Acórdão nº 10025/2004-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 27 de Janeiro de 2005
Magistrado Responsável | ANA PAULA BOULAROUT |
Data da Resolução | 27 de Janeiro de 2005 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
ACORDAM OS JUIZES NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I P. M., intentou acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra a "COMPANHIA DE SEGUROS, S.A." e "T, E.P.", pedindo a condenação das Rés no pagamento da quantia de Esc. 50.000.000$00 - 249398,95 €, acrescida de juros de mora desde a data da citação.
Alega, para o efeito e em síntese que: - No dia 30 de Marco de 1983, sofreu um grave acidente no cais de embarque dos barcos da "T" que fazem o transporte de passageiros entre Almada a Lisboa, sendo que, quando aguardava de mão dada com sua avó, para entrar no barco, sofreu um entalão no pé esquerdo, causado pela passadeira movediça do referido barco; - Tal acidente provocou-lhe danos físicos no valor de Esc. 30.000.000$00 e danos morais no montante de Esc. 20.000.000$00.
As Rés apresentaram contestação, tendo ambas deduzido a excepção da prescrição e no mais, impugnaram os factos articulados na p.i., tendo a Ré Seguradora alegado que a culpa foi do Autor e que foi por mera solidariedade que lhe pagou despesas efectuadas e por conta do capital seguro, no montante de 783.120$00, mostrando-se o mesmo reduzido à quantidade 726. 880$00.
Na réplica, o Autor defende que o prazo prescricional não se terá iniciado antes de 28.02.1995, porquanto desde a data do acidente que as Rés reconheceram a sua responsabilidade pelo ressarcimento dos danos, assumindo o tratamento do Autor, sendo que só após a alta clinica é que se iniciou o prazo de prescrição de três anos previsto no artigo 498°, n° 1, do Código Civil.
A final veio a ser produzida sentença a julgar a excepção de prescrição improcedente, uma vez que se entendeu ser aplicável o prazo geral de prescrição, porque se está perante uma situação de responsabilidade contratual, tendo-se em consequência condenado a Ré Fidelidade no pagamento ao Autor da quantia de 7.481, 97 Euros e a Ré Transtejo no pagamento da quantia de 52.373, 78 Euros, acrescidas dos juros às taxas legais desde a citação, a titulo de danos patrimoniais e morais, tendo-se absolvido as Rés do restante pedido.
Inconformadas as Rés vieram recorrer, apresentando, em síntese as seguintes conclusões: Apelação da Ré T: - A acção tem como causa de pedir a responsabilidade civil por actos ilícitos, sendo que a mesma prescreve no prazo de três anos, artigos 483º e 498º do Ccivil.
- O acidente ocorreu no dia 30 de Março de 1983, sendo o Autor então de menor idade, tendo atingido a sua capacidade jurídica plena em 5 de Agosto de 1994 e a acção só foi intentada em 21 de Outubro de 1996, pelo que nessa data o prazo prescricional já se mostrava decorrido.
- A sentença recorrida entendeu que no caso se aplicaria a responsabilidade contratual, ao abrigo de um contrato de transporte, alegadamente celebrado entre o Autor e a Apelante, tendo feito aplicar o prazo geral da prescrição aludido no artigo 309º do Ccivil.
-Ora, tal contrato nunca foi alegado, sendo a sentença nula por alteração da causa de pedir, nos termos dos artigos 268º, 273º e 668º, nº1, alínea d) do Ccivil.
Apelação da Ré SEGURADORA: Para além de nos mesmos termos que a co-Ré, se ter insurgido contra a aplicação do prazo geral de prescrição, acrescentou o seguinte: - Caso assim não se entenda, tendo a Apelante satisfeito já ao Autor a quantia de 3906, 18 Euros e sendo o limite do capital seguro de 7418, 97 Euros, só poderá ser responsabilizada pelo remanescente, isto é pela quantia de 3575, 78 Euros.
Nas contra alegações o Autor pugna pela manutenção do julgado.
II Põe-se como problemas a resolver no presente recurso: a) nulidade da sentença, por ter conhecido da questão da responsabilidade contratual quando a mesma não foi alegada; b) saber se decorreu ou não o prazo prescricional para a propositura da acção, se esta se enquadrar no âmbito da responsabilidade civil; c) saber se a responsabilidade da Ré Seguradora se confina ao remanescente do capital seguro.
A sentença sob recurso deu como assentes os seguintes factos: - No dia 30 de Março de 1983, em Almada, no Cais de Embarque dos Barcos da T, que fazem o transporte de passageiros entre Almada e Lisboa, e Autor sofreu um acidente (alínea A).
- O Autor estava acompanhado por S, preparando-se para apanharem o barco com destino a Lisboa (alínea B).
- A Ré "T E.P." transferiu a sua responsabilidade para a Ré "Companhia de Seguros, S.A.", através da apólice n°…, junta a fls. 31 dos autos, garantindo esta, nomeadamente, o pagamento das indemnizações legalmente imputáveis à segurada por danos corporais e/ou materiais causados aos passageiros transportados em embarcações da 1ª Ré, até ao limite de Esc. 1.500.000$00 por vitima (alínea C)).
- A Re "Companhia de Seguros, S.A." pagou ao Autor despesas no montante global de Esc. 783.120$00 (alínea D)).
- Consta de fls. 9 uma certidão do Hospital de São José, datada de 29 de Junho de 1995, onde se lê o seguinte: "(...) do boletim clinico número quatrocentos e sessenta e três mil novecentos e trinta e cinco, consta que P M,de seis anos de idade (...) esteve internado no Serviço de Neurocirurgia deste Hospital, de trinta de Março a catorze de Junho de mil novecentos e oitenta e três.
"Mais certifico que no respectivo boletim clinico foi exarado o diagnóstico "Esfacelo do pé esquerdo; Amputações do 4° e 5° dedos e fractura múltipla do tarso e metatarso. Tendo sido operado em trinta de Março, em vinte e três de Abril e em nove de Maio de mil novecentos e oitenta e três" (alínea E)).
- O Autor aguardava de mão dada com S a sua vez de entrar no barco (resposta ao quesito 2°).
- Devido a forte ondulação que então se registava, o barco, que era do tipo "ferry-boat", apesar de amarrado ao cais ora se encostava ao pontão do cais, ora se desencostava do mesmo (resposta ao quesito 3°).
- No preciso momento em que o Autor ía a entrar no barco - através da passadeira movediça destinada, em principio, exclusivamente ao acesso de veículos automóveis ao interior do mesmo mas efectivamente também utilizada, com a complacência da Re "T, pela generalidade dos passageiros peões, para acederem ao interior do barco, sobretudo nas ocasiões de grande afluxo de passageiros em que a passadeira reservada a entrada de peões se mostra insuficiente, pela exiguidade das suas dimensões, para possibilitar a entrada no barco, em tempo útil, a todas as pessoas candidatas a embarcar -, aquela passadeira movediça oscilou, devido ao facto de, imediatamente antes, por ela ter entrado no barco um veículo automóvel e, em consequência dessa oscilação, o pé esquerdo do Autor ficou entalado entre a referida passadeira e a caixa do pontão (respostas aos quesitos 4°, 5° a 6°).
- Apesar de a acompanhante do Autor, S, ainda ter tentado afastar o Autor, recuando bruscamente, não conseguiu evitar o entalão do pé...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO