Acórdão nº 01A3241 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 24 de Janeiro de 2002 (caso NULL)

Data24 Janeiro 2002
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: A, B, C, D e E, todos residentes no Cadaval, requereram, pelo Tribunal Judicial daquela Comarca, providência cautelar não especificada contra "F", sociedade anónima, igualmente com sede no Cadaval, pedindo seja decretado que a requerida se abstenha de proceder na área geográfica da Quinta X, localizada na confluência dos concelhos de Torres Vedras, Cadaval e Alenquer, à execução de actividades ou obras que integrem o objecto do contrato de concessão celebrado entre esta e o Estado Português, e que se tornem necessárias para o processamento, depósito, ou eliminação de resíduos sólidos ou a tal equiparados nos termos da lei, designadamente abate de árvores, execução ou construção de infra-estruturas associadas, tais como as que têm por objecto a deposição ou eliminação daqueles resíduos ou outros, estações de transferência, aterro sanitário, unidades de tratamento; e bem assim que seja considerado o local inidóneo para a eliminação dos resíduos sólidos e instalação do aterro sanitário sólidos, e resultar muito razoável o fundado receio de lesão dos direitos invocados, pois, através da execução da obra, causar-se-á danos dificilmente reparáveis ao direito ambiente e ao direito a um ambiente de vida humana, sadio e ecologicamente equilibrado, de que os requerentes são legítimos titulares; bem como que se declare imediatamente suspensa a deliberação da requerida sobre a alteração da localização do Aterro sobre a Quinta X, por violação do direito de participação procedimental da Lei de Acção Popular e mais elementares critérios de razoabilidade sobre a adequação daquela localização ao tipo de empreendimento.

Alegaram, essencialmente, que a construção do aterro sanitário é lesiva para o ambiente e qualidade de vida das populações, merecedor de tutela jurisdicional resultante do art. 66, nº1 da CRPortuguesa, integrando-se a pretensão dos requerentes no quadro da lesão de interesses difusos, especialmente tutelado pela Lei de Bases.

Citada a requerida opôs-se, alegando, entre outras coisas respeitantes ao mérito, que aqui não importa referir, que os requerentes propuseram três providências cautelares, com identidade de partes, pedido e causa de pedir, em três tribunais diferentes: Cadaval, Torres Vedras e Alenquer; que a presente providência cautelar deve ser apreciada pelos tribunais administrativos, e não pelos tribunais civis, pois os actos em causa são de gestão pública e praticados no exercício de um poder público.

Após o que o Sr. Juiz proferiu despacho, julgando incompetente o tribunal comum (cível), nos termos do art. 101 e seguintes do CPC, por a providência requerida atacar directamente uma decisão administrativa (da Associação de Municípios), e, declarando competente o tribunal administrativo, absolveu a requerida da instância.

Do assim decidido recorreram os requerentes, de agravo, para o Tribunal da Relação de Lisboa.

Que, decidindo o recurso, concedeu provimento ao agravo, revogou a decisão recorrida, considerou materialmente competente o tribunal comum (cível), e determinou que o procedimento cautelar prossiga os seus termos no tribunal cível onde foi instaurado.

Recorre agora a requerida, também de agravo, para este STJ.

Alegando, concluiu como assim se resume: a) Face ao disposto no art. 212, nº3 da CRPortuguesa, a questão posta, que é a do tribunal materialmente competente (comum ou administrativo), passa por saber se no caso sub judice, estamos perante uma relação jurídico-administrativa ou jurídico-privada.

b) Qualquer que seja o critério doutrinário perfilhado quanto ao conceito de relação jurídico-administrativa (em função dos sujeitos, do objecto ou do fim), não apenas a decisão de autorização de localização, como também a construção e exploração do Aterro Sanitário do Oeste se inserem no âmbito de relações jurídicas administrativas com os particulares.

c) Por um lado, está em causa a actuação de uma entidade pública - a "F", como concessionária - na prossecução de um fim público: art. 2 do DL 294/94. de 16/11 d) Por outro, não apenas a autorização de localização, como a própria construção e exploração do Aterro estão vocacionados para a prossecução do interesse público: defesa do ambiente, pela valorização tratamento de resíduos sólidos urbanos.

e) Consequentemente, o julgamento da presente causa incide necessariamente sobre relações jurídico-administrativas, sujeitas à jurisdição administrativa: art. 212, nº3 da CRPortuguesa e art. 4, f) do ETAF.

f) A aplicação do art. 45 da LBA (lei de Bases do Ambiente, aprovada pela Lei 11/87, de 07/04) a relações jurídico-administrativas é claramente inconstitucional, por violação do art. 212, nº3 da CRP.

g) Por outro lado, o pedido de abstenção da requerida de continuação das obras corresponde materialmente a um embargo de obra de um concessionário - o que só é possível se estiverem em causa actos de gestão privada: art. 414 do CPC.

h) Acresce que o que os requerentes pretendem colocar em causa é a localização escolhida e autorizada por decisão administrativa, que consideram inidónea.

i) Ora, a declaração de (in)idoneidade do local é, por reserva de lei, da competência da Administração, designadamente das entidades previstas nos art. 9, 10 e 11 do DL 239/97.

j) As decisões administrativas, relativas à localização do Aterro, só poderiam ser postas em crise através de uma declaração judicial da ilegalidade de tais decisões, o que só é possível por via da jurisdição administrativa, nomeadamente através de recurso contencioso e eventual suspensão de eficácia e através de acção para reconhecimento de direitos.

k) O pedido de abstenção da requerida de continuar a construção do Aterro Sanitário, a fim de, alegadamente, se evitar a ocorrência de danos ambientais seria sempre acessório de um processo principal, em que se discutiria necessariamente a validade dos actos administrativos relativos à localização do Aterro. Ora, o Tribunal materialmente competente para o processo principal deverá ser o materialmente competente para o meio cautelar acessório daquele.

l) Ao decidir pela competência material do tribunal comum, o acórdão...

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