Acórdão nº 8966/2005-6 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Novembro de 2005 (caso None)

Magistrado ResponsávelGRANJA DA FONSECA
Data da Resolução10 de Novembro de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: 1.

Bedivar - Comércio de Calçado, L.

da, intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra (J) e mulher, (M), alegando, em suma, que adquiriu aos réus a fracção autónoma designada pela letra "A", correspondente ao rés-do-chão, destinado a comércio ou indústria, no prédio urbano sito no Rua ..., São João da Talha, Loures, descrita na 2ª Conservatória do Registo Predial de Loures sob o n.º 00512, da Freguesia de São João da Talha.

Em Maio de 2000, apenas dois meses após a entrega efectiva do imóvel, a autora detectou que o mesmo apresentava graves infiltrações de águas.

A dita fracção constitui um rés-do-chão sobre o qual existe um grande terraço, exposto às chuvas que caem especialmente no Inverno.

Assim, após começar a utilizar o imóvel, adquirido para o armazenamento de mercadoria, a autora viu-se confrontada com infiltrações de águas pluviais provenientes do terraço.

A água infiltrava-se pelos cantos formados entre as paredes e o tecto e em diversas zonas da loja de cobertura do armazém (terraço), bem como através da zona de junção das clarabóias existentes no tecto.

A água chegou, inclusivamente, a cair directamente para o chão, através do isolamento das clarabóias, que se revelou absolutamente incapaz de reter as águas.

Por outro lado, o sistema de escoamento das águas pluviais, revelou-se de todo ineficaz para dar vazão à água que se acumulava no já citado terraço.

Na realidade, o sistema existente não conseguia fazer escoar toda a água, que acabava por infiltrar-se nas paredes e tecto do imóvel.

Estas infiltrações provocaram o aparecimento de grandes manchas nas paredes e tecto, pondo inclusivamente em risco a segurança de quem ali entrasse, pois a água acumulava-se junto da instalação eléctrica.

O chão foi também danificado pela água que pingava, insistentemente, provinda do suposto isolamento das clarabóias, pelo que, perante este estado de coisas, foi de todo inevitável a deterioração dos artigos que aí se encontravam armazenados.

Os artigos são entregues à autora acondicionados em caixas de cartão que não os protegem da água e/ou humidades.

As caixas são entregues a autora, que as armazena em prateleiras dentro do armazém, para serem separadas e enviadas para os clientes conforme as respectivas notas de encomenda, razão pela qual existem sempre caixas cheias de artigos dentro do armazém, o qual foi adquirido, com o fim único de lá colocar a mercadoria em stock.

Em Maio de 2000, data em que se começaram a verificar as infiltrações, o imóvel encontrava-se praticamente cheio de mercadoria, que não pôde ser removida pela autora, por não ter local alternativo para o armazenamento.

Assim, e em consequência das infiltrações apontadas, deterioraram-se vários pares de sapatos no valor global de 1.418.436$00, os quais ficaram totalmente destruídos e, portanto, insusceptíveis de serem comercializados.

Se a autora tivesse comercializado tais bens, o seu valor global de revenda teria sido de 1.935.900$00.

No dia 29/05/2000, a autora enviou aos réus uma carta, registada com aviso de recepção em que lhes dava a conhecer as infiltrações então existentes, bem como os prejuízos causados na mercadoria, àquela data, solicitando a estes a realização das obras necessárias à reparação do imóvel e o pagamento de uma indemnização pelos prejuízos sofridos.

Os réus receberam tal carta em 31/05/2000 e não responderam, mantendo-se o estado de coisas acima descrito.

Em 29/01/2001, a autora enviou nova carta aos réus, também registada e com aviso de recepção, insistindo tanto na necessidade de reparação do imóvel, como no pagamento da indemnização dos prejuízos sofridos, uma vez que o Inverno de 2001 se vinha revelando bastante chuvoso, provocando o aumento de intensidade das infiltrações já existentes.

