, defendendo a manutenção da decisão sob recurso.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

*** 2.

QUESTÕES A SOLUCIONAR Tendo em consideração que, de acordo com os artºs 684º, nº 3 e 690º, nº 1 do Cód. Proc. Civil, é pelas conclusões da alegação do recorrente que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, constata-se que à ponderação e decisão deste Tribunal foram colocadas essencialmente duas questões: (1) uma, referente à vinculação ou não da recorrente ao caso julgado formado pela sentença proferida em 09/01/2003 na acção sumária que correu termos por apenso aos autos de falência da “D...” ao abrigo do artigo 205º do CPEREF e que reconheceu à ali A. e aqui recorrida C..., o direito à separação e restituição do prédio no qual foram realizadas as obras invocadas nestes autos e ordenado o cancelamento dos registos na Conservatória do Registo Predial de Ílhavo relativos àquele prédio; (2) outra...

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