Acórdão nº 4991/2004-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 21 de Abril de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelBRUTO DA COSTA
Data da Resolução21 de Abril de 2005
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: I - Relatório.

Na comarca de Lisboa (A) Intentou acção com processo ordinário contra CP, Caminhos de Ferro Portugueses, EP Alegando que no dia 18.12.82, na estação de Santa Apolónia em Lisboa, foi vítima de um acidente ferroviário, descrito infra, do qual resultou a amputação de um braço e de uma mão; depois do acidente e em circunstâncias a apurar o Autor foi metido num avião e transportado para Cabo Verde, sua terra natal, e só em Junho de 2002, quando se deslocou a Lisboa para renovar as próteses, tomou conhecimento de que era titular de um direito a ser indemnizado, o que vem fazer através do presente processo.

Conclui pedindo que a Ré seja condenada a pagar-lhe uma indemnização de 554.619 €.

Citada, a Ré contestou alegando prescrição e impugnando, por os desconhecer, os factos peticionados.

O Autor replicou, mantendo e desenvolvendo quanto havia expendido na douta petição.

Saneado, instruído e julgado o processo, veio a ser proferida douta sentença julgando improcedente a acção.

Ficou provado que: 1- No dia 18/ 12/82, o Autor foi vítima de acidente, na estação de Sta Apolónia em Lisboa.

2- O A., que se encontrava pela primeira vez em Portugal, viajava nesse dia na companhia de um colega ,(P), no comboio que fazia a ligação Porto - Lisboa.

3- O A. que era, à altura, embarcadiço - com a função de cozinheiro num navio mercante, pertencente a uma Companhia Holandesa que havia aportado em Portugal , no porto de Leixões .

4- Quando o comboio, ainda em movimento, entrava na zona da estação/gare de Stª Apolónia, o A. estava de pé, (no interior daquele), junto da porta da carruagem, que se encontrava aberta.

5- Tendo então o A . alcançado a escada exterior da carruagem, caiu desamparado sobre a linha férrea.

6- À época (1982) as composições apresentavam portas, cujo mecanismo de abertura era accionável pelos passageiros, e as composições que realizavam o percurso Lisboa -Porto, tinham afixado junto das portas ,em três linguas, o aviso de " não abrir com o comboio em andamento " .

7- A queda do Autor ocorreu quando ele se encontrava no exterior da carruagem , o comboio encontrava-se dentro da gare, e ainda não estava imobilizado.

8- Em consequência da queda sobre a linha, os membros superiores o Autor foram atingidos pelo rodado da carruagem, imediatamente anterior àquela onde seguia o A .

9 -O Autor foi então levado para o Hospital São José onde foi sujeito a intervenção cirúrgica,.

10- Tendo-lhe sido amputados o membro superior direito e a mão esquerda.

11- Três dias após o acidente, e já consciente, foi o A. transferido para o Hospital Curry Cabral - Serviço de Ortopedia, onde permaneceu um mês e uma semana, tendo-lhe sido retirados os pontos.

12- Após o acidente o Autor ficou psicologicamente afectado, não pretendendo ver ninguém.

13- Tendo então iniciado um moroso processo de reabilitação do membro superior esquerdo.

14- Mais tarde, a 20 de Janeiro de 1983, foi o A. transferido para o Hospital de Arroios, onde se manteve para reabilitação do membro superior esquerdo, e iniciou a reabilitação do membro superior direito.

15- Em 8 de Março de 1983, o A. foi transferido, de novo, para o Hospital Curry Cabral, para o serviço de Medicina Física e de reabilitação, onde prosseguiu a reabilitação.

16- O A. esteve internado desde 18 de Dezembro de 1982 até 4 de Agosto de 1983, no Hospital de Curry Cabral .

17- Durante o período de tratamento submeteu-se o A. a diversas consultas de Próteses no Hospital dos Capuchos, com vista à prescrição das respectivas próteses, bem como à vigilância e adaptação das mesmas.

18- Após o seu internamento o A. continuou o seu tratamento reabilitador em regime ambulatório.

19- 0 A. encontrava-se então pela primeira vez em Portugal .

20- O colega do Autor, que o acompanhava no dia do acidente, viajou no dia seguinte para a Holanda, a fim de procurar novo trabalho num barco.

21 - Enquanto esteve internado em Portugal, na sequência do acidente, o Autor foi transferido entre hospitais, em circunstâncias comuns a casos semelhantes, prendendo-se com as necessidades da respectiva terapia, e determinações médicas.

22- Posteriormente , o A . foi para Cabo Verde, onde tem vivido com a mãe, e a ajuda da família.