Os réus responderam em 2/02/2001, alegando que venderam o imóvel nos estado em que se encontrava e que as infiltrações eram um assunto da responsabilidade do condomínio.

Perante tal atitude, autora custeou ela própria as obras necessárias, tendo solicitado um orçamento a uma sociedade que efectua trabalhos de construção civil, a HPA - Construções, a qual executou os trabalhos mencionados no dito orçamento, pelos quais a autora pagou a quantia de 13.455.000$00.

No entanto, foi necessária a execução de trabalhos não incluídos no orçamento e que se encontram descritos num novo orçamento, elaborado em Setembro de 2001, os quais se revelaram necessários à medida que se executaram os trabalhos inicialmente previstos, tendo a autora pago, por esses trabalhos a mais, a quantia de 2.158.276$00.

Assim, pelas obras necessárias para suprir os defeitos da fracção adquirida aos réus, que estes se recusaram a reparar, a autora pagou a quantia de 15.613.276$00.

A autora conclui, pedindo que os réus sejam condenados a pagarem-lhe a quantia de € 95.861,52, acrescida de juros de mora sobre a quantia de € 91.698,22, vencidos desde 3/06/2002, até integral pagamento.

Os réus contestaram, começando por arguir, em sede de excepção, a sua ilegitimidade para os termos da presente causa.

Impugnando, alegam os réus que, no início de Fevereiro de 2000, a autora prometeu comprar aos réus e estes vender-lhe, a fracção autónoma acima identificada.

Tal promessa foi realizada depois da autora ter levado a efeito várias visitas à fracção, em diversas ocasiões, durante cerca de um ano, ou seja, no decurso do ano de 1999.

Nessas visitas a autora tirou medidas ao interior da fracção e pôde verificar que havia áreas com infiltrações de águas pluviais, provenientes do terraço do prédio, que serve de cobertura à fracção.

Antes de celebrar o contrato de compra e venda, a autora teve conhecimento, por lhe ter sido mostrado pelos réus, que as águas, vindas do terraço, infiltravam-se pelos cantos formados entre as paredes e o tecto da fracção, em determinadas zonas do imóvel, bem como através da zona de junção das duas clarabóias existentes no tecto.

As águas caíam para o pavimento da fracção, através do isolamento das clarabóias, numa zona muito restrita.

Sempre foi dado a conhecer à autora o estado em que se encontrava o sistema de escoamento das águas pluviais na zona em que passa pelo tecto e paredes interiores da fracção, que evidenciava manchas salitrosas ou provocadas por humidades.

Os réus venderam à autora a fracção no estado em que se encontrava e esta aceitou a compra com as anomalias existentes na fracção.

Os réus nunca prometeram à autora a reparação das anomalias.

Por outro lado, a autora comprou a fracção aos réus dia 13/03/2000, data a partir da qual passou a usá-la e já nessa ocasião as infiltrações de águas eram visíveis, devido às chuvas que ocorreram nos meses de Fevereiro a Março de 2000.

A fracção tem uma área de cerca 1.800 metros2 e um pé direito com 5 metros, área essa que permitia abrigar nas zonas isentas de infiltrações os 212 pares de sapatos referidos na petição inicial.

A referida fracção é coberta em toda a sua extensão pelo terraço mencionado na petição inicial, o qual dá acesso à casa da porteira e à casa de reuniões dos condóminos, ambas instaladas ao nível do 1º andar.

O terraço é utilizado pela porteira, pelos condóminos e seus filhos, utilizando-o estes últimos como espaço de recreio, onde por vezes andam de bicicleta, com o que causam fissuras no revestimento do mesmo.

Os réus concluem pugnando: a) - para que a excepção dilatória consistente na sua ilegitimidade para os termos da presente causa seja julgada procedente, por provada, com a sua consequente absolvição da instância; ou, caso assim se não entenda, b) - para que a acção seja julgada improcedente, por não provada, com a sua consequente absolvição do pedido; c) - para que a autora seja...

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