Acórdão nº 8253/2003-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 11 de Novembro de 2003 (caso NULL)

Data11 Novembro 2003
ÓrgãoCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Apelação nº 8253-03-7ª Secção I - "A" (entretanto falecida, tendo-se habilitado os seus sucessores B e C)intentou a acção comum na forma ordinária contra D e E, pedindo o reconhecimento do seu direito de propriedade sobre prédio que identificam e a condenação dos RR. na destruição do beiral que invadiu o seu prédio e no encerramento das janelas, porta e abertura que deitam directamente para aquele prédio.Citados os RR. contestaram opondo-se à pretensão da A. com a alegação de que a construção em causa foi feita quando o terreno que agora é da A. estava no domínio público municipal, tendo sido aprovada pela Câmara Municipal de Ponta Delgada.Chamaram à autoria o Município de Ponta Delgada, chamamento que veio a ser admitido, não tendo o chamado intervindo nos autos.

Saneado e condensado o processo, foi designado dia para julgamento no qual as partes acordaram em considerar provados todos os factos constantes do questionário.

Depois disso foi proferida sentença que julgou a acção improcedente.

Apelou a A. e concluiu que: a) Os demandados fizeram construir na R. do Paim, nº 19, freguesia de S. José, cidade de Ponta Delgada, um edifício para habitação, obtendo a aprovação municipal do projecto que incluía na empena sul uma janela e uma porta no primeiro andar e uma abertura no rés-do-chão e o telhado com um beiral de cerca 15 cm, dando para o lote então da Câmara Municipal; b) Não há prova nos autos de que na aprovação do projecto se refira a constituição de servidões, nem que a Câmara tenha deliberado conceder estas servidões; c) Também não há prova de que as servidões tivessem sido constituídas por qualquer dos títulos previstos no art. 1547º do CC; d) Posteriormente a Câmara desafectou o terreno do domínio público e devolveu-o ao loteador, mas nesta devolução não lhe impôs qualquer condição ou reserva, designadamente a obrigação de respeitar a situação do prédio dos RR.; e) Por sua vez o loteador vendeu o terreno à A. sem qualquer condição; f) A situação resultante da edificação da casa dos RR. corresponde a uma situação de servidão; g) As Câmaras Municipais só podem conceder servidões de natureza precária, que, por isso, podem ser revogadas a qualquer tempo, não constituem direito real ou outro, não conduzem a usucapião, não podem ser registadas e não são oponíveis a quem quer que seja; h) Isto seria assim se a Câmara tivesse concedido ou constituído, mas no presente caso nem tal aconteceu - nunca foi constituída qualquer servidão, o que é confirmado pelo facto de nenhum dos ofícios juntos pelos demandados ser subscrito por pessoa com poderes de representação da Câmara, tudo se passando à revelia da Câmara; i) Mesmo que a Câmara tivesse constituído servidão válida - com intervenção do presidente ou outrem com poderes de representação, como servidão de natureza precária, para se manter após a desafectação, era indispensável que a servidão e o seu acatamento fossem impostos ao passar o terreno ao domínio privado; j) Tal não aconteceu, quer porque a servidão nunca foi constituída, quer porque se a tivesse sido, não foi imposta na desafectação; k) A situação material criada pela edificação nunca teve relevância jurídica, ou, se a tivesse tido ter-se-ia extinguido com a desafectação.

Houve contra-alegações.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

II - Factos provados: 1. A A. é comproprietária do prédio rústico de 194,70 m2 de terreno, destinado a jardinagem e quintal, designado por lote nº 9-A, sito na dita R. do Paim (ex-Rua do Carvão), da freguesia de S. José, omisso na matriz predial, confrontando a norte com os RR. (lote nº 10), a sul com jardim, a nascente R. do Paim e a poente com a própria A. (lote nº 9) - 1º; 2. A A. adquiriu esta compropriedade por escritura de compra e venda de 2-7-93, outorgada na Secretaria Notarial de Ponta Delgada, 2º Cartório, e registada a favor da A. com o n° 1.523 - S. José, e inscrição letra G - 2º; 3. Os RR. têm uma moradia de r/c e 1º andar que confronta pelo sul com o prédio da A. - A); 4. Como resulta da planta de fls. 24, a casa dos RR. foi construída no lote nº 10 e a da A. no lote nº 9 - 7º; 5. A moradia dos RR. está implantada junto à estrema com o prédio da A. - B); 6. O telhado da moradia dos RR. apresenta um beiral de cerca de 15 cm construído dentro da vertical do prédio da A. referido em 1. - D); 7. Nesta fachada da moradia os RR. abriram uma janela e uma porta no 1º andar e uma abertura no r/c, respectivamente, de poente para nascente - C); 8. Do mesmo modo, o beiral da casa dos RR. foi construído com saliência para essa área pública - 10º; 9. A casa dos RR. foi das primeiras a ser construída no chamado "Loteamento do Carvão" - 5º; 10. Certos lotes, como o dos RR., foram destinados a construções urbanas e outros a fins de utilidade pública, designadamente zonas de lazer, jardins, parques de estacionamento, etc. - 6º; 11. Quando os RR. construíram a sua moradia, esta confrontava pelo Sul não com a propriedade da A. mas com um "lote de terreno" que, ao tempo, estava afectado pela Câmara Municipal de Ponta Delgada exclusivamente ao "domínio público" - 4º; 12. O espaço entre o lote nº 10 e o lote nº 9 foi afectado ao "domínio público" e destinado a zona verde - 8º; 13. Por essa razão, a Câmara aprovou o projecto da construção da casa dos RR., o qual incluía, na empena que dá para esse espaço verde, uma janela de dimensões normais e um vitral de iluminação da escada interior da casa (referidas em 7.), condicionando essas aberturas a elaboração de grande parte daquele projecto - 9º; 14. A casa dos RR. foi iniciada em 1987 e concluída em 1988, data em que os RR. a habitaram - 11º; 15. A casa da A., edificada no lote nº 9, foi construída posteriormente - 12º; 16. A A., tal como os restantes comproprietários, nunca autorizou os RR. a procederem às obras que põem em causa; por intermédio dos seus advogados, intimaram os RR., por carta de 13-6-94, para remediarem a situação - 3º; 17. Já quando ambas as casas se encontravam edificadas, o R. pôs à Câmara a questão de saber se o espaço existente entre aquelas tinha mudado de estatuto - 13º; 18. A Câmara, em 21-6-90, não só confirmou que se tratava de "domínio público" como, ao mesmo tempo, dava conhecimento ao R. de que oficiara ao marido da A., então vivo, que fechasse um portão que aquele havia aberto para tal terreno - 14º; 19. Em 12-10-94, a Câmara informou o R. de que o terreno entre os lotes nºs 9 e 10, agora designado por lote 9-A, tinha mudado de destino e tinha sido restituído ao loteador, que o integrara no lote 9, ou seja o da A. (fls. 27 e 28) - 15º; 20. Nesse mesmo ofício...

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