Acórdão nº 01A2110 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Julho de 2001 (caso NULL)
Magistrado Responsável | TORRES PAULO |
Data da Resolução | 05 de Julho de 2001 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:1- "A" e marido B, como proprietários do rés-do-chão, que identificam, inscrito a seu favor, em 16-11-98, accionaram C e mulher D, que o ocupam sem seu consentimento e autorização, atinente a obter a condenação destes a reconhecerem aquele direito de propriedade e a restituírem-lhes o prédio livre e desocupado. Os RR. contestaram, com utilidade actual, por excepção, alegando serem arrendatários do rés-do-chão em apreço, desde 1993 e terem outorgado, em 1995, com os proprietários, contrato promessa de compra e venda do imóvel, com tradição de coisa. No saneador julgou-se procedente a invocada excepção peremptória, consubstanciada na existência de um válido contrato de arrendamento. Em apelação o douto Ac. da Relação de Lisboa - fls. 190 a 199 - confirmou o decidido. Daí a presente revista. 2- Os AA. recorrentes, nas conclusões das suas alegações, afirmam, em resumo: a) O invocado arrendamento é nulo - n. 2 art. 1024 CC - norma de carácter imperativo, por na altura da sua celebração o prédio estar indiviso e o procurador de um dos comproprietários não ter poderes para dar de arrendamento o rés-do-chão em causa. b) Mesmo que aquele contrato vinculasse os AA. verificou-se, tacitamente, a revogação do acordado em face de posterior contrato promessa de compra e venda do andar e de cessação de pagamento de rendas. c) Não tendo a A. qualquer intervenção em tal contrato promessa, nem se demonstrando qualquer comportamento ou conduta anterior da A., que houvesse criado nos RR. a confiança de que aquela jamais invocaria essa falta de intervenção ou a falta da sua ratificação, não se verifica a situação de abuso de direito - art. 334 CC - por venire contra factum proprium, como erradamente se decidiu. Em contra alegação os RR. pugnaram pela bondade da decisão recorrida. 3- Colhidos os vistos, cumpre decidir. 4- Nos termos do nº5 artº 713, ex vi art 726, ambos do C.P.C. remete-se para o douto Ac. recorrido a matéria de facto nele inserta. Ou seja, nuclear e resumidamente: a) O rés-do-chão em questão está inscrito a favor da A. desde 16-11-98. b) Por contrato escrito, de 15-11-93, estando o rés-do-chão indiviso, ele foi dado de arrendamento aos RR. c) Na qualidade de senhorios apareceram quatro procuradores que actuaram em nome dos vários comproprietários. d) O procurador dos consortes E e mulher só tinha poderes, datados de 7-12-93, para vender e não para arrendar o rés-do-chão. e) E aqueles não deram o seu assentimento à celebração do contrato de arrendamento. f) A A. deu poderes, em 14-2-92, ao seu procurador para celebrar contrato de arrendamento em análise, bem como vender suas propriedades. g) Em 19-9-95, três pessoas, invocando a qualidade de gestores de negócios dos comproprietários, que identificaram, declararam prometer vender ao R. o rés-do-chão, tendo recebido sinal, clausulando-se que o promitente comprador poderia entrar imediatamente na posse do prédio. h) A A. não deu poderes ao seu procurador para a celebração por este daquele contrato promessa de compra e venda. i) A A. não ratificou a gestão. 5- Os problemas a resolver são dois: a) Qual o vício, o valor negativo, que afecta o invocado contrato de arrendamento. b) Se o comportamento da A. encerra em si um abuso de direito, sob o tipo de venire contra factum proprium. 6- Quanto ao primeiro problema há que surpreender o quadro dogmático, onde ele se espelha. Assim diremos, em resumo, que dentro do quadro dos valores negativos do negócio temos a ineficácia em sentido amplo e a irregularidade. A irregularidade acarreta a aplicação de uma sanção ao negócio pleno de eficácia de efeitos, mas que está viciado por alguma desconformidade. Se o vício - desconformidade entre o negócio em concreto e a norma - afecta a produção de plenitude dos efeitos, que lhe deviam corresponder, surpreendida fica a ineficácia em sentido amplo. Esta abarca duas espécies: invalidade e ineficácia do sentido restrito. Ela compreende, assim, todas as hipóteses em que, por causas intrínsecas ou extrínsecas, o negócio não deve produzir os efeitos que deveria, sendo a invalidade apenas a ineficácia que provém de uma falta ou irregularidade dos elementos internos - essenciais, formativos - do negócio. A mera ineficácia autonomiza-se por a inviabilidade de produção dos efeitos não ter na sua origem factos que determinem a imperfeita génese do negócio, mas eventos supervenientes: a impossibilidade absoluta da prestação, a alteração das circunstâncias que constituem a base do negócio, a não verificação de condição suspensiva, a verificação...
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