23-0 Autor tem a como habilitações a Quarta classe , e desde o acidente que tem vivido em Cabo Verde.

24- Em Julho de 2002, o A. teve necessidade de substituir as próteses que tinha uma vez que as mesmas se encontravam parcialmente destruídas e sem funcionalidade, 25- O A . apenas veio então a Portugal, e foi assistido no Hospital onde tinha sido internado aquando do acidente.

26- O A. à data do acidente era um jovem de vinte anos, gozando de boa saúde e sem qualquer defeito físico .

27- O A. era à data do acidente cozinheiro embarcado, auferindo cerca de 1000 (mil) florins.

28- Em consequência do acidente ficou incapacitado para qualquer tipo de trabalho , vivendo da ajuda de familiares .

29- Em consequência do acidente esteve o A. internado cerca de oito meses, sofrendo dores no momento do acidente e durante o tratamento a que foi sujeito, que permanecerão por toda a sua vida.

Da douta sentença vem interposto pelo Autor o presente recurso de apelação.

Nas suas alegações o apelante formula as seguintes conclusões: I - A sentença ora recorrida, erra ao negar ao Autor, aqui Apelante, uma indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais em consequência do acidente ferroviário de que foi vítima, ocorrido em 18/ 12/ 1982 na Estação de Santa Apolónia, mais precisamente no comboio que fazia a ligação Porto-Lisboa, e que devido a uma manobra inadvertida do maquinista, agravada nas suas consequências pelo facto de a porta que dava acesso ao exterior se encontrar aberta, projectou o ora Apelante para a linha de caminho de ferro, tendo os rodados das carruagens colhido ambos os seus membros superiores.

II - A Ré, aqui Apelada, veio impugnar a versão dos acontecimentos apresentada na PI, alegando desconhecer e não estar obrigada a conhecer tal ocorrência, mas ainda assim foi expondo uma versão relativamente a alguns factos. Não obstante, invocou ainda a prescrição do alegado direito do Apelante.

III - A Sentença, págs. 2 a 6 e fls. 219 a 223 inclusive dos autos, deu como provado a ocorrência do acidente de que o Apelante foi vítima e do qual resultou a amputação do membro superior direito e da mão esquerda; que em consequência do mesmo o Apelante ficou traumatizado e psicologicamente afectado, não pretendendo ver ninguém especialmente não ser visto por ninguém, como será normal em situações semelhantes à ocorrida, sobretudo tratando-se de um jovem de vinte anos que gozava de boa saúde e sem qualquer defeito físico. Acresce que, era a primeira vez que o Apelante se encontrava em Portugal, não conhecendo ninguém, e o colega que o acompanhou na fatídica viagem, teve que regressar no dia seguinte ao do acidente para procurar novo trabalho. O Apelante viu-se assim sozinho num País que desconhecia, sem assistência de qualquer familiar ou amigo, que não dispunha em Portugal.

Ficou ainda provado que, oito meses volvidos após este trágico acontecimento, regressou o Apelante à sua terra natal Cabo Verde, pais onde ainda hoje tudo falta, como é público e notório e onde os cuidados de saúde são quase inexistentes, não tendo o Apelante possibilidade de conhecer quais aos seus direitos. Uma vez em Cabo Verde, o Apelante aí permaneceu durante dezassete anos e quatro meses regressando a Portugal no final de 2000, movido fundamentalmente pelo interesse de substituir as próteses uma vez que de há muito estas tinham deixado de cumprir a sua função. E foi só em Portugal e .no Hospital ode tinha sido tratado dezoito anos atrás, que médicos e enfermeiros, após verificarem o processo clínico do Apelante o informaram do direito que por certo teria direito a uma indemnização pelo acidente de que foi vítima, algo que o Apelante desconhecia por completo e não tinha forma de conhecer.

IV - Ao invocar, como fez, a Apelada a excepção da prescrição, nada fez no sentido de provar, como lhe competia nos termos do Artigo 343.° n.° 2 do Código Civil, a partir de que data o lesado, aqui Apelante, tomou conhecimento dos pressupostos da indemnização e da sua existência. A Apelada não conseguiu provar que o prazo já tinha decorrido, nem poderia fazê-lo pois até para a própria se torna evidente que o Apelante não tinha como conhecer antes o direito que lhe assistia e assiste a ser indemnizado por tudo o que sofreu em consequência deste acidente V - A Jurisprudência é clara no sentido de que o decurso do prazo de prescrição só se inicia no momento em que lesado tem conhecimento do direito que lhe compete. Assim, o início da...

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