Acórdão nº 4106/2004-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 29 de Junho de 2004 (caso NULL)

Data29 Junho 2004
ÓrgãoCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa RELATÓRIO Critérium - Sistemas Informáticos L.da. veio propor esta acção declarativa com processo comum sob a forma ordinária contra BES - Banco Espírito Santo S.A., pedindo que este seja condenada a indemnizá-la por danos extra-patrimoniais no valor de esc. 5.000.000$00 e por danos patrimoniais no valor de esc. 46.670.000$00.

Em síntese alegou que, em 28/05/95, solicitou ao R. a emissão de um cheque no valor de USD 75.957.00, equivalente à quantia de esc. 13.066 604$00 que se destinava à empresa CTT, a título de pagamento de fornecimentos; que o cheque foi devolvido por falta de provisão, tendo a A. insistentemente solicitado ao R. que mandasse efectuar o pagamento do cheque o que só veio a suceder bem mais tarde; que, como consequência a CTT não mais contratou com a A. qualquer fornecimento, o que lhe causou danos patrimoniais e extra-patrimoniais pelos quais o R. é responsável, em virtude da sua actuação.

O R. contestou, impugnando os factos aduzidos pela A., inclusive que procedeu nos precisos termos em que o podia fazer, nomeadamente quanto a exigência de normas internacionais, ordenando por transferência bancária o pagamento, mantendo-se o cheque na posse da A.

Elaborado Despacho Saneador, fixados os factos assentes e organizada a base instrutória, procedeu-se a julgamento, após o que foi proferida sentença na qual se decidiu julgar parcialmente procedente a acção e condenar a Ré a pagar à Autora a quantia de esc. 7.430.000$00 * Desta decisão interpuseram recurso a Ré e a Autora.

Admitidos os recursos como apelação, a Autora apresentou as alegações constantes de fls 173, nelas formulando as seguintes CONCLUSÕES 1. Os documentos escritos podem ser elaborados através do desenho manual de letras, números e /ou outros caracteres juridicamente significativos, denominando-se então de manuscritos.

Podem, outrossim, ser elaborados através da aposição (desenho) daqueles caracteres por meios mecânicos, denominando-se então de documentos dactilografados ou mecanográficos; criados (elaborados), portanto, por meio de uma máquina. Quer os documentos manuscritos, quer os documentos dactilografados ou mecanográficos são espécies do género «documento escrito», cuja característica essencial é a de serem elaborados, criados, produzidos ex-novo - Cf. pontos XXV e XXVI das alegações.

  1. As «reproduções mecânicas», como o nome indica, são documentos elaborados, criados, produzidos a partir de uma realidade preexistente, anterior. Nos termos do artigo 368.° do CC, elas representam factos ou coisas já existentes (tenham ou não esses acontecimentos ou esses objectos tido intervenção humana prévia) - Cf. pontos XXVII a XXIX das alegações.

  2. Os documentos n.os 3 e 4 juntos ao requerimento entregue em 29 de Outubro de 2002 (cf. fls. 123 e 124) para prova do quesito 20.° da base instrutória, devam ser qualificados como «outras reproduções mecânicas».

    Na verdade, eles não foram elaborados manualmente e ex-novo, nos termos supra expostos, mas sim mecanicamente e ex post, uma vez que reproduzem coisas e factos a eles anteriores: por um lado, a facturação dos produtos neles identificados; por outro lado, os registos contabilísticos dessas operações.

  3. Não tinha a Autora o ónus de apresentar «qualquer suporte documental que permita aferir da veracidade de tais números» (cf. fls. 145), já que a Ré nunca impugnou a exactidão destes (nem de outros) documentos. Ora, nos termos do artigo 368.° do CC, «as reproduções mecânicas de factos ou de coisas fazem prova plena dos factos e das coisas que representam, se a parte contra quem os documentos são apresentados não impugnar a sua exactidão».

  4. A circunstância de não terem sido exibidos os documentos originais (esses sim, são documentos escritos em sentido próprio), em nada colide com a qualificação dos referidos documentos n°s 3 e 4 (e demais semelhantes) como «outras reproduções mecânicas», visto que a exibição dos "originais" apenas consubstancia um ónus a cargo do apresentante, mas apenas no caso de a exactidão das reproduções mecânicas apresentadas ter sido impugnada pela outra parte, o que não foi o caso. Cf. pontos XXXII e XXXIII das alegações.

