Acórdão nº 3173/2004-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 02 de Junho de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelCARLOS DE SOUSA
Data da Resolução02 de Junho de 2004
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Lisboa: I - No processo de Instrução, vindo do 1º Juízo do TIC de Lisboa, recorrem os assistentes (A) e (B) do despacho de fls. 211/213, datado de 4/12/2003, que rejeitou o seu requerimento de abertura da instrução.

II -

  1. Da sua motivação, extraem os recorrentes as seguintes conclusões (que se transcrevem): « 1. O objecto do presente Recurso tem que ver com a rejeição por parte do Tribunal a quo da Abertura da Instrução requerida pelos Assistentes, ora Recorrentes.

    1. Da leitura do Despacho que rejeitou liminarmente a Abertura da Instrução requerida pelos Assistentes, resulta, nomeadamente que: a) O Requerimento de Abertura da Instrução apresentado pelos Assistentes não preenche os requisitos previstos na lei, pois o requerimento para abertura da instrução tem de configurar substancialmente uma acusação; b) o Requerimento de Abertura da Instrução apresentado pelos Assistentes é, pura e simplesmente, omisso no que diz respeito aos factos imputados às Arguidas e às disposições legais aplicáveis; c) a falta de narração dos factos constitui uma nulidade insanável e de conhecimento oficioso; d) em caso de arquivamento do inquérito pelo M.P., é o requerimento para a abertura da instrução apresentado pelo assistente que fixa o objecto do processo; e) em caso de arquivamento do inquérito pelo M.P. e faltando a narração dos factos imputados ao arguido no requerimento para a abertura de instrução, verifica-se uma inadmissibilidade originária da pronúncia e, logo, da instrução, uma vez que aquela importaria sempre, uma alteração substancial dos factos; f) A instrução, no caso concreto, é legalmente inadmissível.

    2. A Decisão do Tribunal a quo diz o que a lei não diz, distingue onde a lei não distingue e, ainda, parte de um pressuposto falso, no qual, aliás, assenta a grande maioria das suas conclusões e, em grande parte, a sua decisão de rejeitar a abertura de instrução.

    3. A rejeição da abertura de instrução por parte Tribunal a quo, resulta, na essência, na alegada omissão por parte dos Assistentes, no seu Requerimento para a Abertura da Instrução, dos factos que consideram estar indiciados e das disposições legais aplicáveis.

    4. Além de tal omissão não determinar a inadmissibilidade legal da instrução, os Assistentes, no seu Requerimento para a Abertura da Instrução, indicaram os factos que consideravam indiciados, bem como invocaram as disposições legais aplicáveis.

    5. Vejam-se os Arts. 18º e ss. desse Requerimento.

    6. O Requerimento para a Abertura da Instrução apresentado pelos Assistentes preenche os requisitos legais atrás transcritos.

    7. Com efeito, no Requerimento para a Abertura de Instrução que apresentaram, os Assistentes: a) procederam à narração, em termos sintéticos (tal como a lei permite), dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança - quando alegaram que há falsificação, quer do cheque, quer do pedido de resgate, na medida em que as arguidas provocaram, pelo preenchimento e para proveito próprio (ou de terceiro), uma desconformidade entre o documento e a declaração que esse documento se destinava a exarar» e «Verifica-se a prática do crime de usura, na medida em que as Arguidas aproveitaram-se, em benefício próprio (ou de terceiro), da situação de incapacidade e inépcia do irmão dos Assistentes […] Esgotando, por essa via, todo o património daquele»; b) denunciaram a motivação das Arguidas - quando alegaram que os actos praticados por estas foram praticados em beneficio próprio ou de terceiro; c) deram a conhecer outras circunstâncias relevantes para a determinação da sanção - quando invocaram e comprovaram o estado asténico, de prostração e de debilidade generalizada do irmão dos Assistentes no momento em que foram assinados o pedido de resgate e o cheque; d) indicaram as disposições legais aplicáveis - quando remeteram para os Arts. 256º, n.º 1, alínea b) e 226º, nºs 1 e 4, ambos do C.P.).

    8. «No requerimento da instrução o assistente tem de indicar os factos, mas a indiciação desses factos pode resultar dos actos de instrução requeridos. Essencial é apenas que os factos do crime pelos quais o assistente pretende a pronúncia tenham sido objecto do inquérito, sob pena de nulidade processual e consequente inadmissibilidade legal da instrução (art. 287º, n.º 3)» (germano marques da silva, in Curso de Processo Penal, Vol. III, págs. 139 e 140).

    9. Não se diga, por outro lado, que os Assistentes, no seu Requerimento para a Abertura da Instrução, omitiram a autoria dos factos criminosos, pois que referem, sempre, "as Arguidas", cuja identificação está devidamente feita nos Autos.

    10. Admitir o contrário, resultaria na constatação de que o Inquérito impulsionado pelos Assistentes correu contra incertos, o que não é verdadeiro, nem, de resto, seria contrário à lei.

      À cautela, 12. Não é correcto afirmar-se que uma e outra falta (falta de narração dos factos e falta de indicação das disposições legais) seguem regimes de nulidade diferentes.

    11. As nulidades insanáveis e de conhecimento oficioso são apenas as que constam do Art. 119º, C.P.P. ou de outras disposições legais que o determinem expressamente. Tal entendimento resulta da conjugação deste artigo com o Art. 120º, n.º 1, C.P.P., nos termos do qual, «Qualquer nulidade diversa das referidas no artigo anterior deve ser arguida pelos interessados e fica sujeita à disciplina prevista neste artigo e no artigo seguinte.

      » 14. A falta de narração, quer na acusação, quer no requerimento para a abertura da instrução, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, não consta do elenco legal das nulidades insanáveis e de conhecimento oficioso, que é o Art. 119º, C.P.P.

    12. Do mesmo modo, não existe qualquer disposição legal que determine que a falta de narração dos factos na acusação ou no requerimento para a abertura da Instrução é uma nulidade insanável e de conhecimento oficioso.

    13. O proémio do Art. 283º, n.º 3, CPP, limita-se a referir «sob pena de nulidade», não especificando, para efeitos do disposto no proémio do Art. 119º, CPP, que se trata de uma nulidade insanável ou de conhecimento oficioso.

    14. Caso se verificasse, no caso sub juditio - o que não se admite nem concede e se refere por mero dever de patrocínio -, a falta de narração dos factos, tal nulidade teria de ser invocada pelas próprias Arguidas, não estando na disponibilidade do Tribunal a quo conhecer, oficiosamente, das mesmas e, consequentemente, rejeitar liminarmente a abertura da Instrução com esse fundamento.

    15. «O objecto do processo pode também ser delimitado pela pretensão do queixoso, mesmo na fase do inquérito. Nos crimes em que a queixa é condição de procedibilidade, o objecto do processo é delimitado por ela, mesmo na fase do inquérito, relativamente aos factos constitutivos do tipo de crime objecto da queixa […]» (germano marques da silva, ob. cit., Vol. I, pág. n.º 338).

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