Acórdão nº 711/2005-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 19 de Outubro de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelSEARA PAIXÃO
Data da Resolução19 de Outubro de 2005
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam na secção social do Tribunal da Relação de Lisboa: (A), intentou a presente acção emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma comum, contra Crédito Predial Português, S.A., incorporado, por fusão com outras sociedades, no actual Banco Santander Totta, S. A., conforme doc. fls. 667 e seguintes, com sede na R. Áurea nº 88, em Lisboa.

Alegou, em resumo, que prestou trabalho subordinado à Ré desde Agosto de 1971 até à data em que se reformou em 1 de Agosto de 2001.

Atingiu a categoria profissional de gerente com vencimento de nível 12 do ACTV.

Tinha direito a isenção de horário de trabalho desde 1 de Janeiro de 1984, porém, o valor que lhe foi liquidado ao longo dos anos foi errado.

A sua remuneração mensal efectiva era constituida por seis componentes: vencimento, diuturnidades, senhas de gasolina (com periodicidade mensal), cartão de crédito para utilização pessoal com plafond anual), telefone, gratificações, prémios especiais e comparticipações nos lucros.

Da conjugação das cláusulas 54ª, 92ª e 98ª do ACTV dos Bancários resulta que o cálculo da isenção de horário de trabalho para duas horas diárias tem o factor de multiplicação 0,4642 e para uma hora de 0,2142, sendo certo que multiplicando o total da remuneração efectiva mensal por esse factor se encontra o valor da retribuição mensal devida a título de isenção de horário de trabalho.

Todavia a Ré para efeitos desse cálculo apenas considerou a remuneração base e diuturnidades sem ter em conta os restantes valores que compunham a sua remuneração em dinheiro ou em espécie de forma regular e periódica.

Nesse sentido apontou parecer da Inspecção Geral do Trabalho.

Em consequência da maneira errónea como calculou os montantes que lhe foi pagando a título de isenção de horário de trabalho a Ré entre 1 de Janeiro de 1990 e 31 de Julho de 2001 ficou a dever-lhe um montante global de 36.597,91 Euros (tal como se pode inferir dos cálculos que efectua nos artigos 117º a 236º da petição inicial).

Em 20 de Junho de 2001, outorgou um acordo com a Ré mediante o qual se veio a reformar antecipadamente.

Porém, as verbas que nele foram estipuladas apenas visaram em última ratio uma compensação pelo prejuízo que sofreu dada a situação de reforma antecipada a que foi submetido. Daí a atribuição de uma verba global pecuniária destinada a compensar tal perda.

Não se verificou qualquer remissão abdicativa, sendo certo que se está perante um verdadeiro contrato de adesão mediante o qual a Ré impôs a sua vontade.

A Ré sempre negociou de má fé violando o disposto no art 227º do Código Civil, bem sabendo que se encontrava num estado de inferioridade pela óbvia dependência que existia. Tal situação é geradora de responsabilidade civil pela denominada "culpa in contrahendo".

O acordo faz referência a uma compensação pecuniária de montante global estabelecendo uma presunção nos termos do nº 4º do art 8º da LCCT. Todavia estamos no âmbito de um contrato atípico que não se pode enquadrar nessa previsão legal.

Todo o acordo é virado para a Reforma e não para uma rescisão.

Seja como for o referido preceito estabelece uma presunção ilídivel, pois de outra forma tal disposição seria absolutamente inconstitucional.

Como trabalhador não tinha liberdade para reclamar todos os seus créditos porque continuava ao serviço da entidade empregadora, sendo certo que em face do circunstancionalismo concreto foi-lhe coarctada a possibilidade de negociar com a consequente violação à tutela do direito ao salário prevista no art 59º da CRP.

Aliás, esse negócio também se encontra afectado de usura uma vez estava em situação de inferioridade e a Ré obteve benefícios excessivos do negócio, sendo certo que tinha consciência disso quando o celebrou.

Desta forma o negócio é anulável ou no mínimo modificável segundo juízos de equidade tendo em conta o disposto no nº 3º do art 13º da LCCT.

Uma vez que desconhecia os direitos que lhe assistiam à data em que celebrou o acordo, dos quais só tomou conhecimento após o parecer da IGT, não podia renunciar a direitos que desconhecia, havendo, pois, que excluir a verificação de uma remissão abdicativa inserida no acordo.

A Ré agiu de má fé, sendo certo que tal conduta gera obrigação de indemnizar por responsabilidade pré contratual.

Verifica-se também uma situação de erro sobre a base do negócio, visto que à data em que o celebrou desconhecia a existência dos créditos relativos à isenção de horário de trabalho que ora peticiona.

É patente que só aceitaria admitir a declaração de remissão constante do nº 3º da clª 4ª do acordo se achasse que não tinha direito a outros créditos salariais.

Não podia dar quitação dum crédito cuja existência desconhecia.

As circunstâncias erradas eram comuns à Ré, (visto que outro entendimento implicaria a sua má fé), sendo certo que o erro em apreço é relevante.

