Acórdão nº 861/03-2 de Tribunal da Relação de Évora, 29 de Janeiro de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelANA RESENDE
Data da Resolução29 de Janeiro de 2004
EmissorTribunal da Relação de Évora

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA I - Relatório 1. A. veio deduzir embargos de executado contra B, pedindo que seja julgada inexequível a dívida exequenda, por falta de título executivo, nos termos legais, por incerteza e por inexigibilidade, e consequentemente, absolvido do pedido formulado na execução.

  1. Alega para tanto, quanto às escrituras das hipotecas, que as mesmas são nulas por invalidade substancial, visto afirmarem falsamente um empréstimo que não existia, e por invalidade formal, por conterem contradições que as tornam ineficazes, relativamente à livrança, que apenas foi junta uma cópia da mesma, sendo o seu preenchimento abusivo, estando aliás, já prescrita, desde 30 de Junho de 1994.

    Refere também, e em termos de exigibilidade, que constituindo as escrituras públicas o título executivo no qual a Exequente se apoia, o prazo de dez anos fixado em cada uma delas tem de prevalecer sobre os diversos prazos de reembolso referidos nas propostas de crédito juntas aos autos, documentos que não tem os requisitos de título executivo.

    Diz ainda que a Exequente nunca se preocupou em informar o Embargante do montante do seu débito, nem procedeu à liquidação dos juros, que alega agora serem devidos, sendo que só os relativos aos três primeiros anos estão cobertos pela hipoteca.

    Invoca, finalmente, o pagamento de 2.548.000$00 à Exequente, através do próprio tribunal, bem como a retirada pela mesma, da conta do Embargante, sem qualquer justificação e sem o seu conhecimento, da quantia de 218.000$00, para despesas judiciais.

  2. A Embargada veio contestar, concluindo pela improcedência dos embargos deduzidos, e pedindo a condenação do Embargante como litigante de má fé.

  3. Após vicissitudes várias, realizou-se o julgamento, sendo proferida sentença que julgou parcialmente procedentes os embargos, determinando o prosseguimento da execução com redução na quantia exequenda do montante de 2.548.000$00, já pago pelo Embargante, absolvendo a Embargada do mais que contra ela é pedido. 5. Inconformado veio o Embargante interpor recurso de apelação, formulando nas suas alegações, as seguintes conclusões: - Resulta da análise das escrituras públicas de constituição de hipoteca, da proposta de crédito, da livrança e do aviso de lançamento do crédito, a desconformidade do teor de cada um destes documentos.

    - Verifica-se a referida desconformidade no que respeita ao momento da constituição da obrigação, ou seja, se a prestação é ou não futura.

    - Verifica-se desconformidade no que se refere ao prazo de vencimento das alegadas obrigações, no prazo de 10 anos (hipoteca) ou não, no prazo de 4 anos (proposta de crédito) ou 1 ano (aviso de lançamento).

    - Verifica-se desconformidade nas quantias que se vencem a 31 de Dezembro de 1991, sendo na proposta de crédito no valor de 3.500.000$00 e no aviso de lançamento do crédito no valor de 29.100.000$00.

    - Reconhece o Tribunal "a quo" a existência de um lapso de escrita no que diz respeito ao momento da constituição da obrigação, afirmando não se tratar de uma divida anterior à hipoteca, quando da leitura do documento autêntico esta claramente escrito que "lhe emprestou".

    - Sendo assim, há discrepância entre a vontade real e a vontade declarada pelas partes, o que inquina a validade substancial da escritura pública, sendo a mesma nula, e como tal não podendo ser tida como título executivo.

    - Uma vontade real diferente da vontade declarada só poderá ser comprovada por um documento de valor superior e não por prova testemunhal como decidiu o Tribunal "a quo".

    - O documento autêntico em causa faz prova plena dos factos nele declarados, só podendo ser afastado com base na falsidade.

