Acórdão nº 8247/2003-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 23 de Março de 2004
Magistrado Responsável | PIMENTEL MARCOS |
Data da Resolução | 23 de Março de 2004 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam do Tribunal da Relação de Lisboa: António ... e Maria ..., casados entre si, intentaram contra Maria ... e marido, José ..., e Alfredo ... e mulher, Patrícia ..., a presente acção declarativa com processo ordinário, em que pedem que seja decretada a resolução de contrato de arrendamento relativamente ao espaço onde se encontra instalado o estabelecimento comercial denominado G.., com a consequente "entrega do imóvel devoluto ao autor marido".
Subsidiariamente pedem que lhes seja reconhecido o direito de preferência no trespasse do aludido estabelecimento e em consequência lhes seja o mesmo adjudicado.
Para tanto, em síntese, alegaram que: são donos do imóvel em que se encontra instalado o estabelecimento comercial de que a primeira ré é inquilina; esta, em 20/3/2000, ofereceu à autora mulher o trespasse do referido estabelecimento, pelo preço de 15 000 000$00, conforme acordo negocial que tinha com o réu Alfredo; em 7/6/2000 a autora recebeu uma carta pela qual o segundo réu (Alfredo) lhe comunicou que por via de trespasse sucedeu ao anterior inquilino; tal trespasse foi feito pelo valor de 10.000 000$00 e não pelos anunciados 15.000.000$00; ao autor marido nada foi comunicado, quer quanto ao projecto do trespasse do estabelecimento, quer quanto à sua realização.
Contestaram os réus dizendo que: o trespasse foi efectivamente feito pelo valor de 15.000.0000$00, sendo que o valor de 10.000.000$00 constante da escritura pública teve origem num erro que foi posteriormente corrigido; os autores declararam aos trespassantes não estarem interessados em exercer a preferência no trespasse; o autor marido é casado no regime da comunhão geral de bens com a autora e com ela vive, pelo que teve conhecimento do que se foi passando, para além de que tais comunicações lhe foram feitas também a ele verbalmente.
Deduziram também os RR reconvenção, pela qual pedem a condenação dos autores na indemnização de 15.000.000$00, valor do trespasse, em caso de procedência da acção, por enriquecimento sem causa.
Replicaram os autores dizendo que a aludida rectificação do valor do trespasse se efectuou apenas na sequência da interposição da presente acção, não lhes sendo oponível a simulação do preço efectuada.
Relativamente à reconvenção disseram os reconvindos que da resolução do contrato de arrendamento não resulta para os autores qualquer enriquecimento ilegítimo, nem o causal empobrecimento dos réus, pelo que deve ser a mesma julgada improcedente.
Proferido o despacho saneador e instruído o processo, efectuou-se a audiência de discussão e julgamento.
Seguidamente foi proferida competente sentença nos termos seguintes: «a) - absolvo os réus Maria...e José..da totalidade dos pedidos contra eles formulados na presente acção.
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- procedente a acção e, em consequência da natureza constitutiva da mesma, declaro a substituição do réu marido Alfredo pelos autores no contrato de trespasse, celebrado por escritura pública no dia vinte e quatro de Maio do ano dois mil, entre Maria e José (como vendedores/trespassantes), e Alfredo (como comprador/trespassário), relativamente ao estabelecimento comercial de venda a retalho de livraria, papelaria, recordações e brinquedos, denominado "A G...", instalado no rés-do-chão esquerdo do prédio urbano sito à Rua......considerando que os aqui autores António e Maria, são os adquirentes de tal estabelecimento comercial, no exercício do seu direito legal de preferência, pelo preço de quarenta e nove mil oitocentos e setenta e nove euros e setenta e nove cêntimos (o equivalente a dez milhões de escudos).
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- consequentemente, ordeno o cancelamento de qualquer registo respeitante ao dito prédio efectuado a favor dos referidos réus.
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- absolvo os autores/reconvindos dos pedidos reconvencionais contra os mesmos formulados».
