Acórdão nº 3284/2004-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 01 de Julho de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelFÁTIMA GALANTE
Data da Resolução01 de Julho de 2004
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

ACORDAM NA 6ª SECÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I - RELATÓRIO José … intentou acção ordinária contra C …, Lda., alegando em síntese que, em 6/9/01, o autor comprou à Ré um veículo novo, de marca Citroen Xsara. Após a entrega do mesmo, o Autor verificou que o veículo apresentava anomalias e de imediato reclamou junto da Ré.

As deficiências não foram suprimidas todas. Em 3/12/01, a Ré considerava resolvidos cerca de 90% dos problemas apresentados pelo autor. Para não agravar as anomalias, o Autor não utilizou a viatura até meados de Janeiro de 2002.

O A. sofreu danos morais e danos patrimoniais resultantes da não utilização do seu veículo.

Concluiu pela procedência da acção com a consequente anulação do contrato de compra e venda referente ao veículo e a condenação da Ré a pagar ao Autor contra a sua restituição no estado actual, o valor do preço pago e das despesas do contrato, tudo no montante de 19.279,11 €, bem ainda, os danos patrimoniais no montante de 2.032,92 € e a título de danos morais, o valor de € 2.500,00. Subsidiariamente, pede a condenação da Ré a restituir ao A. a parte do preço considerado em excesso, em virtude do valor que atribuído ao veículo, actualmente, com os defeitos, a liquidar na pendência dos autos, ou em execução de sentença Citada a Ré contestou, em síntese, alegando que a acção para exigir a reparação ou substituição de coisa vendida, caduca passados seis meses sobre a data em que a denúncia foi efectuada, o que já sucedeu.

As anomalias invocadas pelo autor foram corrigidas, com excepção do forro do banco, pois, quando foi recebido o tecido, o autor não disponibilizou o veículo para que o trabalho fosse feito. O Autor litiga de má fé. Concluiu pela procedência da excepção deduzida e pela improcedência da acção, devendo o autor ser condenado como litigante de má fé.

Na sua réplica concluiu o Autor pela improcedência da excepção arguida.

Foi proferido o respectivo despacho saneador e organizada a matéria de facto relevante assente e a provar.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, vindo a ser proferida sentença que julgou procedente a excepção peremptória da caducidade, absolvendo a Ré "Carsil - Camejo, Ramalho e Silva, Lda" dos pedidos contra si formulados pelo autor José.

Inconformado o A. recorreu da sentença, tendo formulado as seguintes conclusões: 1. Para além do pedido formulado pelo A. relativamente ao veículo, formulou, ainda, um pedido de condenação da R. a pagar os danos de natureza patrimonial e morais derivados da paralisação do veículo.

  1. A condenação da R. no ressarcimento desses danos deriva do instituto da responsabilidade civil por actos ilícitos.

  2. Enquanto as questões derivadas da compra e venda defeituosa (anulação/reparação/restituição do excesso do preço) devem ser decididas de acordo com as disposições contidas nas secções V e VI, do Capitulo I, Titulo II, do Livro lI e, ainda, 285°/294° do Código Civil, a da responsabilidade civil deve ter tratamento autónomo, com base nos arts. 483° e segs. do mesmo Código.

  3. O prazo para o exercício do direito a exigir a responsabilidade civil pelos danos patrimoniais e morais é um prazo prescricional de três anos.

  4. Tendo a entrega do veículo ocorrido em 7/9/2001, os danos patrimoniais e morais ocorrido posteriormente, e a acção para pedir o seu ressarcimento sido intentada em 21/06/2002, ainda não tinha decorrido o prazo prescricional de três anos.

  5. O comprador tem o direito a exigir a anulação do negócio com base em erro, a reparação ou substituição do veículo defeituoso e a indemnização pelos prejuízos.

  6. Era sobre o R. que impendia o ónus (como facto impeditivo/extintivo do direito do A) de provar que os defeitos não eram do seu conhecimento.

  7. Não se provou que os defeitos não eram do conhecimento da R. no acto da venda.

  8. Como condição para o exercício do direito (anulação, reparação, substituição, indemnização) por parte do comprador exige-se que tenha feito a denúncia ao vendedor nos trinta dias imediatos ao conhecimento e dentro do prazo de seis meses após a entrega da coisa.

  9. O A. fez a denúncia à R. de imediato a lhe ter sido entregue o veículo e por três vezes até 11 de Dezembro de 2001, muito antes de decorridos os seis meses após a entrega do veículo.

  10. A R. aceitou a denúncia não tendo levantado qualquer objecção quanto à sua tempestividade e aceitou debelar as anomalias.

  11. A R. considerou em 3 de Dezembro de 2001 que estavam debeladas, apenas 90% das anomalias.

  12. A R. manteve igual posição na acção.

  13. O reconhecimento, nos termos das três conclusões anteriores, de que se mantêm 10% das anomalias, é urna causa impeditiva da caducidade no tocante a essas anomalias.

  14. Essas anomalias ainda existentes após as intervenções da R. são as que constam do relatório pericial, traduzidas nas respostas dadas aos artigos 2° e 9° da base instrutória.

  15. A R. para sustentar a sua excepção de caducidade alegou que os defeitos invocados pelo A. punham em causa o bom funcionamento do veículo e, por isso o exercício do direito do A não poderia ser atendido, com base no art. 921º do Código Civil.

