Acórdão nº 4021/2006-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 01 de Junho de 2006

Magistrado ResponsávelGRANJA DA FONSECA
Data da Resolução01 de Junho de 2006
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: 1.

G… e C… intentaram a presente acção declarativa de condenação, sob a forma ordinária, contra P…, pedindo a condenação do Réu a devolver-lhes o montante de € 15.000, entregues por estes no âmbito de um contrato de promessa de compra e venda celebrado entre as partes, em virtude da nulidade de tal contrato, acrescido de juros de mora, vencidos à taxa legal de 7% desde 18/02/2002 até 01/11/2002, no valor de € 733,56 e os vincendos até efectivo e integral pagamento; ou a condenação dos Réus à restituição do montante supra aludido, pela violação da condição prévia acordada entre as partes, acrescida de uma indemnização a liquidar em execução de sentença; ou, ainda, a condenação do Réu a restituir a quantia recebida por força da impossibilidade objectiva na celebração do contrato, em virtude de imponderáveis circunstâncias exteriores à vontade dos Autores, acrescida dos respectivos juros, nos termos aludidos; e a condenação do Réu em todos os encargos legais.

Para fundamentar a sua pretensão, alegaram, em síntese, que, no dia 9/02/2002, assinaram um documento que prometia vender um imóvel sito no Largo Barão do Linhó, nº 39, no Linhó, Sintra e, com a assinatura, pagaram a quantia de € 15.000, estabelecendo, como condição prévia para a assinatura do presente documento, que a aquisição do imóvel ficaria dependente da aprovação, por parte da instituição financeira, do crédito a conceder aos Autores. Em seguida, referem que, passados alguns dias, a Autora foi dispensada do serviço de Assistente de Bordo na empresa Continental Airlines e, no mesmo espaço de tempo, após apreciação das condições e encargos dos Autores, não foi, pela instituição financeira, aprovada a concessão do referido crédito, comprometendo a possibilidade de adquirem o respectivo imóvel. Os Autores alegaram, depois, que, em virtude das circunstâncias ocorridas e tal como tinha ficado acordado, dirigiram-se ao Réu e, explicando-lhe o sucedido e a impossibilidade de comprarem a moradia, solicitaram a devolução da quantia entregue, tendo o Réu retorquido que, assim que vendesse a casa a terceiros, lhes devolveria o dinheiro. Porém, segundo os Autores, em Maio de 2002, o Réu alterou a sua posição e decidiu apropriar-se definitivamente da quantia entregue pelos Autores, violando o acordo efectuado. Os Autores invocaram também que o Réu, pessoa avisada, conhecedora e experiente no ramo imobiliário, propôs e os Autores acederam. após forte pressão e por clara ignorância, a assinatura e consequentemente celebração do contrato de promessa sem o cumprimento dos requisitos legais para o efeito, nomeadamente o necessário reconhecimento presencial das assinaturas dos contratantes e a obrigatória certificação notarial da existência da licença respectiva de utilização ou e construção, o que determina a nulidade do contrato celebrado e a restituição do montante entregue ao Réu. Por fim, entendem os Autores que, de todo o modo, perante o despedimento da Autora e em virtude do indeferimento na concessão do crédito por parte da instituição financeira, é evidente e clara a impossibilidade objectiva dos Autores, tendo estes, também por esta via, o direito de exigir a restituição da prestação realizada.

O Réu contestou, admitindo a celebração do contrato de promessa de compra e venda invocado pelos Autores e o recebimento do sinal, impugna a restante matéria de facto alegada na petição inicial. O Réu sustenta que o contrato nunca ficou dependente da concessão de qualquer financiamento nem tal foi invocado pelos Autores nos preliminares da negociação e no seu curso. Deste modo, o contraente, a favor de quem foi constituído o sinal, tem o direito de o fazer seu, perante o incumprimento do outro contraente. O Réu nega, em seguida, ter informado os Autores que assim que vendesse o referido imóvel a terceiros lhes devolveria a quantia prestada a título de sinal. Depois, relativamente à nulidade invocada por parte dos Autores, entende o Réu que a sua invocação constitui abuso de direito uma vez que, no momento da celebração do referido contrato - promessa, as partes acordaram que não seria necessário proceder a mais formalidades do que simples assinatura do mesmo, razão pela qual as formalidades referidas pelos Autores foram omitidas por culpa de ambas as partes. Segundo o Réu, é os Autores apenas que invocam tal vício por ser a única maneira de recuperarem a quantia que o Réu legitimamente recebeu a titulo de sinal e, tendo em conta as circunstâncias desta relação contratual, extravasam o fim subjacente a norma que consagra a nulidade como consequência da falta de observância das formalidades aí descritas (combate à construção clandestina quando o imóvel em causa já está construído e com licença de utilização). Prossegue o Réu, referindo que, mesmo que se considere que não há abuso de direito, a nulidade nunca poderia ditar a devolução da quantia prestada a título de sinal, por tal ser contrário à própria natureza deste instituto. Por fim, no que se refere à resolução do contrato por incumprimento por parte do Réu, este afirma que foram os Autores quem o não cumpriu por razões que não dizem respeito ao Réu.