Esta situação gera a anulabilidade do negócio ou a sua modificação segundo juízos de equidade no que concerne ao nº 3º da clª quarta. Finaliza solicitando a procedência da acção e que se declare: A- inconstitucional a interpretação que determina que, sendo a mesma entidade jurídica a tutelar o contrato de trabalho e a reforma, o trabalhador ainda assim possa renunciar, na pendência da relação laboral a créditos salariais no momento em que negoceia as condições da sua reforma por violação dos artigos 59º nº 3º, 63º nºs 1 e 4 da CRP.

B- anulado o negócio por usura, mormente a sua clªs quarta (rectificação solicitada a fls 159 e autorizada a fls 197) ou pelo menos a sua modificação, nos termos do art 283º do Código Civil, segundo juízos de equidade e tendo em conta a fórmula de cálculo prevista no art 13º nº 3º da LCCT por forma a ser a compensação pecuniária atribuida correctamente calculada, a fixar em execução de sentença; C- o nº 3º da cláusula terceira (a referência à clª quarta constituiu manifesto lapso de escrita) seja anulado por erro sobre a base do negócio ou, pelo menos, modificado segundo juízos de equidade, no sentido de se considerar a quitação como apenas respeitante aos créditos efectivamente incluídos no cálculo da compensação pecuniária e não os que ora se peticionam, por destes não ter conhecimento aquando da emissão da declaração negocial em causa.

Mais solicita a condenação da Ré no pagamento: D- de uma indemnização, por culpa in contrahendo, geradora de responsabilidade civil, em montante não inferior a 9.975,96 Euros.

E- de 36.597,91 Euros a título de recálculo da isenção de horário de trabalho acrescidos de juros legais contados, à taxa legal, desde a data da citação até integral e efectivo pagamento.

Ré foi citada e após a realização de uma audiência de partes contestou alegando, em síntese, que (vide fls 104 a 126) no escrito que acordaram a cessação do contrato de trabalho também acordaram o pagamento de uma compensação pecuniária de natureza global. E nos termos do disposto no nº 4º do art 8º do DL nº 64-A/89,de 27 de Fevereiro (RJCCT) na falta de estipulação em contrário entende-se que naquela compensação se mostram incluídos e liquidados todos os créditos já vencidos à data da cessação do contrato exigíveis em virtude dessa cessação.

O mesmo documento contém uma declaração de quitação total e plena que configura uma remissão abdicativa.

Não se verifica qualquer erro sobre a base do negócio visto que o Autor estava perfeitamente consciente de que a sua declaração de quitação abrangia todos e quaisquer créditos emergentes do contrato individual de trabalho e da sua cessação.

O Autor tomou conhecimento claro e inequívoco do montante que lhe era oferecido como contrapartida da quitação total de quaisquer créditos emergentes do contrato de trabalho e aceitou-o sem qualquer pressão.

Os pretensos direitos de crédito do Autor mostram-se prescritos, nos termos do disposto no art 38º da LCT, atenta a data da sua passagem à situação de reforma.

Os valores do cartão de crédito, do cartão Galp Frota, gratificações, prémios especiais ou comparticipações nos lucros e os relativos à viatura automóvel não constituíam remunerações pagas mensalmente.

O Autor sempre recebeu a remuneração adicional pela isenção de horário de trabalho em conformidade com o que se estabelece no ACTV ou seja de acordo com a retribuição mensal efectiva.

Nenhuma das verbas que o Autor menciona podiam entrar no cálculo do complemento remuneratório por isenção de horário de trabalho.

O Autor não invoca quaisquer danos susceptíveis de justificar a indemnização que peticiona a título de "culpa in contrahendo".

Não existe qualquer fundamento quer para a anulação quer para a modificação do acordo que outorgaram.

A proceder a anulação do acordo haveria que extrair as consequências previstas no art 289º do Código Civil (CC), sendo certo que o Autor teria de restituir o montante indemnizatório que recebeu.

Se algum crédito assistisse ao Autor nunca poderia ser alvo da pretendida actualização, e não havendo créditos em dívida não há juros, tanto mais que as importâncias que o Autor pretende não são líquidas.

Finaliza requerendo que se julgue a acção improcedente por não provada com a sua absolvição dos pedidos.

O Autor respondeu nos termos constantes de fls 140 a 160, pugnando pela manutenção do inicialmente peticionado. Alegando, ainda, que não pretende a destruição do acordo por inteiro, mas apenas da cláusula referente à quitação, sendo certo que não pretende por em causa a situação de reforma.

Requereu a redução do pedido formulado em B) (caso não se aceite estar perante um evidente lapso) por não questionar a situação de invalidez.

Realizou-se audiência preliminar.

Elaborou-se despacho saneador que julgou improcedente a arguida excepção de prescrição e relegou-se para momento posterior a apreciação das invocadas excepções da verificação de uma presunção inilidível e de remissão abdicativa (fls.198 a 202).

Fixaram-se a Especificação e a Base Instrutória (fls. 205 a 220) que foram alvo de reclamações, oportunamente, decididas (fls. 266 a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT