Acórdão nº 2564/08.1TBCB.A.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Novembro de 2010

Magistrado ResponsávelJOÃO BERNARDO
Data da Resolução04 de Novembro de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA Sumário : 1. Relativamente ao mesmo sinistrado e ressalvados os casos de indemnização sob a forma de renda, o prazo prescricional da seguradora para exercer o direito de regresso relativamente a indemnização que pagou, faseadamente, no âmbito do seguro obrigatório automóvel, começa a contar-se da data em que foi efectuado o último pagamento.

2 . Este prazo é de três anos, não valendo, quanto a ele, o alongamento previsto no n.º3 do artigo 498.º do Código Civil.

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I - A Companhia de Seguros AA, SA instaurou, no Tribunal Judicial de Alcobaça, contra: BB; A presente acção declarativa de condenação, em processo ordinário.

Alegou, em síntese, que: No dia 15.01.2003, pelas 20H15, na Rua …da localidade da …, Alcobaça, ocorreu um acidente de viação em que foram intervenientes os veículos automóveis …-LC, conduzido pelo réu e XZ-….

Do acidente, resultaram lesões graves para CC que, na altura, procedia a descarga deste último veículo, o qual estava devidamente estacionado e sinalizado; A responsabilidade do acidente coube por inteiro ao réu, não só por conduzir com uma taxa de álcool no sangue de 0,66 g/l, que lhe diminuiu as capacidades de atenção e de concentração, mas, também, por, por imperícia e desatenção, não ter dominado o veículo que conduzia; Na sequência de acordo amigável com o referido lesado, efectuou pagamentos parciais de importâncias devidas em consequência do sinistro no montante global de €145.146,99 a cuja restituição o Réu deve ser condenado, conforme o disposto no artigo 19.º do Decreto-lei n.º 522/85, de 31 de Dezembro.

Pediu, em conformidade: A condenação dele no pagamento da quantia global de €145.146,99, acrescida de juros de mora à taxa legal, contados da citação.

O réu contestou.

Invocou, na parte que agora importa, a prescrição do direito que a demandante pretende fazer valer.

Respondeu a autora à matéria da excepção, argumentando que: Integrando a conduta do réu crime com prazo de prescrição de cinco anos, beneficia desse prazo nos termos do n° 3 do art.° 498°, do Cód. Civil; Independentemente do alargamento do prazo, este só começou a contar a partir do último pagamento efectuado ao lesado (ocorrido em 25.11.05), dado tratar-se de pagamento unitário.

Improcede, por isso, a excepção.

II - No despacho saneador, a Sr.ª Juíza julgou parcialmente verificada a excepção de prescrição do direito da autora, absolvendo o Réu do pedido referente ao montante de €75.146,99, correspondente a todos os pagamentos efectuados até 25.11.2005.

Entendeu, em resumo, que: O “dies a quo” da contagem do prazo de prescrição correspondia à data de cada um dos pagamentos que a ré efectuou; Não era aplicável às acções de regresso o alongamento do prazo consignado no artigo 498.º do Código Civil, pelo que valia o prazo de três anos; Tendo como referência a data correspondente ao dia em que deveria ter sido citado o réu (26.11.2008), julgou a excepção procedente quanto aos montantes cujo pagamento ocorrera mais de três anos antes e improcedente quanto aos outros.

II.

Inconformados, A. e R. interpuseram recurso dessa decisão. Pretendeu ela decisão de não prescrição relativamente a todas as quantias despendidas e ele decisão antagónica.

O Tribunal da Relação de Coimbra decidiu nos seguintes termos: “

  1. Julgam improcedente a Apelação da Autora, confirmando-se nessa parte a decisão recorrida.

  2. Julgam, parcialmente, procedente a apelação do Réu e, revogando aquela mesma decisão na parte em que não julgou prescrito o crédito da indemnização dos danos patrimoniais e não patrimoniais alegado no art.º 39º da petição, ordenam ampliação da base instrutória por forma a quesitar-se quer a data de pagamento alegada na acção (13.12.05) quer a alegada na excepção (25.11.2005) daquele mesmo crédito.” Aceitou o Tribunal da Relação a construção jurídica levada a cabo na 1.ª instância, de contar o início da prescrição faseadamente, relativamente a cada pagamento e de considerar o prazo de três anos (não em absoluto para as acções de regresso, mas porque o procedimento criminal correspondente ao crime invocado dependia de queixa e não demonstrou a autora que esta tivesse sido apresentada).