  5. Dada a força probatória legal destes documentos, não poderia o Excelentíssimo Juiz a quo julgar os factos neles representados como não provados na totalidade (cf. fls. 158), porquanto as reproduções mecânicas não impugnadas (como é o caso) não estão sujeitas à livre apreciação do julgador, pelo que, a Autora, ora recorrente, considera a valoração em sentença dos meios de prova apresentados como documentos n°s 3 e 4 juntos ao requerimento de 29 de Outubro de 2002, menos acertada.

  6. O Digníssimo Juiz a quo aderiu totalmente ao julgamento da matéria de facto, constante de despacho, por ele não proferido, de 6 de Março de 2003, no qual se procedeu a uma incorrecta qualificação jurídica dos documentos apresentados para provar os factos alegados no quesito 19.° [cf. fls. 7 e 144]. A Autora entende que assenta numa incorrecta valoração dos meios de prova apresentados (os referidos documentos), que devem ser qualificados como reproduções mecânicas e, por isso, impugna a Douta sentença de 4 de Dezembro de 2003, viciada de erro de julgamento Cf. pontos XXXVII a XLI.

  7. Mas não só, pois que a sentença ostenta abertamente a nulidade (n.° 1 do artigo 201.° do CPC) decorrente da violação do princípio da plenitude da assistência dos juizes [n.° 1 do artigo 654.° do CPC] e do decurso do prazo de 30 dias, imposto pelo artigo 658.° do CPC.

  8. A lei impõe ao juiz, no momento em que profere a sentença, uma reapreciação da matéria de facto - «o exame crítico» imposto no n.° 3 do artigo 659.° do CPC. E esta exigência deve ser interpretada na sequência do n.° 1 do artigo 654.° do CPC, pois é deste momento vivo que o juiz retira a sua convicção sobre a demonstração da realidade dos factos alegado pelas partes e é deste momento humano que irá nascer uma decisão judicial que, soberanamente e em nome do povo, administrará a Justiça.

  9. A necessidade de proferir sentença «dentro de 30 dias», como dispõe o artigo 358.° do CPC, foi pensada tendo em conta que o juiz que julga a matéria de facto em tribunal singular deve ser o mesmo que sentenciará os pedidos deduzidos pelas partes.

  10. Passado o prazo, considera-se que a impressão causada na audiência final já não estará tão viva na memória do julgador e, por isso, a prolação de sentença depois do prazo de 30 dias é sempre susceptível de influir no exame e na decisão da causa, pelo que não fará o menor sentido classificá-lo como meramente ordenador, especialmente se o juiz que proferiu a sentença não interveio no julgamento da matéria de facto.

  11. Por despacho de 14 de Janeiro de 2004 [cf. fls. 170], foi o deferido o requerimento de interposição de recurso, datado de 9 de Janeiro de 2004. Porém, foi-lhe atribuído efeito suspensivo, ao abrigo do artigo 692.°, n.° 1 do CPC, na redacção anterior ao Decreto-Lei n.° 38/2003, de 8 de Março.

    Ora, tendo em conta o artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 199/2003, de 10 de Setembro, ao presente recurso de apelação deve ser atribuído efeito meramente devolutivo, nos termos do n.° 1 do artigo 692.° do CPC.

    Termos em que e nos melhores de Direito, sempre com o Douto suprimento de Vossas Excelências, deverá ser concedido provimento ao presente recurso, conferindo-lhe efeito meramente devolutivo e alterando-se a sentença recorrida, no sentido de: Reconhecer a força probatória plena do documento n.° 6 junto à petição inicial e, em consequência, dar como provado o quesito n.° 19.° da base instrutória; Reconhecer a força probatória plena dos documentos n.os 3 e 4 juntos ao requerimento entregue em 29 de Outubro de 2002 (cf. fls. 123 e 124) e, em consequência, dar como provado o quesito 20.° da base instrutória; Condenar a Ré no pagamento de 46.440.000$...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT