Acórdão nº 0045772 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 26 de Março de 1998 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelPESSOA DOS SANTOS
Data da Resolução26 de Março de 1998
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: 1. S. P. A.- Sociedade Portuguesa de Autores, cooperativa de responsabilidade limitada, em nome, e representação, de autores e titulares de direitos de autor, (Y), (X), Ediciones Clipper's, EMI, Valentim de Carvalho, Música Lda, esta como titular dos direitos de autor de (A), que também usa (A), e (B), que também usa (B), intentou a presente acção com processo ordinário, que correu seus termos pela 2. secção do 2. Juízo do Tribunal Cível da comarca de Lisboa, contra Tournée - Promoção de Espectáculos e Representações, Lda, alegando, em síntese, que no dia 20 de Julho de 1991 a ré promoveu um espectáculo, efectuado no estádio José de Alvalade, com os artistas (Y) e (A), onde foram executadas diversas obras de autores representados pela autora, sem que, para a realização desse espectáculo, a ré tivesse obtido a necessária autorização prévia, que só poderia ter sido dada pelos autores, ou pelos titulares de direitos de autor das obras ali executadas ou pela autora, na sua qualidade de legal, e estatutária, representante daqueles. E como a autora, à data daquele concerto e nas circunstâncias do mesmo, fixava para tal autorização o coeficiente de 3,5% da receita total do espectáculo, líquida de imposto sobre o valor acrescentado, facturou à ré em 24/07/1991 a importância de 7615755 escudos respeitante àquele espectáculo. Porém, a ré liquidou aquela quantia, mas em 26/07/91 procedeu ao depósito judicial da importância de 7034500 escudos referente ao dito espectáculo, através do processo n. 6684/91 da 3. secção do 6. Juízo do Tribunal Cível da comarca de Lisboa. Com estes fundamentos conclui pedindo que a ré seja condenada a pagar-lhe a quantia de 7615755 escudos, acrescida de 2879381 escudos de juros vencidos e nos juros vincendos, e ainda que a importância depositada seja considerada pagamento por conta da dívida e ordenada a emissão de precatório-cheque para se proceder ao seu levantamento. Citada a ré de forma válida e regular, contestou atempadamente, deduzindo a excepção dilatória de ilegitimidade da autora, porquanto não é representante de (Y) e (A), nem de (X), pelo que deve ser considerada parte ilegítima, pugnando em conformidade pela sua absolvição da instância. Mais alega, não ser devida qualquer quantia à autora por esta não ter feito prova do registo da representação dos autores e sociedades que menciona, mas que, de qualquer modo, não pode ser responsabilidade por juros para além dos correspondentes ao diferencial entre a quantia que depositou por imposição da Direcção-Geral dos Espectáculos e das Artes e aqueloutra ora peticionada, e que não era necessária qualquer autorização prévia pois os autores em questão - (Y) e (A) - foram também intérpretes e executaram as suas próprias obras. Impugna ainda o valor da receita total e líquida do espectáculo, que diz ter sido de 141428570 escudos, pelo que a aludida percentagem de 3,5% originária somente uma contraprestação de 4950000 escudos. A final sustenta que a quantia que depositou judicialmente se reporta ao concerto supra referido e ao que ia ser dado pelos grupos (D) e (E), e como preliminar da acção que pretendia intentar contra a autora. Finaliza, pugnando pela improcedência da acção e pelo indeferimento da consideração daquele depósito como pagamento por conta da dívida e do seu levantamento. Replicou a autora sustentando que é representante de (Y), (X), Ediciones Clipper's, EMI, Valentim de Carvalho, Música Lda, e bem assim de (H) e (C) cujas obras "I Know that I Know" e "Dogs in the Wine Shop", também ali foram executadas, ou seja os titulares dos direitos de autor de todas as obras executadas no mencionado concerto. Conclui, em conformidade, pela improcedência da arguida excepção e requerendo a condenação de ré como litigante de má fé, em multa e indemnização não inferior a 500000 escudos. Indeferida a apensação à acção daquele processo n. 6684/91, e após audiência preparatória, na qual se gorou a conciliação das partes, foi proferido despacho saneador no qual, além das menções tabelares, se conheceu ex professo a arguida excepção de ilegitimidade da autora, que foi julgada improcedente. Com a elaboração da especificação e questionário, que se fixaram sob reclamação atendida, da autora, prosseguiu a acção a sua normal tramitação, vindo, a final, a efectuar-se a audiência de discussão e julgamento e a ser proferida sentença na qual a Meritíssima Juiz julgou a acção parcialmente procedente, tendo condenado a ré a pagar à autora a quantia de 4787046 escudos acrescida de juros, contados desde 24/07/91 e até efectivo pagamento, às taxas de 15% até 29/09/95 e de 10% desde 30/09/95. 2. Inconformadas com esta decisão, autora e ré interpuseram os pertinentes recursos de apelação. 