Acórdão nº 876/04-3 de Tribunal da Relação de Évora, 14 de Julho de 2004
Magistrado Responsável | GAITO DAS NEVES |
Data da Resolução | 14 de Julho de 2004 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA "A", casado, residente na ..., em ..., instaurou, na Comarca de ..., a presente acção, com processo sumário, contra "B", viúva, residente na Rua ..., nº ..., em ..., alegando: O Autor é, desde Outubro de 1998, arrendatário de um prédio urbano, sito no lugar de ..., destinado a habitação, mediante contrato celebrado entre as partes e cuja renda é de 30.000$00 mensais.
Inesperadamente, a Ré enviou uma carta ao Autor, datada de 18 de Dezembro de 2000, na qual solicita ao Autor que desocupe o locado, pois que ela tem urgência em vender o prédio.
Embora o Autor tenha informado a Ré que estaria interessado na aquisição, a mesma respondeu que já havia outro e concedia ao Autor o prazo de 10 dias para preferir na compra, mas sem informar quais as condições, embora o Autor as tenha solicitado.
No período de 12 a 22 de Abril de 2001, aproveitando a ausência do Autor ou qualquer outro familiar no arrendado, a Ré, acompanhada da filha e do genro, invadiram a habitação do Autor, tendo destruído tudo o que encontraram e cujo valor ascende a 700.000$00, bem como outros bens desapareceram com o valor de 150.000$00. Ainda a Ré mandou abrir uma vala profunda, por forma a impedir que o Autor tivesse acesso de carro à sua residência.
Desde Abril até à data presente, o Autor está impossibilitado de habitar tal prédio.
Como a Ré se recusou a receber a renda a partir do mencionado mês de Abril, tem vindo o Autor a depositá-la na Caixa Geral de Depósitos.
Tem o Autor direito à restituição das rendas depositadas, dado não poder habitar o prédio.
A conduta da Ré causou desgosto e abalo no Autor.
Termina, pedindo a procedência da acção, que seja reconhecido como locatário do prédio, ordenar-se a sua restituição após a reposição do que foi destruído, incluindo o aterrar da vala e ainda a condenação da Ré a pagar-lhe todos os prejuízos.
Citada, contestou a Ré, alegando: POR EXCEPÇÃO ILEGITIMIDADE Por partilhas de 02 de Outubro de 2001, a casa que é objecto dos presentes autos passou a ser propriedade de sua filha "C", pelo que a Ré é parte ilegítima.
ARRENDAMENTO PARA HABITAÇÃO NÃO PERMANENTE O arrendamento firmado entre Autor e Ré não foi um típico contrato de arrendamento para habitação permanente, mas sim de vilegiatura, destinado a utilização ocasional e esporádica, aquando das férias e fins de semana do Autor pelo que não são aplicáveis a normas constantes do RAU, mas sim o regime geral da locação civil.
A Ré deu possibilidade ao Autor de adquirir a casa, conforme se verifica pela carta remetida aos 28 de Fevereiro de 2001. E isto, apesar de num contrato como o celebrado entre a Autor e Ré não vigorar o direito de preferência.
CESSAÇÃO DO CONTRATO DE ARRENDAMENTO PARA VILEGIATURA A solicitação da Ré para que o Autor desocupasse o espaço deve ser feito com 60 dias de antecedência relativamente ao termo do prazo contratual ou da sua renovação.
O termo da renovação ocorreria no dia 30 de Setembro de 2001 pelo que a Autora agiu tempestivamente. E desde Outubro de 2001, o Autor estava a ocupar a casa sem qualquer título.
DA PROPRIEDADE DOS BENS O Autor diz-se proprietário de bens que nunca lhe pertenceram, designadamente as cercas.
POR IMPUGNAÇÃO A Ré não destruiu bens do Autor.
A Ré havia autorizado o Autor que colocasse alguns objectos num espaço que por esta era destinado à agricultura e que nada tinha a ver com o locado habitacional. E foi este espaço que foi objecto dum contrato com "D" e, por isso, havia necessidade de o desocupar.
