Acórdão nº 1065/04 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 18 de Maio de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelDR. ISA
Data da Resolução18 de Maio de 2004
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam neste Tribunal da Relação de Coimbra I- Relatório1- A autora, BB, veio instaurar contra o réu, CC, ambos melhor id. nos autos, a presente acção especial de divórcio litigioso, pedindo que fosse decretado o divórcio entre ambos, com base no comportamento culposo do último violador dos deveres conjugais de respeito, coabitação, cooperação e assistência.

2- Na sua contestação, o réu defendeu-se negando, em síntese, que o seu comportamento fosse violador dos sobreditos deveres conjugais.

Pelo que terminou pedindo a improcedência da acção.

3- No despacho saneador afirmou-se a validade e a regularidade da lide, tendo-se depois passado à organização da selecção da matéria da facto, que não foi objecto de qualquer censura.

4- Mais tarde, teve lugar a realização do julgamento – com a gravação da audiência.

4-1 A resposta aos diversos pontos (quesitos) da base instrutória teve lugar, sem que tivesse merecido então qualquer reclamação das partes.

5- Seguiu-se a prolação da sentença, a qual acabou, com base nos fundamentos nela aduzidos, por julgar a acção procedente e, em consequência, decretou o divórcio entre a autora e o réu, dissolvendo o casamento que ambos haviam celebrado entre si, declarando o último o principal culpado.

6-Não se tendo conformado com tal sentença, o réu dela interpôs recurso, o qual foi admitido como apelação.

6-1 Nas correspondentes alegações de recurso que apresentou, o réu concluiu as mesmas nos seguintes termos: “1- O tribunal a quo julgou incorrectamente a matéria de facto em discussão.

2- Da conjugação de todos os depoimentos prestados em sede de audiência de discussão e julgamento, jamais poderiam ter sido dadas as respostas que foram aos pontos 13º, 22º, 23º, 24º, 27º e 28º da Base Instrutória.

3- Factos que o MMº Juiz a quo deveria ter dado como provados e que assim não decidiu porque não quis aceitar, na íntegra, o depoimento da testemunha Tito Marques Duarte, cujo depoimento se encontra registado de voltas 1427 a 2034 do lado A da cassete (cuja transcrição se junta), que mereceu toda a credibilidade ao tribunal.

4- A decisão recorrida alicerça-se em dois aspectos fundamentais: a) Violação, por parte do Réu, do dever de respeito; e b) Separação de facto. Não se verificando, em nossa modesta opinião, nenhum deles.

5- Na verdade, se o R. foi detido pela 2ª vez em Abril de 2001, tendo, até essa data, vivido com a A. e seus filhos menores, não estão verificados os pressupostos de que a lei (art. 1.781, al. a) do C.C.) faz depender a separação de facto como fundamento de divórcio.

6- Depois, o R. não violou reiterada e culposamente o dever de respeito. A carta de 21/8/2000, não poderá assumir qualquer relevo para os autos, uma vez que, após a mesma A. e R. viveram juntos, até à data em que este foi novamente detido, i.é, em Abril de 2001. Tal facto, mesmo a constituir motivo de divórcio, jamais poderia fundamentar a presente decisão, uma vez que a A., com o seu comportamento, mostrou ter perdoado ao R. tal atitude.

7- No que respeita às cartas de 21 e 27 Agosto de 2001 e 7 de Outubro de 2001, das afirmações contidas nas mesmas, não é perceptível qualquer ofensa que, pela sua gravidade e reiteração, comprometa a vida em comum. Mas mais, as afirmações nelas contidas são consequência da atitude da A. que, após a prisão do R. em Abril de 2001, não mais quis saber dele, votando-o ao mais completo ostracismo e delapidando todo o património comum do casal. O que, aliás, resulta da prova produzida nos autos.

8- Pelo que, à A., não era nem é lícito requerer o divórcio, por os factos invocados como fundamento do mesmo, terem sido por si provocados intencionalmente, ou, pelo menos, por a A. ter criado as condições propícias à sua verificação.

9- Impondo-se, ao tribunal a quo, decisão diferente da aplicada, qual seja a de absolvição do R. do pedido contra si formulado pela A., ou quando assim se não entenda, deveria, pelo menos, ter considerado ambos os cônjuges culpados e em igual medida.

10-A douta decisão recorrida, ao decidir como decidiu, violou, por erro de interpretação e/ou aplicação, entre outros de cujo o douto suprimento desde já se requer, os preceitos legais contidos nos artigos 3-A; 655º, nº 1 e 668º, nº1, al. c) do C. P. Civil; e artigos 1.672º, 1.779º; 1.781º, 1.782º al. a) e 1.787º, do Código Civil.