2.1. Antes dos autos subirem a este tribunal, a ré fez juntar um parecer da autoria do Senhor Professor Doutor José de Oliveira Ascensão que formula as seguintes conclusões: 1 - O presente litígio é paradigmático da desairosa situação que nos envolve, que podemos caracterizar como a do direito de autor sem autor. 2 - O próprio autor executa as suas criações - e vem-se alegar que falta a autorização do autor! O Litígio - Como Foi Colocado 3 - No presente litígio, discute-se uma pura representação no negócio jurídico, e não uma representação de interesses difusos. 4 - O mandato outorgado à entidade de gestão colectiva prova-se exclusivamente através de certidão emanada do registo. 5 - Não há presunção de representação baseada no facto de o consentimento do autor não se presumir, pois não se confunde a prova da autorização com a prova da representação. 6 - Do mesmo modo, só à falta de prova da autorização respeitam quaisquer consequências que se queiram retirar da falta de afixação do programa. 7 - A SPA não actua em representação geral-institucional da categoria, mas pleitando efeitos concretos para autores determinados, portanto como representante negocial destes. 8 - A validade da autorização, quer do autor exclusivo quer do co-autor, não é em nada atingida pela eventualidade de este se integrar num agrupamento que contratou a execução pública. 9 - A afixação prévia do programa é reclamada por lei "na medida do possível", isso nunca acontece nos concertos de música ligeira. 10 - Da falta lícita de afixação não podem assim derivar consequências negativas. 11 - É deslocado invocar prejuízo do autor se a SPA não intervier, quando é o próprio autor quem contrata com os utentes os termos que lhe convêm. 12 - Um espectáculo público não está condicionado ao pagamento prévio dos direitos de autor, por lei expressa, mas sim à autorização do autor. 13 - O visto não deveria assim ser condicionado, nem a esse pagamento, nem ao seu depósito prévio. 14 - A autorização prévia do autor, no domínio da execução musical em que a representação é na prática forçosa, é uma ficção, pois a SPA autoriza nos seus contratos globalmente a utilização de qualquer obra da sua carteira. 15 - Como entidade monopolística, a SPA é obrigada a fazê-lo em condições equitativas e não discriminatórias. 16 - A autorização prévia não pode por natureza verificar-se quando não forem conhecidas as obras a executar. 17 - É ao utente que cabe demonstrar que possui autorização (escrita) para a utilização da obra. 18 - No presente caso, são exibidos contratos escritos: o problema não é de prova ou de forma, é de interpretações desses contratos. 19 - São admissíveis autorizações tácitas, quando resultam de comportamentos que não tenham a finalidade de exprimir essa vontade; e autorizações implícitas, quando pertençam ao conteúdo não expresso duma declaração. 20 - Quando o autor contrata a realização dum espectáculo e o desempenha, está necessariamente autorizando a utilização da obra. 21 - É logicamente impossível pretender que o autor que executa uma obra não autoriza a execução. 22 - À luz da boa fé, o autor que contrata um espectáculo nunca poderia opor-se ao seu desempenho. 23 - Isto significa que, no próprio terreno em que foi colocada, a pretensão da SPA não pode proceder. II A Colocação Verdadeira Do Problema 24 - Porém, o carácter óbvio das conclusões adverte- -nos para um erro maior, no que respeita à própria colocação do problema. 25 - Tudo equivale a dizer que o autor, quando utiliza a obra, tem a autorização do autor. 26 - Mas o autor não precisa da autorização de ninguém para utilizar a sua própria obra. 27 - O autor tem o direito de fazer ou autorizar (art. 68/2 b CDADC); toda a problemática da autorização só se coloca quando não é o próprio autor quem utiliza a obra. 28 - Só não seria assim se tivesse concedido um direito que o excluísse do exercício ou se o recurso à gestão colectiva o impedisse de actuar. 29 - Nenhuma transmissão se presume; só será admitida se for provado um acto com esse sentido que satisfaça os requisitos legais. 30 - Por outro lado, o recurso à gestão colectiva cria uma relação de representação verdadeira e própria. 31 - Esta representação é uma representação no interesse do autor, representado. 32 - O interesse pecuniário da entidade de gestão colectiva não faz com que a representação seja também no interesse do representado. 33 - Não seria admissível em Portugal a figura da cessão fiduciária, pela qual o autor que recorresse à gestão colectiva teria de ceder o seu direito, fiduciariamente embora, à entidade de gestão. 34 - Porque é uma representação como qualquer outra, o autor que recorre à gestão colectiva mantém o direito de autorizar a utilização da obra. 35 - Aliás, ainda que houvesse interdição lícita de o fazer, a autorização que concedesse era válida, e as consequências só se fariam sentir na relação com a entidade de gestão colectiva. 36 - Mas o que o autor em qualquer caso nunca poderia perder seria o direito de, ele próprio, utilizar directamente a obra como entendesse. 37 - A entidade de gestão colectiva autoriza terceiros: não ganha o poder de autorizar o próprio autor! 38 - Ainda que houvesse cláusula que o excluísse...

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