Mas entendeu que não podia dar-se como assente a data do pagamento que escapara à prescrição, porquanto a ré sustenta a de 25.11.2005 e a autora a de 13.12.2005 e daí a necessidade de ampliação da matéria de facto.

Este aresto teve um voto de vencido, com o entendimento de que o prazo a considerar deveria ser o de cinco anos, irrelevando a questão da apresentação da queixa.

III – Pede revista a autora.

Conclui as alegações do seguinte modo:

  1. As questões a analisar no presente Recurso consistem em averiguar: Se ocorreu a prescrição do direito de regresso da Recorrente, sendo aquela determinada em função desde logo do momento a partir do qual se conta o seu início; Qual o prazo a aplicar à referida prescrição, e se para o efeito deve atender-se à circunstância de ser determinante ou não a extinção do procedimento criminal ou a existência ou não de queixa.

  2. Quanto à questão do prazo em si, e na vertente da necessidade de ter existido queixa e consequente procedimento criminal, o douto Acórdão refere que, se tivesse que optar entre duas posições jurisprudenciais divergentes em aplicar ou não o n.º 3 do art.° 498.º do CC, optaria pela inaplicabilidade daquele preceito ao direito de regresso. E ainda que "Só que nunca a Recorrente aludiu a qualquer procedimento criminal incidente sobre tais factos nem tão pouco alegou que alguma vez tenham sido objecto de queixa, absolutamente necessária ao procedimento criminal, face à exigência do n.º 4 do citado artigo 148.º do CP.".

  3. A diversidade de Jurisprudência quanto àqueles aspecto é de tal modo vincada que no Douto Acórdão, agora posto em crise, foi proferido voto de vencido do Venerando Desembargador, Doutor Manuel Artur Dias, relativamente à improcedência da apelação da Autora, por duas ordens de razões: O alargamento do prazo de prescrição previsto no n.º 3 do artigo 498.º do CC é aplicável ao direito de regresso, e a eventual extinção, pelo seu não exercício, do direito de queixa relativamente ao crime que o facto ilícito integre é indiferente ao aproveitamento do questionado prolongamento do prazo de prescrição (Ac. do STJ de 22/02/1994; Ac. STJ de 13/10/1998; Ac. STJ de 15/03/2003 e Ac. STJ de 02/12/2004).

  4. Segundo a orientação jurisprudencial seguida nomeadamente nos Acórdãos do STJ, de 22/02/94, de 28/03/96, de 20/02/2001 e 18/11/99, RP de 20/05/97 e RE de 17/12/99, " a extinção do direito de queixa pelo seu não exercício é indiferente ao aproveitamento do prazo mais longo previsto no n.º 3 do art. 498.º, pois o que determina tal alargamento é a gravidade do facto e do dano, a especial qualidade do ilícito" - cfr. Ac. STJ de 13/05/2003 in www.dgsi.pt.

  5. Por um lado, o elemento literal do n.º 3, do art. 498.º do C.C. só se refere à prescrição do procedimento criminal, prevista nos art. 118.º e seguintes do C.P. e não à extinção do direito de queixa pelo decurso do prazo de 6 meses, para além de que se não alude ao efectivo exercício da acção penal para apuramento dos factos. Ou seja, o alargamento do prazo depende apenas de o facto ilícito constituir crime.

  6. Em termos Doutrinais pesa a favor da tese ora defendida a posição do Prof. Antunes Varela que discorrendo sobre a ratio legis daquele artigo, defende que " ... segundo a qual o dito alongamento do prazo não assenta numa circunstância de carácter puramente objectivo - isto é, já que pode apreciar-se o facto ilícito...

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