    - Assim sendo, quer por uma via quer por outra, o reconhecimento pelo Tribunal "a quo" de que existe lapso de escrita na vontade declarada, implica que a vontade declarada não foi a real e esta só poderá ser rectificada e integrada por prova de valor igual ou superior.

    - A incongruência dos factos declarados nas próprias escrituras de hipoteca retiram-lhe a certeza e a validade necessárias para que sejam consideradas como títulos executivos, uma vez que, não se pode delas extrair com clareza e transparência que se tratam de prestações futuras, condição "sine qua non" para que possam ser consideradas nos termos do artigo 50 n.º 2 do CPC títulos executivos.

    - Porque, por um lado, se a prestação foi anteriormente assumida como referem as escrituras é lógico que não se trata de uma prestação futura.

    - Por outro, não se podendo apurar a vontade real, ou porque a escritura é falsa ou porque existe um lapso de escrita que não permite apurar qual a vontade real, a qual necessitará de ser provada por documento de valor superior, a verdade é que as escrituras não preenchem os requisitos essenciais à exequibilidade do título.

    - Também os alegados documentos que servem de suporte e conferem exequibilidade às escrituras considerados pelo Tribunal "a quo" para os efeitos do artigo 50 n.º 2 do CPC, não podem provar cabalmente e eficazmente que a prestação foi realizada, por não demonstrarem a exigida unidade negocial.

    - Por um lado a proposta de crédito é uma mera proposta requerida pelo Apelante e deferida pela Apelada, não servido de suporte ao mútuo porque não prova a entrega do dinheiro.

    - O aviso de lançamento é uma declaração interna da Apelada, como tal, unilateral porque não está assinada pelo Apelante, não servindo de prova da assunção de responsabilidades por este ou que a prestação tenha sido efectivamente realizada.

    - A livrança, não tida embora como documento comprovativo pelo Tribunal "a quo", também não constitui unidade negocial com o previamente estabelecido nas escrituras de hipoteca.

    - Os juros são manifestamente usurários, sendo que as taxas de juros estipuladas nos diferentes documentos estão desconformes.

  4. Nas contra-alegações a Recorrida apresentou as seguintes conclusões: - Foi julgado provado que se trata de lapso de escrita a referência que se faz nas escrituras hipotecárias a que os montantes nelas referidos já tinham sido emprestados ao Apelante.

    - Como foi lapso de escrita a referência ao prazo de dez anos.

    - O Recorrente tem perfeita consciência dos empréstimos, dos seus montantes, das suas datas, dos seus prazos e restantes clausulas.

    - Como sabe que as hipotecas se destinavam a garantir os montantes emprestados e a emprestar.

    - A prova do montante emprestado, do prazo de vencimento e da falta de pagamento nesse prazo encontra-se feita.

    - Em ambas as escrituras de hipoteca foi expressamente convencionado como documentos comprovativos da assunção das responsabilidades do Apelante letras, escritos particulares ou quaisquer documentos congéneres.

    - Ficou provado que, na sequência dessas escrituras, o Apelante assinou uma proposta de empréstimo, deferida, que a sua conta foi creditada pelo montante mutuado, em determinada data, com fixação do dia de vencimento, e que lhe foi enviado aviso de lançamento dessa operação.

    - Provado também ficou que a Apelada enviou ao Apelante os avisos de vencimento das prestações do crédito, datas que já eram do seu conhecimento, porque constavam da proposta de crédito que subscreveu.

    - Igualmente foi provado que houve um pagamento parcial do mútuo.

    - As escrituras e documentos complementares comprovam a prestação da parte da Apelada e constituem título executivo, sendo a dívida certa e exigível.

    - As alegações do Apelante só se compreendem se aceitarmos que está a litigar com nítida má fé, ou, na melhor das hipóteses, em abuso de direito.

  5. Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

    * II - Os factos Na sentença sob recurso foram considerados como provados os seguintes factos: - Por escritura pública de 8 de...

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