O Réu deduziu ainda reconvenção, pedindo que, no caso da pretensão dos Autores proceder e se ordenar a devolução da quantia de € 15.000 acrescida de juros até efectivo pagamento, sejam os Autores condenados a pagar ao Réu quantia não inferior a € 5.995,58 a título de juros, acrescida de € 125.000,00 correspondentes ao prejuízo do Réu decorrente da diferença entre o preço acordado com os Autores para a venda daquele imóvel e o valor pelo qual se vai vender o mesmo. Para o efeito, alegou que, após a celebração do contrato de promessa com os Autores, o Réu nunca encetou negociações com terceiros, tendo em vista a transmissão deste imóvel, durante o prazo acordado para a celebração do contrato prometido. Sustenta também que, ao outorgar o contrato - promessa, que define com precisão os termos do contrato prometido, criou uma expectativa legítima de que tal negócio se iria realizar. Sucede que, passados os noventa dias da data de celebração do referido contrato, os Autores não cumpriram com o acordado, recusando-se a celebrar o contrato prometido, tendo o Réu deixado de usufruir da quantia de € 335.000,00, que deveria ter sido paga até ao dia 9 de Maio de 2002. Afirma o Réu que, tendo em conta a taxa de juro de 3,5% aplicável a uma aplicação financeira normal, sofreu um prejuízo de € 5.995,58, desde o referido dia 9 de Maio de 2002 até à data da apresentação da contestação. Por outro lado, devido à celebração do acordo com os Autores, retirou o referido imóvel de mercado, desde o momento da conclusão das negociações com os Autores até à data do incumprimento definitivo dos mesmos, altura em que procedeu a uma nova prospecção de mercado e teve de iniciar todo um novo processo negocial, tendo conseguido, como melhor proposta para a compra do referido imóvel, o valor de € 225.000.

O Réu termina, pedindo que a acção seja julgada improcedente e, em consequência, o Réu absolvido do pedido, com as legais consequências, e que, se a acção for julgada procedente, seja julgada procedente e provada a reconvenção e, por via dela, sejam os reconvindos condenados a pagar à reconvinte o montante de € 130.995,58, acrescido de juros à taxa legal, desde a notificação da reconvenção, até ao efectivo pagamento.

Os Autores replicaram, reiterando os factos já alegados na petição inicial, acrescentando que não foi entregue aos Autores qualquer documentação ou dado sequer a verificar da conformidade legal do imóvel, nomeadamente, licença de utilização e caderneta predial. Contestam a existência de abuso de direito na invocação da nulidade do contrato e o acordo quanto à desnecessidade do cumprimento das formalidades legais omitidas. Afirmam que, não lhes sendo imputáveis as circunstâncias que impossibilitaram o cumprimento do contrato, também não poderá funcionar o disposto no art.º 442º CC quanto a perca do sinal. Relativamente à reconvenção, referem os Autores que, passados 9 dias, foi o Réu alertado e informado pelos Autores que estes não poderiam cumprir com o acordado e nessa mesma data foi-lhes comunicado pelo Réu que iria, desde logo, pôr à venda o citado imóvel, prontificando-se os Autores a pagar eventuais prejuízos que o Réu tivesse tido com tal evento. Afirmam, seguidamente, que o Réu não concretizou tais prejuízos, não sendo suficiente opinar e descrever sobre eventuais especulações financeiras, estranhando ainda que, passados apenas cinco meses sobre a colocação do imóvel no mercado, este tenha desvalorizado € 125.000. De todo o modo, sustentam não haver da sua parte culpa ou negligência nos preliminares ou na formação do contrato e terem agido com boa fé ao informarem, imediatamente, da impossibilidade do cumprimento do acordado, nada tendo contribuído para tal facto. Concluem como na petição inicial, pedindo ainda a improcedência do pedido reconvencional e das excepções deduzidas.

O pedido reconvencional foi admitido liminarmente e foi proferido despacho saneador, procedendo-se, depois, à organização da matéria de facto relevante para a decisão da causa, delimitando-se, entre os factos que revestem interesse para a apreciação do mérito da acção, aqueles que, então, já se encontravam assentes daqueles que se mantinham controvertidos.

Realizou-se audiência de discussão e julgamento, proferindo-se decisão sobre a matéria de facto (cfr. fls. 11/112) e seguidamente a sentença, tendo-se julgado a acção procedente e a reconvenção improcedente e, em consequência, decidiu-se: a) - Condenar o Réu a devolver aos Autores o montante de € 15.000 (quinze mil euros), acrescido de juros de mora contados desde a citação do Réu até integral pagamento, à taxa anual de 7% até 1/05/2003 e à taxa anual de 4% a partir desta data; b) - Absolver os Autores do pedido reconvencional (no montante de € 130.995,58, acrescido de juros à taxa legal, desde a...

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