Acórdão nº 2803/2004-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 13 de Maio de 2004 (caso NULL)
Magistrado Responsável | ANA PAULA BOULAROT |
Data da Resolução | 13 de Maio de 2004 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
ACORDAM OS JUIZES NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I - O, LDA intentou acção declarativa, na forma sumária, contra U, L.DA pedindo que esta seja condenada a pagar-lhe a quantia de 6.265, 24 Euros, alegando para o efeito e em síntese que contratou os serviços da R para transporte de cinco caixas contendo amostras de betão, das quais uma veio a ser perdida pela Ré, o que implicou que a Autora tivesse de retirar novas amostras o que lhe veio a causar prejuízos, que a Ré se recusa a pagar, uma vez que as condições gerais insertas no contrato de transporte limitavam a responsabilidade a determinados montantes, acrescentando ainda que essas clausulas reguladoras do contrato não lhe foram lidas ou explicadas, as quais, atenta a forma de impressão na carta de porte, não podem considerar-se como fazendo parte do contrato celebrado ou assim não se entendendo, sempre há-de ser considerada cláusula nula por absolutamente proibida à luz do regime legal vigente.
A final veio a ser proferida sentença a julgar parcialmente procedente o pedido formulado pela Autora, tendo-se condenado a Ré a satisfazer-lhe a quantia de 5.666, 60 Euros, da qual, esta, inconformada recorreu, apresentando, em síntese, as seguintes conclusões: - Entre a Autora e a Ré foi celebrado um contrato de transporte aéreo internacional, sujeito às normas consignadas na Convenção para a Unificação de Certas Regras Relativas ao Transporte Aéreo Internacional, assinada em Varsóvia, em 12.10.1929, modificada pelo Protocolo de Haia, assinado em Haia em 28.09.1955 e alterada pelo Protocolo n.° 4 de Montreal de 1975 ("Convenção de Varsóvia").
- E perdeu uma das cinco caixas objecto do transporte e não logrou provar que usou de toda a diligência e tomou todas as medidas necessárias para evitar tal perda, pelo que não ilidiu a presunção de culpa que resulta das disposições conjugadas dos artigos 18° e 20º da Convenção de Varsóvia, respondendo para com a Autora pelo dano proveniente da perda da mercadoria.
- Os limites da responsabilidade fixados no artigo 22 ° da Convenção de Varsóvia são de aplicar ao incumprimento contratual do transportador, excepto quando: (i) houver declaração especial de valor, feita pelo expedidor, no momento da entrega da bagagem ou mercadoria ao transportador (cf. n ° 2, alíneas a) e b) do artigo 22 °); ou (ü) o dano resultar de acto ou omissão do transportador ou os seus propostos, quer com a intenção de provocar dano, quer temerariamente e com a consciência de que o dano resultaria provavelmente de tal acto ou omissão (cf. artigo 25.° da mesma Convenção).
- No caso sub judice a Autora não fez qualquer declaração especial de valor (cf. alínea J) dos factos assentes) e, como a própria sentença reconhece, não consta dos factos provados qualquer factualidade, positiva ou negativa, relativamente a uma actuação dolosa ou negligência grosseira por parte da Ré ou dos seus propostos.
- O artigo 25º da Convenção de Varsóvia, diversamente do que sucede no artigo 20°, não estabelece nenhuma presunção de culpa contra o transportador, nem é imposto ao transportador o ónus de prova de factos negativos, ou seja, o ónus de prova da sua não actuação com dolo ou negligência grosseira.
- Cabe sim ao transportado, para ter direito a indemnização não sujeita aos limites a que se refere o artigo 22 °, o ónus de alegação e prova de factos que integrem actuação dolosa ou negligência grosseira do transportador.
- Na falta de alegação e prova de factos que integrem actuação dolosa ou negligência grosseira do transportador ou dos seus "propostos", como sucede no caso dos autos, a indemnização não pode ultrapassar os limites fixados no artigo 22 ° da Convenção.
- Tratando-se de transporte de mercadorias e de uma perda. parcial, o limite da responsabilidade da transportadora deve ser aferido por aplicação do disposto no artigo 22º nº2, alíneas b) e c) da Convenção de Varsóvia, resultando in casu que: (i) a indemnização por perda parcial da mercadoria, da responsabilidade da Ré, não pode ultrapassar a quantia de 17 direitos de saque especiais por quilograma; (ii) a Ré transportou cinco caixas, com um peso total de 145 kg, tendo perdido apenas uma caixa, pelo que a indemnização deve ser calculada em conformidade, multiplicando-se o valor de 17 direitos de saque especiais pelo peso de uma caixa (145 Kg : 5 = 29 Kg); (iii) a taxa de câmbio do direito de saque especial, fixada à data da sentença (15.07.2003) era: 1 DSE = 1,2344 E, correspondendo assim 17 direitos de saque especiais a 20,98548 £; (iv) a Ré está obrigada a indemnizar a Autora no montante de E 608,57892.
- A presunção de culpa que impende sobre o transportador não resulta do disposto no. artigo 799° do Código Civil, como refere a sentença recorrida, mas antes da conjugação das normas vertidas nos artigos 18 ° e 20.° da Convenção de Varsóvia.
- Ao considerar que a prova negativa dos factos referidos no artigo 25º da Convenção de Varsóvia cabia à transportadora, ora Apelante, por aplicação do disposto no artigo 342° do Código Civil, a sentença recorrida não atentou no regime da responsabilidade contratual do transportador aéreo consignado naquela Convenção, violando o disposto nos seus artigos 18 °, 20 °, 22 ° e 25°, - Tais normas afastam, enquanto normas especiais, o regime de responsabilidade previsto nos artigos 483 °, 564°, 798.° e ss. do Código Civil e emanam de uma fonte - convenção internacional - que prevalece sobre o direito interno nacional.
Nas contra alegações a Autora pugna pela manutenção do julgado.
II Põem-se como problemas a resolver no âmbito do presente recurso os de saber: a) se in casu as normas a aplicar em termos de responsabilidade, são as resultantes da Convenção de Varsóvia, ou as resultantes da responsabilidade contratual insertas no CCivil; b) a questão da presunção de culpa e do ónus da prova A sentença sob recurso deu como provados os seguintes factos: - A Autora é uma sociedade comercial que se dedica ao estudo e diagnóstico...
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