Acórdão nº 4398/2003-2 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 26 de Junho de 2003 (caso None)

Magistrado ResponsávelTIBÉRIO SILVA
Data da Resolução26 de Junho de 2003
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: I Joaquim Frazão Ramos & Filhos, Limitada requereu a presente providência cautelar não especificada contra Petróleos de Portugal - Petrogal S.A, pedindo que:

  1. Seja ordenada à requerida a imediata reactivação/ligação do sistema informático do posto de abastecimento de combustíveis e de venda de lubrificantes identificado no artigo 1° do requerimento inicial, por si desligado no dia 02 de Julho de 2002, de forma a que a requerente possa usar e fruir o posto nas mesmas condições que fruía até ao referido dia 02 de Julho; B) Seja ordenada à requerida a obrigação de continuar a vender à requerente, nos termos em que o fazia antes do passado dia 02 de Julho, os combustíveis e lubrificantes por esta encomendados para revenda no aludido Posto, logo que pagas pela requerente as facturas que, entretanto, e após o dia 02 de Julho, se hajam vencido, sob pena da requerente ter a faculdade de adquirir a terceiros os aludidos combustíveis e lubrificantes; C) Seja ordenada à requerida a abstenção de qualquer conduta que impeça a requerente da normal exploração do estabelecimento referido.

    A Requerente alegou, além do mais que aqui se dá por reproduzido, que: No dia 02 de Julho de 1997, por escritura pública, a Requerida cedeu à Requerente a exploração dum estabelecimento comercial composto de posto de abastecimento de combustíveis para veículos automóveis, instalado no prédio urbano sito na Portela das Padeiras (ao Km 41,406/41,472, da Estrada Nacional no 3), freguesia de Salvador, concelho de Santarém.

    Por carta de 4 de Outubro de 2001, a Requeria procedeu à resolução do contrato de cessão de exploração, alegando, como fundamento para isso, que, prevendo o contrato determinadas vendas mínimas anuais, tais vendas nunca foram atingidas.

    A Requerente respondeu a essa carta, não aceitando a resolução e sugerindo uma reunião, que se veio a realizar em 31 de Outubro.

    A reunião foi inconclusiva, mantendo a Requerente e a Requerida as posições anteriormente assumidas.

    Posteriormente, em carta de 24 de Dezembro de 2001, a Petrogal comunicou à Requerente que procedia à denúncia do contrato, com efeitos a partir de 2 Julho de 2002.

    Após vários contactos informais, a Requerente respondeu por carta de 17 de Junho de 2002, na qual, além do mais, referiu que a Petrogal não podia denunciar um contrato que, anteriormente, tinha resolvido.

    No dia 02 de Julho de 2002, a Requerida, mediante prévio aviso telefónico, bloqueou o funcionamento do posto, através do sistema informático instalado na sede da Requerida, impedindo, a partir de então, o funcionamento do posto, o qual se encontra inactivo.

    Esse facto implicou o encerramento do posto, situação que se mantém.

    A Petrogal não cumpriu o contrato, nomeadamente no que respeita às obras que se obrigou a efectuar, não lhe cabendo, em consequência, o direito de proceder à resolução contratual.

    Os factos invocados pela Requerida para a resolução do contrato não são imputáveis à Requerente. O não alcançar os objectivos de vendas contratualmente fixados deve-se, em primeira linha, à não realização das obras por parte da Requerente. Por outro lado, foram abertos três postos de abastecimento, um dos quais da Petrogal, que distam dois ou três quilómetros do posto cedido.

    A Requerida usou o instrumento da denúncia numa altura em que já não o podia fazer, sendo tal denúncia inoperante.

    De qualquer forma, ainda que existisse a obrigação de entrega do posto, isso apenas se verificaria em 1 de Agosto de 2002.

    Existia uma cláusula penal para a eventualidade de não cumprimento da obrigação de restituição. A Requerida deveria apenas vir a Juízo pedir que a Requerente fosse condenada à restituição e a pagar o valor da cláusula penal fixada, não lhe sendo lícito o recurso à força com o fim de assegurar o seu eventual direito.

    O exercício do direito de resolução contratual, por parte da Requerida, configura, tendo em conta as circunstâncias em que foi exercido, abuso de direito, raciocínio igualmente aplicável à denúncia.

    Fruto do incumprimento por parte da Petrogal, sofreu a Requerente elevados danos e o crédito daí advindo confere-lhe do direito de retenção do estabelecimento.

    Só a imediata reactivação do posto obstará ao agravamento dos danos sofridos pela Requerente com a injustificada iniciativa da Requerida.

    A Requerida deduziu oposição, alegando, para além do mais, que aqui se dá por reproduzido, que: A Requerente não tem direito a explorar o posto desde logo porque o contrato foi em tempo devidamente denunciado, tendo a denúncia operado a caducidade do contrato e o fim das obrigações em 2 de Julho de 2002.

    Ainda que se entenda que a Requerente tem direito a explorar o posto por trinta dias após a cessação do contrato, a Petrogal prestará caução pelo valor que vier a ser fixado e que seria o correspondente aos ganhos que teria a Requerente por funcionar mais trinta dias.