Como o Autor não o fez, houve necessidade de transportar as coisas do Autor para um alpendre, mas sem as danificar. E não as colocou dentro da casa por o Autor, contrariamente ao contrato celebrado, ter mudado as fechaduras. E a Ré tinha acesso a estas instalações, por dentro dela se encontrar o mecanismo que permitia ligar e desligar a bomba de rega utilizada pela Ré na sua área agrícola.
Aliás, uma motorizada que o Autor diz ter sido danificada, já não se encontrava no local, pois já ele a tinha levado anteriormente. E todos os outros objectos estavam consideravelmente degradados.
A vala foi necessária abrir em virtude de algumas obras que a Ré levou a cabo no seu terreno. E este terreno não estava arrendado ao Autor. Se ele ali colocava a sua viatura, fazia-o abusivamente. A entrada para o espaço arrendado continuou livre e desembaraçado.
Se o Autor continua com as chaves da casa e esta permanece como estava antes, se não a habitou foi por não o ter pretendido.
Não sofreu o Autor qualquer abalo pela não utilização da casa.
EM RECONVENÇÃO Por não poder utilizar a bomba instalada na habitação que foi arrendada ao Autor, a Ré viu secarem-se árvores e toda a plantação que havia feito e cujo prejuízo ascende a 2.244,6 €.
Por outro lado, o Autor ocupa ilegitimamente a casa desde Outubro de 2001, pelo que a Ré tem que ser credora do valor dos montantes depositados pelo Autor.
Termina concluindo que o Tribunal deve declarar a validade de resolução do contrato, julgadas procedentes as invocadas excepções e provado o pedido reconvencional.
Respondeu o Autor às excepções e pedido reconvencional concluindo pela sua improcedência.
Deduziu o pedido de intervenção provocada de "C", solteira, maior, residente na Rua ..., em ...
* *** NO DESPACHO SANEADOR FOI DECIDIDO: 1 - Indeferir o pedido de intervenção provocada de "C"; 2 - Julgar improcedente a excepção de ilegitimidade.
* *** Seguiram-se os demais termos processuais e procedeu-se a audiência de discussão e julgamento.
Na Primeira Instância foram dados como provados os seguintes factos: 1 - Em Outubro de 1998, "B" ajustou verbalmente com "A" proporcionar-lhe a utilização, para habitação, do prédio urbano sito no lugar da ..., mediante a contrapartida mensal de 30.000$00.
2 - Por escritura pública de 01 de Outubro de 2001, "B" e "C" declararam proceder à partilha do prédio referido em 1, adjudicando-o a esta, sendo que tal prédio integrava o acervo hereditário deixado por morte de "E", falecido no dia 30 de Junho de 2000, no estado de casado, sob o regime de comunhão geral de bens e em únicas núpcias de ambos, com "B", sem testamento ou qualquer disposição de última vontade, tendo deixado como suas únicas e universais herdeiras as duas outorgantes, respectivamente mulher e filha.
3 - "C" tem registada a seu favor, na CRP de ..., através da Ap. 04/02102001 a aquisição, por partilha, do prédio referido em 1.
4 - "B" enviou a "A" o escrito de fls. 15, com a seguinte redacção, que aqui se transcreve, na parte relevante: «Assunto: desocupação da casa sita em ... Data: 18 de Dezembro de 2000. Exmº Senhor, na sequência da conversa que mantivemos sobre a desocupação da minha casa sita em ..., que V.Ex. vem ocupando desde Outubro de 1998, venho mais uma vez solicitar a entrega das chaves e do correspondente imóvel, livre e devoluto, na medida em que por problemas da minha vida pessoal tenho grande urgência em vender o mesmo».
5 - "B" enviou a "A" o escrito de fls. 16, com a seguinte redacção, que aqui se transcreve, na parte relevante: «..., 28.2.2001. Exmº Sr., venho pela presente informá-lo de que o imóvel da minha propriedade do qual é arrendatário, denominado ..., se encontra à venda pelo preço de 22.000.000$00. Mais informo que existe um interessado na sua compra, o Sr. ..., com domicílio profissional na Rua ..., em ... No entanto, e na qualidade de arrendatário, venho pela presente dar-lhe a exercer o seu direito de preferência sobre a referida venda. Assim, e pelo prazo de 10 dias úteis da recepção desta carta, aguardo a...
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