Acórdão nº 7174/2002-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 18 de Maio de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelVAZ DAS NEVES
Data da Resolução18 de Maio de 2004
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam neste Tribunal da Relação de Lisboa.

  1. RELATÓRIO (A), identificada nos autos, in-tentou a presente acção contra o HOSPITAL DE SANTA MARIA e TECNILIMPE - COMPANHIA DE LIMPEZA, HIGIENE, TRATAMENTO E CONSERVAÇÃO, LDA., identificados nos autos, pedindo que sejam, solidariamente, condenados a pagar-lhe a quantia de 9.200.000$00 por danos patrimoniais e não patrimoniais e ainda os que se liquidarem em execução de sentença.

    No essencial, e em resumo, alega que é funcionária do Hospital de Santa Maria, onde exercia funções quando foi vítima de um acidente, em 5.12.1989. Ao passar no Piso 1 escorregou e caiu desamparada sobre a perna esquerda, por o chão estar molhado e com uma camada de cera por espalhar. A limpeza ao Hospital era assegurada pela Ré Tecnilimpe Lda., e o acidente resultou do comportamento dos trabalhadores desta empresa que deixaram o soalho molhado e com cera por espalhar, apesar de alertados para tal situação.

    Após o acidente a Autora foi transportada para o serviço de urgência do hospital verificando-se que tinha fractura do colo do fémur da perna esquerda que lhe provocava dores agudas. Em 7.12.1989 foi operada sendo-lhe colocada uma prótese cimentada de moore. A recuperação foi lenta e em princípios de Março de 1990 passou a ter dores agudas e a não ter posição que lhe permitisse descansar, apesar dos tratamentos de hidroterapia e dos analgésicos tomados. Face às suspeitas de rejeição da prótese a Autora foi de novo internada no hospital de Santa Maria, em 2.12.91, sendo de novo operada para extracção da prótese e forçada a permanecer 9 semanas dei-tada em posição horizontal, com a perna esquerda em tracção com um peso de 6 quilos, mantendo, até ao presente, ortoplastia de ressecação tipo gudlestone e tendo a perna esquerda ficado mais curta 3,5 cm, sem ter podido poisar o pé esquerdo no chão durante mais de 6 meses.

    Correndo perigo de vida, os médicos responsáveis pelo tratamento da Autora optaram por não lhe colocar nova prótese, pelo que, com toda a probabilidade, está definitivamente condenada a só poder andar com o auxílio de duas canadianas e, mesmo assim, com grande dificuldade. Não poderá bastar-se a si própria, não poderá permanecer de pé nem fazer as actividades domésticas que sempre fez, só podendo sair de casa acompanhada por outra pessoa e de táxi. Tem vindo a fazer desde 15.4.92 exercícios de fisio-terapia, tendo ultrapassado as 60 sessões de tratamento e em 13.10.92 foi submetida à junta médica da ADSE a qual deliberou encontrar-se a mesma situação de eventual incapacidade permanente para o serviço e apresentar-se à junta médica da Caixa Geral de Aposenta-ções, para efeitos de aposentação antecipada, por incapacidade permanente para o serviço.

    Com despesas por deslocações que foi força-da a fazer, por causa do acidente, para efeitos de análises, tratamentos, intervenções cirúrgicas, submissão a juntas médicas a Autora gastou uma quantia não inferior a 200.000$00.

    Por causa do acidente sofreu dores físicas agudas, incómodos com deslocações, esperas, internamentos, profunda angústia e depressão pela evolução da situação clínica e permanente incerteza quanto ao seu futuro, confrontando-se com a perspectiva da invalidez per-manente e correndo a sua vida grave perigo, passou a temer os tratamentos futuros.

    A Autora exercia a função de ortopedista e, por causa do acidente e das lesões sofridas, deixou de poder exercer a sua actividade profissional, como anteriormente fazia, passando a dedicar ao trabalho menos 50% das horas que dedicava até Dezembro de 1989, diminuindo nessa percentagem os seus rendimentos provenientes do trabalho. A Autora sofrerá ainda danos patrimoniais decorrentes da sua incapacidade para o exercício de funções enquanto funcionaria do Hospital da Santa Maria, uma vez que terá que se apresentar à junta médica da Caixa Geral de Aposentações, para efeitos de aposentação antecipada, danos correspondentes à diferença do vencimento actual para o vencimento que, em condições normais auferiria e serviria para o cálculo da pensão de reforma, tendo em conta a sua normal progressão na carreira, cujo apuramento está dependente da decisão a tomar pela junta médica, pelo que se relegam para liquidação ulterior, bem como os danos patrimoniais e não patrimoniais resultantes do acidente que se venham a apurar, como os relativos à incapacidade para o exercício de funções por parte da A. enquanto funcionária do Hospital de Santa Maria.

