Acórdão nº 8171/2003-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 31 de Março de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelTELO LUCAS
Data da Resolução31 de Março de 2004
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Lisboa : I - RELATÓRIO 1.

Nos autos de inquérito com o nº 253/02. 0PARGR-A, que correm termos pelo Tribunal Judicial da comarca da Ribeira Grande, o Digno Magistrado do Ministério Público, após lhe ter sido presente sob detenção o arguido (A), proferiu um despacho com o seguinte teor (transcreve-se parcialmente): «Indiciam os autos a prática pelo arguido (...) de, pelo menos, um crime de resistência e coacção a funcionário, p. e p. pelo art. 347º, nº 1, do CP, e um crime de injúrias agravadas, p. e p. pelo art. 181º, nº 1, e 184º, do CP.

Remeta os autos ao Mmº. JIC a quem se requere a realização do 1º interrogatório judicial com vista à aplicação de uma medida de coacção».

2.

Efectuado o requerido interrogatório, veio, a final, o Snr. Juiz de instrução a proferir o seguinte despacho (que se transcreve ipsis verbis, na parte que aqui releva) : «Não restam dúvidas dos termos do próprio auto (fls. 2 verso, linhas 1, 2 e 3) e ainda das declarações do próprio arguido que logo após a agressão por ele perpetrada a esposa deixou a residência e lá não se encontrava aquando da entrada dos guardas na mesma.

Resulta ainda do auto que terá sido a esposa do arguido quem, após deixar a casa, deu autorização à polícia para nela entrar, o que as autoridades fizeram a pretexto de que iriam "inteirar-se da situação".

Porém, o que efectivamente sucedeu foi que aprenderam (querer-se-á dizer : apreenderam) propriedade do arguido e detiveram o último na sequência disso. Quer-se com isso dizer, independentemente dos artifícios linguísticos que se pretenda utilizar, que o que a PSP efectuou foi uma busca e uma apreensão, tal como definidas no art. 174º, nº2 do CPP.

Ora, para lá da dúvida que nos pode assaltar sobre a forma como o consentimento para a entrada no domicílio foi prestado pela esposa do arguido, temos por absolutamente seguro que esse consentimento é irrelevante no caso que nos ocupa.

Na verdade, podemos desde logo excluir a esposa do arguido como pessoa visada pela busca logo pela razão que nem se encontrava dentro da residência quando da chegada da PSP. Inversamente, temos como certo, e os factos vieram-no a demonstrar, que o visado com a dita busca e apreensão era o detido que nos foi presente, que era quem, com a respectiva carabina, se encontrava em local não livremente acessível às autoridades, como é o domicílio.

Neste particular importa logo apontar que o consentimento para a entrada na habitação só releva nos termos do art. 174º, nº4, al. b) do CPP quando prestado pelo visado com a busca. Como não foi isso que aconteceu temos que a busca efectuada, bem como a apreensão e subsequente detenção, por daquela em absoluto dependentes, são ilegais nos termos do art. 126º, nº3 do CPP, razão pela qual os elementos de prova adquiridos só podem ser utilizados para perseguição criminal contra os agentes da prevaricação, nomeadamente por indiciação do crime p. p. pelo art.º 190, nº1 do CP, se assim for entendido pelo M.ºP.º e apresentada a pertinente queixa (art.º 126, nº4 do CPP).

Cabe ainda referir que não se vislumbra em que consista a alegada intenção da PSP de entrar no domicílio para "inteirar-se da situação". Trata-se pois de uma formulação vaga, que só tem o efeito de cobrir uma actuação à margem da lei, qual seja a busca, apreensão e detenção fora das previsões legais.

Sendo a prova nula nos termos do art.º 126, nº 3 do CPP e não tendo sido apresentada queixa pelo crime de ofensas à integridade física simples, p. p. pelo artigo 143º, nº 1 do CP, não há que confirmar qualquer detenção ou aplicar medida de coacção, por da busca ilegal em tudo dependente, apenas se mantendo a apreensão a critério do M.ºP.º na medida em que venha a ser apresentada queixa criminal contra os guardas e servindo a referida carabina, que não é ilegal, como prova de tal facto.

Nestes termos, ordeno a imediata restituição do arguido à liberdade, ordeno que se extraia certidão deste despacho e se remeta ao M.º P.º (...)».

3.

Inconformado com o assim ordenado, interpôs o Digno Magistrado do Ministério Público recurso para este Tribunal, extraindo da motivação apresentada as seguintes conclusões (em transcrição) : «1.ª - Uma vez que estavam perante uma situação de quase flagrante delito e tinham autorização da ofendida para entrarem no domicílio que esta partilhava com o arguido, não era necessária a autorização do arguido para os agentes da PSP entrarem na sua residência pelo que a sua entrada é legal e não viola qualquer direito fundamental do arguido. Ao assim não entender o Mm.º JIC violou o art. 34º, nº3, da CRP, e os arts. 255º, nº1, alínea a), e 256º, nº2, do C.P.P. .

2ª. - Uma vez que a nulidade prevista no art. 126º, nº3, do C.P.P., quando a invalidade do método proibido de aquisição de prova depende do consentimento, é relativa, dependendo de arguição, e não tendo o arguido invocado a mesma e requerido a declaração de nulidade da apreensão efectuada, não podia o Mm.º JIC declarar a nulidade e não validar a apreensão da arma usada pelo arguido na agressão, efectuada pela P.S.P.. Ao declarar tal nulidade o Mm.º J.I.C. violou o art. 126º, nº3, do C.P.P..

3ª. - Ainda que assim não se entenda, uma vez que instado sobre o destino da arma que serviu para agredir a ofendida, no seguimento de uma técnica de intervenção policial válida com vista a assegurar a integridade física dos agentes policiais, o arguido entregou a mesma voluntariamente, não se efectuou qualquer busca ao seu domicílio, pelo que a sua apreensão é válida, conforme despacho do...

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