Acórdão nº 9218/2004-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 14 de Dezembro de 2004 (caso NULL)
Magistrado Responsável | PIMENTEL MARCOS |
Data da Resolução | 14 de Dezembro de 2004 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa.
Banco ... propôs acção com processo ordinário contra A ... e J..., Pedindo que estes fossem condenados solidariamente a pagar-lhe a importância de E 14.505,39, acrescida de E 1.567,44 de juros vencidos até 14.08.2003, e de E 62,70 de imposto de selo sobre estes juros e ainda os juros que sobre a dita quantia de E 14.505,39 se vencerem, à taxa anual de 18,26%, desde 15.08.2003 até integral pagamento, bem como o imposto de selo à taxa de 4% sobre este juros.
Para tanto alega, em síntese, que: no exercício da sua actividade, concedeu à ré mulher crédito directo, sob a forma de um contrato de mútuo, tendo-lhe assim emprestado a importância de 16.609,97 euros; o empréstimo e respectivos juros seriam pagos em 72 prestações; conforme expressamente acordado, a falta de pagamento de qualquer das referidas prestações na data do respectivo vencimento implicava o vencimento imediato de todas as demais prestações; mais foi acordado entre Autora e a referida Ré que em caso de mora sobre o montante em débito, a título de cláusula penal, acresceria uma indemnização correspondente à taxa de juros contratual ajustada - 14,26% - acrescida de 4 pontos percentuais, ou seja, um juro à taxa anual de 18,26 %; a referida ré, das prestações referidas, não pagou a 32ª e seguintes, vencida a primeira em 10 de Janeiro de 2003, vencendo-se então todas; o total das prestações em débito pela Ré à Autora ascende a 14.505,39 Euros, quantitativo este a que acrescem juros - incluindo já a cláusula penal preferida que sobre ela se vencerem à referida taxa de 18,26% ao ano, desde a data do vencimento referido, ou seja, desde 10 de Janeiro de 2003, até integral e efectivo pagamento; o empréstimo reverteu em proveito comum do casal.
**Os RR foram devidamente citados e contestaram, dizendo, em síntese que: quando foi contraído o empréstimo ambos os RR auferiam rendimentos de trabalho dependente; o R marido deixou depois de auferir qualquer rendimento; entretanto nasceu uma filha do casal; foi depois da situação de desemprego do marido que a ré deixou de pagar as prestações; tornou-se impossível à ré pagar as prestações em dívida, pois apenas aufere o vencimento mensal de 549,28 euros; a situação financeira da autora foi analisada aquando do empréstimo, pois teve que exibir as declarações de IRS; verificou-se assim uma alteração significativa, imprevisível e anormal das circunstâncias dos RR após a celebração do contrato, pelo que, nos termos do artigo 437º do CC, requereu que se proceda à sua modificação segundo juízos de equidade, por forma a ter em conta a manifesta impossibilidade de qualquer dos RR satisfazer as obrigações assumidas.
**A autora respondeu pronunciando-se pela improcedência da contestação.
**A acção foi julgada procedente no despacho saneador e os RR foram condenados a pagar solidariamente à autora a quantia de E 14.505,39 acrescida de juros de mora à taxa de 18,26% desde 10.01.2003, a que acresce o imposto de selo respectivo, até integral pagamento.
Desta decisão recorreram os RR, formulando as seguintes conclusões: 1. O presente recurso vem interposto da decisão que, conhecendo do mérito da causa logo que terminaram os articulados, condenou os RR., solidariamente, ao pagamento à A. da quantia de E 14.505,39, acrescida de juros moratórias à taxa de 18,26% desde 10.01.2003, a que acresce o imposto do selo respectivo, até integral pagamento; 2. Os RR. pediram, na contestação, uma modificação do contrato invocado como causa de pedir, de acordo com juízos de equidade, atenta a circunstância factual invocada pelos RR. (diminuição drástica dos rendimentos do agregado familiar a partir de 2002, subsistindo apenas um membro do casal com rendimentos profissionais, manifestamente parcos para satisfazer todas as necessidades básicas do agregado familiar), superveniente à celebração do aludido contrato; 3. Esse juízo de irrelevância dos factos invocados conduziu à supressão da fase da prova, dando-se hipoteticamente como admitida a sua prova na íntegra, até porque os documentos juntos com a contestação não foram impugnados na réplica; 4. A matéria alegada pelos RR foi porém, suficientemente abrangente para permitir uma concreta apreciação do carácter excessivo ou desproporcionado da cláusula penal convencionada entre A. e a R. mulher, à luz do que dispõe o artº 812º do Código civil.
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Os RR pediram a modificação do contrato (de todo o contrato, isto é, do equilíbrio dele resultante em termos de prestações e contraprestações) em função da equidade, o que, obviamente deve entender-se como generalizável a todas as suas cláusulas e particularizável em relação a cada uma.
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Uma revisão substancial dos montantes em dívida, tal como pedida pelos RR., passaria, desde logo, pelo regime prestacional e necessariamente teria de levar, se tivesse sido feita, a uma concreta apreciação da cláusula penal com vista à sua redução.
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Sucede, porém, que a jurisprudência constante do nosso STJ tem sido no sentido de ser claramente dispensável a concreta invocação, na contestação, do dispositivo previsto no art.º 812º do Código Civil, bastando que se possa deduzir da posição expressa pelos RR. (ou mesmo sem qualquer posição expressa, como é o caso de os RR. não contestarem) a sua não concordância com os montantes exigidos pelos respectivos credores. São disso exemplos os seguintes Acórdãos do STJ, todos consultáveis no BMJ ou na base de dados do ITIJ: Acórdão de 14/02/75, publicado no BMJ 244 p. 261; Acórdão de 10/09/2003; Acórdão de 30/09/2003; Acórdão de 06/03/2003; Acórdão de 15/12/998, entre outros; 8. Demonstrada a possibilidade processual do conhecimento da eventual desproporcionalidade ou do excesso manifesto da Cláusula Penal à luz do disposto no art.º 812º do Código Civil, importa agora aplicar essa apreciação ao presente caso; 9. Na contestação pediu-se a modificação do contrato em função da equidade por virtude da alteração das circunstâncias com base nas quais as partes fundaram a vontade de contratar, nos termos do disposto nos artº s 437º e ss. do Código Civil; 10. Está claramente compreendida nessa alegação, a oposição dos RR. quer ao montante peticionado, quer à forma de proceder a tal pagamento, uma vez que a privação de rendimento por parte de um dos membros do casal tornou o rendimento mensal do agregado familiar claramente insuficiente para satisfação dos seus termos; 11. A cláusula penal concretamente acordada traduz-se no pagamento adicional de uma quantia de E 2.648,68 ao ano, ou seja, 18,26% de E 14.505,39; 12. Para um crédito concedido inicialmente para 72 prestações mensais, das quais 31 já estão pagas, significa que, ainda que se pudesse retomar o plano de pagamentos e efectuar as 41 prestações mensais em falta...
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