    A Ré Tecnilimpe, Lda. contestou alegando, em síntese, que desconhece se a Autora foi vítima do acidente, desconhecendo quaisquer queixas em relação ao modo como são limpos os pavimentos do Hospital, tendo até recebido da administração elogios sobre o modo como o trabalho era feito. Em Dezembro de 1989 era a concessionária dos serviços de limpeza do Hospital de Santa Maria e o piso do Hospital onde se diz ter sido aplicada cera é de pedra e na pedra não se aplica cera.

    O Réu Hospital de Santa Maria contestou alegando, em síntese, que o Tribunal Cível é incompetente em razão da matéria para conhecer do pedido em relação ao si, sendo competente o tribunal administrativo por o contrato estabelecido com a Ré Tecnilimpe se enquadrar na figura do acto administrativo. Mesmo que assim se não entenda, sempre o Tribunal Cível será incompetente em razão da matéria por ser competente para o efeito o Tribunal de Trabalho por o contrato em questão configurar um contrato de trabalho.

    No despacho saneador foram julgadas improcedentes as excepções de incompetência do Tribunal Cível em razão da matéria. Desta decisão houve recurso de agravo que foi julgado deserto por falta de alegações (fls. 289).

    Realizado o julgamento foi proferida sentença que absolveu do pedido o Réu Hospital e condenou a Ré Tecnilimpe no pagamento à Autora de 2.200.000$00 a título de danos patrimoniais e 2.000.000$00 a título de danos morais. Foi ainda a Ré condenada no pagamento por danos materiais sofridos em consequência do acidente que se vierem a liquidar em execução de sentença (lucros emergentes ainda não apurados e despesas acrescidas não determinadas) Desta sentença a Autora interpôs o presente recurso, o qual foi devidamente admitido como apelação.

    A Apelante apresentou alegações de recurso e formulou as seguintes conclusões: 1. A douta Sentença recorrida violou o disposto nos artigos 483.º, 500.º e 501.º do Código Civil, na interpretação dos mesmos à luz do disposto nos artigos 2.º e 13.º da Constituição.

    1. Para efeitos de indemnização, a Autora deve ser considerada "terceira" face ao R. Hospital de Santa Maria, não podendo ser discriminada em relação a qualquer particular nas mesmas circunstâncias.

    2. O R. Hospital de Santa Maria é solidariamente responsável pelos danos causados à Autora pelo pessoal ao serviço da R. Tecnilimpe, por esta dever ser considerada sua representante (artigos 483.º e 501.º do C.C.), uma vez que nela concessionou a prática de actos funcionais que a si lhe competiam e pelos quais é responsável.

    3. Em todo o caso, mesmo que assim não se entenda, o R. Hospital de Santa Maria terá de ser condenado solidariamente com a R. Tecnilimpe em virtude da relação de comissão que o contrato celebrado configura (artigo 500.º do C.C.) e mesmo pela omissão de diligência devida em matéria de vigilância da actividade da R. Tecnilimpe e no assegurar de condições de segurança nas suas instalações, a partir do momento em que funcionários seus tiveram conhecimento do risco criado para os utilizadores das instalações (artigos 483.º e 501.º do C.C.).

    4. A douta Sentença recorrida violou o disposto no n.º 3 do artigo 566.º do C.C., ao não fixar, segundo um juízo de equidade, os danos relativos às despesas acrescidas da Autora decorrentes da impossibilidade de utilizar transportes públicos colectivos e à incapacidade para se bastar a si própria na sua vida não profissional, que sendo impossíveis de averiguar no seu montante exacto não poderão ser relegados para liquidação em execução de sentença, nos termos do n.º 2 do artigo 564.º do C.C..

    5. Tais danos deverão ser fixados, no mínimo, no montante peticionado pela Autora, afigurando--se de resto muito superiores, segundo as regras da experiência.

    6. Os Réus deverão ser condenados no pedido genérico de indemnização por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais que se venham a apurar.

    Não houve contra-alegações de recurso.

    Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

  2. OS FACTOS Estão provados os seguintes factos: 1. Em Dezembro de 1989, a co-ré "Tecnilimpe" era a concessionária dos serviços de limpeza no Hospital de Santa Maria.

    1. O 1.º R. é uma pessoa colectiva de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira, tendo por atribuições a prestação de assistência média, o ensino, a investigação científica e a colaboração com os serviços de saúde pública na educação sanitária das populações e nos planos de prevenção da doença.

    2. Entre os Réus foi celebrado contrato de fls. 125 a 127.

    3. A Autora nasceu no dia 6/3/1931 (certidão de fls. 123). E do seu processo individual constam as seguintes classificações de serviço: muito bom, relativamente aos anos de 1984, 1985, 1986 e 1987.

    4. A Autora é, desde 15.2.1984, funcionária do 1.º Réu tendo estado integrada desde então na categoria de técnica ortopedista de 2.a classe e exercendo funções no Hospital de Santa Maria, em Lisboa.

    5. Estando ao serviço do 1.º Réu, a Autora foi vítima de um acidente no dia 5.12.1989, cerca das 8 horas e 30 minutos, quando se encontrava no Hospital, no exercício da sua actividade profissional. E ao passar no Piso 1, em frente à porta de ortopedia, escorregou e caiu...

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