Dela recorreram AA e RR, formulando as seguintes conclusões: (...) Entretanto, os RR foram condenados como litigantes de má fé.
Desta decisão também eles recorreram, concluindo em síntese: - o preço do trespasse foi de 15.000.000$00 e não de 10.000.000$00; - os RR tinham conhecimento de que esse preço era de 15.000.000$00; - os RR tentaram a rectificação do preço declarado na escritura antes de terem sido citados para esta acção.
Colhidos os vistos legais cumpre apreciar e decidir.
Na 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos: 1 - Os autores são donos do prédio urbano sito à Rua.....de cujo rés-do-chão esquerdo é a ré Maria ... , inquilina, local onde esta tem instalado um estabelecimento comercial de venda a retalho de livraria, papelaria, recordações e brinquedos, denominado A G... (Al.
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Factos Assentes) 2 - Por carta de 20/3/2000, a dita Maria ofereceu à autora Maria o direito de preferência no trespasse do estabelecimento que ia fazer a Alfredo, pela contraprestação de 15 000 000$00. (Al. B) Factos Assentes) 3 - Por escritura pública realizada em 24/5/2000, no cartório notarial de..., os réus Maria e José, pelo valor de 10.000.000$00, que se encontra pago, trespassou ao réu Alfredo, casado com Patrícia, o referido estabelecimento, denominado A G.., com todos os seus pertences, designadamente móveis, mercadorias, respectivas licenças, alvará e direito ao arrendamento. (Al. D) Factos Assentes) 4 -A autora Maria soube que o preço do trespasse era por 15.000.000$00, bem como as demais condições do negócio. (Resp. ao quesito 2º) 5 - Foi-lhe comunicado, por escrito, que o valor do trespasse era de 15.000.000$00, pagos integralmente no acto da escritura pública, sendo trespassário o réu Alfredo. (Resp. ao quesito 9º) 6 - Foi advertida do prazo para exercer a preferência. (Resp. ao quesito 16º) 7 - E no prazo de 8 dias nada disse. (Resp. aos quesitos 10º e 17º) 8 - Na escritura pública os réus declararam como valor do trespasse a quantia de 10.000.000$00. (Resp. quesito 19º).
9 - A presente acção deu entrada em juízo em 10/7/2000, os réus foram citados em 31/10/2000 e contestaram em 30/11/2000. (fls. 1, 22, 23, 25 e 38 dos autos) 10 - No dia 28/11/2000, no cartório notarial de ... foi lavrada uma escritura pública epigrafada de «Rectificação», na qual, os réus, Maria e José, por um lado, e Alfredo, por outro, declararam que no dia 24/5/2000, naquele cartório, «outorgaram uma escritura de trespasse (...) Que dessa escritura, por manifesto erro, ficou a constar que o valor do trespasse era de 10 000 000$00. Que no entanto o valor do trespasse foi de 15 000 000$00, pelo que a referida escritura é neste momento rectificada no sentido de ficar a constar que o valor do trespasse é 15 000 000$00 e não como erradamente consta naquela escritura». (Al. F) Factos Assentes) 11 - A senhoria, Maria, é a pessoa a quem as rendas são pagas e quem sempre assinou os respectivos recibos. (Resp. ao quesito 11º).
12 - O réu Alfredo comunicou à autora, primeiro verbalmente e depois por escrito, que tal como havia sido informada pela ré G.., havia adquirido o estabelecimento por trespasse. (Resp. ao quesito 6º) 13 - Por carta enviada à autora, a 7/6/2000, o réu Alfredo , comunicou a esta que sucedia ao anterior inquilino nos seus direitos e deveres, por força do trespasse de 24/05/00. (Al. C) Factos Assentes) 14 - Ao autor António nada foi comunicado pelos réus, quer no que toca ao projecto de trespasse e cláusulas do respectivo contrato, quer no tocante à comunicação de cedência do gozo do prédio arrendado ao réu Alfredo. (Al. E) Factos Assentes) 15 - Os autores são casados um com o outro desde...
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