Pelo que, nestes termos...deve o presente recurso obter provimento e, consequentemente, revogar-se a douta sentença recorrida, substituindo-se por outra que julgue a acção improcedente por provada, absolvendo o R. do pedido contra si formulado..”.

7- Nas suas contra-alegações a autora pugnou pela improcedência do recurso, e, consequentemente, pela manutenção do julgado.

8- Corridos que foram os vistos legais, cumpre-nos apreciar e decidir.

*** II- Fundamentação1- Delimitação do objecto do recurso Como é sabido, é pelas conclusões das alegações dos recorrentes que se que se define o objecto e delimita o âmbito dos recursos, isto é, a apreciação e a decisão dos recursos são delimitados pelas conclusões das alegações dos recorrentes, pelo que o tribunal de recurso não poderá conhecer de matérias ou questões nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso (cfr. disposições conjugadas dos artºs 664, 684, nº 3, e 690, nºs 1 e 4, todos do CPC, bem ainda, a esse propósito, entre muitos outros, Acs. da RC de 5/11/2002; do STJ de 27/9/94, de 13/3/91, de 25/6/80, e da RP de 25/11/93, respectivamente, in “CJ, Ano XXVII, T5, pág 15; CJ, Acs. do STJ, Ano II, T3 – 77; Act. Jur. Ano III, nº 17, pag. 3; BMJ nº 359-522 e CJ, Ano XVIII, T5 –232).

Por outro lado, como resulta do prescrito no nº 2 do artº 660 do CPC, é dever do julgador resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.

Vem, também, sendo dominantemente entendido que o vocábulo “questões” não abrange os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, antes se reportando às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, entendendo-se por “questões” as concretas controvérsias centrais a derimir (vidé, por todos, Ac. do STJ de 02/10/2003, in “Rec. Rev. nº 2585/03 – 2ª sec, e Ac. do STJ de 02/10/2003, in “Rec. Agravo nº 480/03 – 7ª sec.

) 2- Ora calcorreando as conclusões do recurso verifica-se que as questões que importa aqui apreciar são, essencialmente, as seguintes: a) Procedência, ou não, da impugnação da decisão matéria de facto feita pelo apelante (no que concerne às respostas dadas aos pontos 13º, 22º, 23º, 24º, 27º e 28º da Base Instrutória - que doravante designaremos somente por BI)? b) Face à matéria factual dada como assente, por provada, deverá, ou não, a acção se julgada totalmente improcedente, ou, pelo menos, ser o divórcio decretado com culpa, em igual medida, de ambos os cônjuges (tal como defende o apelante e ao contrário do que foi decidido pelo tribunal a quo) ? 2-1 Apreciemos aquela primeira questão (impugnação da matéria de facto).

O réu-apelante impugna a decisão da matéria de facto, por incorrecta valoração da prova, no que concerne à resposta dada, pelo tribunal a quo, aos pontos (quesitos) 13º, 22º, 23º, 24º, 27º e 28 (defendendo que devem ser dados como provados, ao contrário do que se fez).

Teçamos, a propósito, algumas considerações de cariz teórico-técnico.

Dispõe o artº 690-A do CPC que: “1.

Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar: a) Quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) Quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida...” Por sua vez, o artº 712, daquele mesmo diploma legal, prevê, além do mais, que: “1.

A decisão do tribunal da 1ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação: a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada nos termos do artº 690º-A, a decisão com base neles proferida; b) Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por qualquer outras provas;” Como é sabido, a possibilidade de documentação da prova foi introduzida no nosso ordenamento jurídico através do DL nº 39/95 de 15/12, com a justificação de assegurar “a criação de um verdadeiro e efectivo 2º grau de jurisdição na apreciação da matéria de facto, facultando às partes na causa uma maior e mais real possibilidade de reacção contra eventuais – e seguramente excepcionais – erros do julgador na livre apreciação das provas e na fixação da matéria de facto”.

Calcorreando o preâmbulo desse mesmo diploma é possível ainda ler-se que “a garantia do duplo grau de jurisdição em sede da matéria de facto, nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida em audiência – visando apenas a detecção e correcção de pontuais, concretos e seguramente excepcionais erros de julgamento, incidindo sobre pontos determinados da matéria de facto, que o recorrente sempre terá o ónus de apontar claramente e fundamentar na...

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