    Os danos invocados pela Requerente são apenas o resultado das suas acções ou omissões.

    O prejuízo resultante da providência ( a Petrogal deixa de poder explorar um posto que é seu) excede em muito o eventual dano que com ela se quis evitar.

    É verdade que a Petrogal bloqueou a possibilidade de se vender mais produto seu nas instalações, o que fez por ser seu direito, já que o contrato terminou no dia 2 de Julho de 2002.

    Se houve contestação à resolução, se em virtude disso se tentou uma solução amigável e se continuou a fornecer sem prejuízo de se considerar fundado tal direito, o mínimo é admitir que o contrato, na pior das hipóteses, podia ser denunciado.

    Os seis meses de antecedência são suficientes para preparar a cessação da actividade e os trinta dias contratuais subsequentes servem apenas o propósito de proporcionar o abandono e entrega das instalações.

    A cláusula penal serve para garantir que a entrega se faça até 30 dias após o termo do contrato, não tendo a ver com a continuidade de exploração do posto.

    Termina, dizendo que deve ser negado provimento à providência, por falta de verificação dos pressupostos jurídicos e de facto de que a mesma depende.

    Inquiridas as testemunhas oferecidas, foi proferida decisão, na qual se considerou faltar um dos requisitos cumulativos de que depende o decretamento das providências cautelares não especificadas ( existência de fundado receio de lesão grave e de difícil reparação do direito do requerente), absolvendo-se, em consequência, a Requerida do pedido.

    Inconformada, a Requerente interpôs recurso desta decisão.

    A Requerida, por seu lado, interpôs recurso subordinado.

    A Requerente concluiu as suas alegações pela seguinte forma:

  2. O decretamento de providências cautelares não especificadas depende do verificação cumulativa dos seguintes requisitos: 1) A probabilidade séria da existência do direito por parte do requerente ( ... ); 2) O fundado recaio de que outrem, antes da propositura do competente acção declarativa ou executiva ou na pendência desta cause lesão grave a de difícil reparação ao conteúdo de tal direito ( ...); 3. A adequação da(s) Providências) concretamente requerida(s) à efectividade do direito ameaçado ( ... ); 4. A não adequação à tutela preventiva do direito do requerente de nenhum dos procedimentos cautelares tipificados ( ... ).

  3. O Exmo. Juiz recorrido entendeu que " Da factualidade provada, resulta a probabilidade séria da existência de um direito por parte da requerente, verificado se encontra assim o 1° dos quatro requisitos. E o mesmo se pode dizer dos 3° e 4° requisitos elencados respectivamente, adequação das providências concretamente requeridas à efectividade do direito ameaçado e não adequação à tutela preventiva do direito do requerente de nenhum dos procedimentos cautelares especificamente regulados na lei processual)".

  4. Entendeu, porém o Exmo. Juiz recorrido faltar o 2° dos requisitos cumulativos indispensáveis ao decretamento da providência -- o fundado receio de que outrem, antes da propositura da competente acção declarativa ou executiva ou na pendência desta cause lesão grave a de difícil reparação ao conteúdo de tal direito. Justificando a ausência do dito requisito, diz o Exmo. Juiz recorrido que " no caso vertente, tendo em conta a factualidade dada por provada e dada a índole creditória dos direitos ( à prestação e à indemnização pela não realização da prestação ) de que a Requerente é, aparentemente, titular perante a Requerida, o receio da lesão irreversível dos mesmos só poderia, razoavelmente, advir da eventual precariedade da situação patrimonial da Requerida e/ou da grandiosidade da indemnização por danos emergentes e/ou lucros cessantes que a Requerente delas irá reclamar na acção principal. Nada permite, pois, presumir, que a Requerida não esteja em condições económico-financeiras de, em caso de procedência da acção principal, ressarcir integralmente a Requerente pelos prejuízos patrimoniais ( na modalidade de danos emergentes e lucros cessantes ) entretanto infligidos a esta. Aliás ficou mesmo assente que a Petrogal é a 2° maior empresa de Portugal ".

  5. Ora, e sem cuidar dos argumentos da requerente e da requerida quanto à questão de fundo, o verdadeira questão é a de saber se era lícito ou não para a PETROGAL o recurso à força com o fim de realizar ou assegurar o seu eventual direito ou se lhe não era lícito o recurso à figura da acção directa.

  6. Ao actuar como actuou a PETROGAL furtou-se à discussão do problema em sede própria, ou seja, o Tribunal sentindo-se no direito de, por sua iniciativa e suas próprias mãos, fazer a justiça que lhe convém.

  7. De facto, e tendo em conta o direito da Requerente e o facto da actuação da Requerida se configurar como uma violência, da qual resultou a impossibilidade para a requerente em continuar a fruir o estabelecimento cedido, deveria a providência ter sido decretada tendo em conta que da referida actuação resultou e resulta, desde logo, essa referida impossibilidade de fruição.

  8. E esta impossibilidade de fruição do estabelecimento cedido é, no...

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