Acórdão nº 10021/2005-.8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 23 de Fevereiro de 2006 (caso NULL)
Magistrado Responsável | SÉRGIO GOUVEIA |
Data da Resolução | 23 de Fevereiro de 2006 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Acordam os juízes que integram o tribunal: I - RELATÓRIO.
Banco____ S.A., com sede ________ , em Lisboa, propôs a presente acção declarativa, sob a forma ordinária, contra _____________ e mulher ________________, pedindo: -a condenação do R. a pagar à A. a quantia de Euros 28.431,48, juros de nora vencidos no montante de Euros 2.888,89 e vincendos sobre o capital em lívida, à taxa de 18,36% desde 11/07/02 até integral pagamento, bem como a pagar imposto de selo à taxa de 4%, sendo o calculado até à data no montante de juros 115,56.
Para fundamentar o seu pedido, alega, em síntese, ter celebrado com o R. marido, um contrato de mútuo, no montante de Esc.4.750.000$00, datado de 20/01/0l, a ser pago em 60 prestações mensais, sendo o valor de cada mensalidade de Esc.114.000$00, pela aquisição de um veículo Mercedes Benz, de matrícula ________.
Mais alega que o R. não pagou as prestações vencidas desde a 20 de Dezembro de 2001, vencendo-se então todas.
Alega, ainda, que em caso de mora a taxa de juro seria de 14,36% ao ano.
O R. contestou, alegando que acordou com o Stand em causa que a aquisição do Mercedes Benz ficaria dependente da venda prévia por parte do Stand e um veículo Audi A6, propriedade do R. marido, altura em que o contrato iniciaria os seus efeitos, pelo que foi com surpresa que verificou que lhe estavam a ser descontadas as prestações referentes à aquisição deste veículo.
Mais alegaram que a cópia do contrato que lhes foi enviada se encontrava rasurada no local destinado à assinatura, existindo uma alteração abusiva do conteúdo do contrato.
Alegam, ainda, que o veículo em apreço nunca lhes foi entregue, tendo o R. marido ido por diversas vezes às instalações da A., sendo-lhe sempre assegurado que o veículo lhe seria entregue. Não tendo o veículo sido entregue o R. marido obteve junto da "C. R. Automóvel" informação de que o veículo se encontrava com registo de propriedade a favor de outra pessoa desde 19/03/02.
Por último, referem que tiveram acesso ao processo de concessão de rédito junto do stand e que do mesmo consta um cheque do vendedor a favor da A.., como garantia da entrega dos documentos do veículo à A., bem uma carta do vendedor a explicar as razões do atraso.
Em reconvenção, peticionam a condenação da A. a pagar aos RR. a quantia de Euros 6.018,00 de danos materiais e de Euros 3.000,00 a título de danos morais, por entenderem que o contrato de compra e venda é resolúvel com base na impossibilidade de cumprimento definitiva do contrato de compra e venda, considerando ainda que a validade de um dos contratos depende da validade do outro, razão pela qual se deve considerar também resolvido o contrato de crédito em apreço.
Em resposta, a A. impugna os factos alegados pelos RR. Mais alega que não existe qualquer correspectividade nas prestações em preço, pelo que o R. não pode invocar a excepção de não cumprimento do contrato, não existindo sequer um regime de exclusividade entre a A. e o pretenso vendedor, que permita opor ao A. o não cumprimento ou cumprimento defeituoso do contrato por parte deste.
Admitida a reconvenção e organizado o saneador, procedeu-se a audiência de discussão e julgamento.
Como resulta de fls. 135/145, foi proferida sentença, na qual se decidiu: " Pelo exposto, considero procedente por provada a acção intentada pela A. contra os RR. e, em consequência, condeno os RR. solidariamente a pagar à A. a quantia de Euros 28.431,48, juros de mora vencidos no montante de Euros 2.888,89 e vincendos sobre o capital em dívida, à taxa de 18,36% desde 11/07/02 até integral pagamento, bem como a pagar imposto de selo à taxa de 4%, sendo o calculado até à data no montante de Euros 115,56. Custas da acção pelos RR. (art° 446 do C.P.C.).
" Não se conformando com esta decisão, interpuseram os réus o presente recurso, que foi admitido como apelação, com efeito meramente devolutivo.
Os recorrentes apresentaram as suas alegações, como consta de fls. 194/212.
O banco recorrido apresentou as suas contra-alegações, como consta de fls. 217/235.
Cumpre apreciar e decidir.
II - FUNDAMENTOS.
II.1 - Como resulta do disposto nos artigos 684º, nº3, e 690º, nº1, do CPC, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente, havendo que conhecer e decidir sobre todas as questões nelas colocadas, se relevarem para o conhecimento de tal objecto e, também, as que forem de conhecimento oficioso, exceptuadas aquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras - nº 2 do artº 660º do mesmo diploma.
II.2 - Nas suas alegações, formularam os recorrentes, com interesse para o conhecimento do objecto do recurso, as seguintes CONCLUSÕES: 1) Existe contradição na fundamentação de direito.
2) Ocorreu erro notório na apreciação da matéria de facto.
3) Houve incorrecta aplicação do direito aos factos.
4) Na compra e venda financiada com um crédito concedido apenas para esse efeito coexistem dois contratos distintos, o de crédito e o de compra e venda, sendo o mesmo consumidor parte em ambos.
5) O contrato de crédito destina-se a financiar a aquisição do veículo sendo a razão de ser do contrato de compra e venda.
6) Assim, existe uma coligação de contratos que mantêm uma interdependência funcional e recíproca entre si que determina que as vicissitudes sofridas ou produzidas por um deles produzem os seus efeitos jurídicos sobre o outro.
7) Existe entre eles uma conexão contratual com repercussões no plano jurídico, o que permite que o consumidor possa demandar o mutuante pelo incumprimento do vendedor e opor-lhe os meios de defesa baseados no contrato de compra e venda, no qual o mutuante não é parte.
8) Os contratos de compra e venda e de crédito configuram, nestas situações, funcionalmente, uma unidade incindível, de tal modo que nenhum deles se pretende sem o outro, representando cada um deles a base negocial do outro.
9) A este respeito preceitua o n° 2 do art° 12° do Dec.Lei 359/91 que " o consumidor pode demandar o credor em caso de incumprimento ou de cumprimento defeituoso do contrato de compra e venda por parte do vendedor, desde que não tenha obtido do vendedor a satisfação do seu direito e se verifiquem cumulativamente as seguintes condições: a) Existir entre o credor e o vendedor um acordo prévio por força do qual o crédito é concedido exclusivamente pelo mesmo credor aos clientes do vendedor para aquisição de bens fornecidos por este último; b) Ter o consumidor obtido o crédito...
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