Acórdão nº 9316/2003-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 20 de Janeiro de 2004 (caso NULL)
Magistrado Responsável | ANDRÉ DOS SANTOS |
Data da Resolução | 20 de Janeiro de 2004 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa (A), intentou a presente acção declarativa de condenação com processo ordinário contra "SAMS - Serviços de Assistência Médico-Social do Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas", com sede na Rua Marquês da Fronteira, nº 16, em Lisboa, pedindo a condenação deste no pagamento de indemnização no valor de Esc:5.000.000$00.
Para tanto, alega essencialmente que, em 02.11.95, o A. fez um exame médico denominado clister opaco nas instalações da R., que a introdução do contraste foi efectuada de um modo forçado e grosseiro, provocando violentas dores nos quadrantes interiores do abdómen e períneo do A.; que, nos três dias subsequentes ao exame médico, o A. foi acometido por fortíssimas dores abdominais e febres altas que o impediram de trabalhar durante a tarde de segunda-feira, dia 06.11.95, tendo-se então dirigido à sede da R. onde foi atendido pela sua médica assistente, que lhe afirmou serem tais sintomas consequências do exame que realizara, prescrevendo-lhe um medicamento para as salmonelas.
Perante o agravamento dos sintomas referidos, paralelamente com a circunstância de paragem de emissão de fezes e gases desde a data da realização do exame, há já cerca de 5 dias, no dia 07.11.95, dirigiu-se o A. ao Serviço de Urgências do Hospital de Santa Maria, onde, após a realização de análises clínicas e radiografias, lhe foram prescritos clisteres e supositórios de glicerina, tendo nesse serviço sido advertido que, em caso de agudização dos sintomas que apresentava, se dirigisse de novo e de imediato àquelas urgências, o que veio a acontecer no dia seguinte perante a agravamento do seu estado de saúde.
Prosseguindo, refere que, em consequência dos exames realizados, o A. foi operado em 09.11.95 com diagnóstico de abcesso peritoneal em virtude de perfuração traumática do recto após clister opaco, cirurgia em que o A. foi sujeito a drenagem abdominal e colostomia ilíaca esquerda, para desvio do trânsito intestinal.
Dizendo que, anteriormente à realização do clister opaco, nunca tinha sido submetido a uma intervenção cirúrgica, nem estado hospitalizado, sustenta o A. que, em Fevereiro de 1996, foi sujeito a uma segunda intervenção cirúrgica que confirma a irreversibilidade da perfuração do recto e a necessidade de manter o trânsito intestinal desviado, após o que foi submetido a três tratamentos de quimioterapia com internamento, o que agudizou ainda mais o sofrimento físico, acompanhado de emagrecimento, cansaço e depressão nervosa, bem como o sofrimento psíquico e desgaste mental resultantes do seu péssimo estado de saúde e deterioração da qualidade de vida.
A alteração dos seus hábitos de vida decorrente da necessidade de usar sacos de colostomia e toda a dor e sofrimento sentidos são consequência directa da conduta negligente do técnico e da médica que efectuaram a endoscopia rectal, devendo, por isso, o A. ser indemnizado por todos os danos sofridos.
Notificado, contestou o R., dizendo essencialmente que a cânula utilizada na realização do exame não causou qualquer traumatismo e que os sintomas apresentados pelo A. eram próprios da doença grave de que já sofria e que foi verificada de neoplasia da transição recto-sigmoide, inessecável, sendo que a doença grave do foro oncológico de que o A. já padecia é que provocou as lesões patológicas, próprias da sua evolução.
Foi proferido despacho saneador e fixados os factos assentes e os controvertidos, sem reclamação.
Realizou-se audiência de discussão e julgamento, tendo o tribunal respondido aos quesitos nos termos de fls 187.
Proferida sentença, nela se decidiu julgar a acção parcialmente procedente e, condenar-se o R. a pagar ao A. a importância de € 19.951,92 (Esc.4.000.000$00).
Desta decisão a Ré interpôs recurso.
* Admitido o recurso como apelação, a Apelante juntou alegações nas quais concluiu: 1.a No caso em apreço, não se verifica qualquer dos requisitos da responsabilidade civil 2.a Não foi fixada factualidade idónea e suficiente, que possa fundamentar a existência de causalidade adequada entre a realização do clister opaco nas instalações do Réu, a ocorrência do abcesso, mais tarde verificado e a dor e sofrimento do Autor; 3.a Também não se verificou que o Réu tivesse produzido a causa donde adequadamente tivesse surgido aquele resultado e muito menos com culpa; 4.a Não pode concluir-se que, sem a realização do clister opaco, não se teria verificado aquele resultado; 5.a Não houve, por parte do Réu, prática de qualquer acto ilícito, não se verifica o nexo de causalidade adequada entre qualquer conduta do mesmo e o dano e inexiste possibilidade de imputação ao Réu de qualquer facto em termos de culpa; 6. a Deste modo, a douta sentença recorrida violou o disposto nos artigos 483.° e 487.°, n.o 2 do Código Civil.
Termos em que, solicita-se o provimento da apelação, com a consequente absolvição do Réu do pedido.
O Apelado contra-alegou formulando as seguintes conclusões: A - Os factos provados demonstram inequivocamente a negligência grave, passível de censura e reprovação, dos médicos dos SAMS que assistiram o Autor na realização do clister opaco, e posteriormente; B - Verifica-se nexo de causalidade entre a realização do clister opaco e a perfuração traumática do recto; C - A conduta dos SAMS, violando os deveres que sobre estes impendem, constitui facto ilícito e deu origem a um conjunto de graves danos na saúde e condições de vida do Autor, que merecem ressarcimento D - Deste modo, a sentença recorrida não viola qualquer preceito legal, inclusive o disposto nos artigos 483° e 4870, nº 2 do C. Civil, pelo que deve ser confirmada.
Matéria de facto Na sentença foi dada como provada a seguinte matéria de facto: 1 - Em 02.11.95, o A. fez um exame médico denominado clister opaco nas instalações da R. - (alínea A) dos Factos Assentes); 2 - Após o exame médico, o A. não se sentiu em condições físicas de se apresentar no seu local de trabalho - (alínea B) dos Factos...
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