  16. Apenas ficou provado que as anomalias punham em causa o valor do veículo e não o seu uso.

  17. Pelo que não se verifica a hipótese pré-figurada pela R. e a excepção de caducidade invocada.

  18. A MM Juíza apreciou o exercício do direito relativamente às anomalias que punham em causa o valor do veículo.

  19. A questão referida na conclusão anterior não foi suscitada pela parte, pelo que a MM Juíza estava impedida legalmente sobre ela se pronunciar.

  20. Ao fazê-Io a MM Juíza violou os princípios do dispositivo e do inquisitório e praticou um acto nulo, de acordo com os arts. 264°, 265° e 668°- d) do CPC e 333°-2 e 303° do Código Civil.

  21. A Lei trata, apenas, excepcionalmente os casos derivados de vendas defeituosas aquando de simples erros e relativos à garantia de bom funcionamento.

  22. No tocante ao exercício do direito do comprador só nas duas situações anteriores é que é estabelecido um prazo de caducidade curto (de seis meses).

  23. Nos demais casos de venda de coisa defeituosa não é aplicável o regime daquelas situações consignadas nos arts. 917° e 921° do Código Civil, por estas serem restritivas de direitos.

  24. As normas que, como as referidas na conclusão anterior, estabelecem prazos de caducidade para o exercício de direitos são insusceptíveis de interpretação extensiva.

  25. No caso dos autos o prazo para o exercício do direito (anulação/reparação/ indemnização) é prazo geral consignado no art. 309° do CC e não o do art. 917° do CC.

  26. A MM Juíza não decidiu sobre o pedido de indemnização e decidiu erradamente a excepção de caducidade e, por consequência não apreciou correctamente os demais pedidos do A.

  27. O A. tem direito, em alternativa, à reparação das anomalias do veículo detectadas na peritagem efectuada nos autos, à redução do preço em função do custo de reparação de tais anomalias nos termos dos orçamentos existentes nos autos, à substituição do automóvel no estado actual, por outro idêntico, no estado novo e sem anomalias, para além dos danos de natureza moral (arts. 543°-2 e 914° do Código Civil).

  28. Aos danos morais atribui o valor de 2.500,00€, atentos os elementos resultantes dos autos e os de carácter notório para o caso em apreço.

  29. A douta decisão recorrida violou o disposto nos Arts. 303°, 309°, 333°- 2, 483°, 496°, 498°, 911 °-1, 914° e 916° do Código Civil e 264°, 265° e 668-d) do CPC.

    Contra-alegou a Ré que concluiu que ao julgar procedente a excepção peremptória de caducidade, pelos fundamentos constantes da douta sentença recorrida, a Mma Juiza "a quo" interpretou e aplicou correctamente o direito e a lei, nomeadamente, os arts. 916º, nº2, 917º, 921º, nº 4 e 1224º do CCivil e o art. 664º do CPC.

    Corridos os Vistos legais, Cumpre apreciar e decidir Sendo as conclusões das alegações que delimitam o objecto do recurso e o âmbito do conhecimento deste Tribunal (arts. 684º, nº 3 e 690º, nº 1 do CPC), em causa está essencialmente a questão da excepção da caducidade do direito que o comprador pretende fazer valer pela venda de coisa defeituosa.

    III - FACTOS PROVADOS 1. Em 6/9/01, o A. comprou à Ré, o veículo de marca Citroen, modelo Xsara 1.4 SX 5 portas, com a matrícula 84-62-SG.

  30. O veículo em questão era novo.

  31. O A. entregou à R., além do preço do veículo a quantia de € 264.93.

  32. A aquisição do direito de propriedade respeitante ao veículo identificado em A), encontra-se inscrito a favor do A., desde 18/10/01, na C.R.Automóvel de Lisboa.

  33. A entrega do veículo do A. ocorreu no dia 7/9/01.

  34. O A. enviou e a R. recepcionou em 21/11/01, a missiva datada de 9/11/01 entre outro, com o seguinte teor: "(…).

    No dia 7/9/01 procedi à aquisição do veículo em referência. O veículo foi vendido como sendo novo. Acontece que logo nesse dia, após verificação geral ao mesmo notei as deficiências que constam em relação anexa.

    Essas deficiências levaram-me a ponderar que eventualmente ou, o veículo não era novo ou sofreu algum acidente, já que não parece crível que pudesse vir assim da fábrica.

    Apresentei de imediato reclamação junto de V. Exas., tendo ficado nas vossas oficinas durante um dia, contudo, não só não foram reparadas as deficiências, como agravadas.

    Por tal acto apresentei nova reclamação directamente na Citröen.

    Durante dois dias permaneceu então o veículo para rectificação e verificação.

    As deficiências não foram totalmente corrigidas, permanecendo as assinaladas na relação anexa com um sublinhado.

    Anexo igualmente fotografias de alguns defeitos.

    Não posso aceitar tal situação já que adquiri um carro novo, sem defeitos, portanto e, não uma viatura usada ou acidentada.

    Assim, serve a presente para no prazo de oito dias procederem à substituição da viatura por outra nova ou à devolução do preço e anulação da venda" (cfr. doc. constante de fls. 15, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

  35. Junto com a missiva imediatamente antes referida o A. enviou e a R. recepcionou o doc...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT