Acórdão nº 01S1957 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Abril de 2002 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelMÁRIO TORRES
Data da Resolução17 de Abril de 2002
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça, 1. Relatório A, intentou, em 1 de Março de 1994, no Tribunal do Trabalho das Caldas da Rainha, acção emergente de contrato individual de trabalho, com processo ordinário, contra B - Companhia de Seguros, SA, pedindo se declare o direito do autor a "uma percentagem de 2,5% sobre a produção total efectivamente cobrada desde 17 de Maio de 1971 relativamente às áreas abrangidas pelas agências da ré em Caldas da Rainha e Torres Vedras, sob a sua supervisão enquanto ao serviço activo da ré, declarando-se como integrantes do ganho do autor tanto a média mensal da referida percentagem como os subsídios fixos auferidos a título de ajudas de custo", tudo acrescido de juros legais sobre os montantes devidos pela ré

Aduziu, para tanto, em suma, que: (i) é empregado da ré, a cujo serviço foi admitido em 17 de Maio de 1971, com a categoria oficial de "auxiliar externo" e funcionalmente como gerente da sua agência em Caldas da Rainha, cargo que desempenhou ininterruptamente, sob a direcção e poder disciplinar da ré, até 31 de Dezembro de 1991, quando, por acordo, suspendeu a prestação de trabalho activo e passou à situação de pré-reforma; (ii) por carta de 6 de Maio de 1971 (documento de fls. 13 e 14), foram pormenorizadamente definidas as atribuições e funções do cargo então assumido pelo autor, consignando a ré que competiam ao autor a promoção e supervisão tanto da zona geográfica das Caldas da Rainha como das zonas de Alcobaça, Nazaré, Óbidos, Peniche, Bombarral e Torres Vedras, então integrantes da área da agência em foco; (iii) mesmo quando, em 1974, a ré abriu uma Delegação em Torres Vedras, retirando essa zona geográfica da área da agência das Caldas da Rainha, o autor continuou com o encargo de apoiar e supervisionar a sua actividade, quer no âmbito da produção, quer da cobrança; (iv) o exercício dessas funções não impedia a continuação da actuação do autor como mediador de seguros, que já era, e como tal auferir as comissões de angariação e/ou cobrança dos seguros angariados por si, constantes da tabela de fls. 15; (v) como funcionário da ré, o autor auferiu os ordenados, as diuturnidades e os suplementos que discrimina, a par das comissões auferidas autonomamente como mediador de seguros, o que tudo foi pago regularmente pela ré; (vi) até Janeiro de 1991, o autor teve igualmente direito a comissões de cobrança, relativas a prémios cobrados por intermédio da Agência em todos os ramos, fossem ou não angariados por si, comissões essas que a ré também lhe pagou normalmente; (vii) a título de ajudas de custo por deslocações, mas de facto em razão do seu cargo funcional, auferia o autor um ganho mensal fixo, que, nos cinco anos anteriores à sua passagem à situação de pré-reforma, atingiu os seguintes montantes mensais: 31 de Dezembro de 1987 - 60000 escudos; 31 de Dezembro de 1988 - 62000 escudos; 31 de Dezembro de 1989 - 67500 escudos; 31 de Dezembro de 1990 - 73000 escudos; 31 de Dezembro de 1991 - 81400 escudos; (viii) tal complemento - porque fixo, regular e periódico - integra o ganho mensal do autor, de acordo com o artigo 82.º do Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 49408, de 24 de Novembro de 1969 (doravante designado por LCT), mas a ré nunca teve este complemento fixo na devida conta para efeito de subsídios de férias e de Natal, nem tão-pouco o teve em conta no cálculo da sua remuneração mensal na situação de pré-reforma, fixada por acordo em 80% do seu anterior ganho mensal efectivo, pelo que o autor tem a receber da ré, relativamente aos 13.º e 14.º meses de subsídios "fixos", desde 1988 a 1991, o montante global de 526000 escudos, e, desde a sua passagem à situação de pré-reforma, está a ser lesado mensalmente, no cômputo da sua retribuição, em 65120 escudos (80% de 81400 escudos); (ix) conforme também expressamente consignado na mencionada carta de 6 de Maio de 1971, a ré concedeu ao autor, em razão do seu cargo, uma percentagem adicional de 2,5% sobre todos os prémios desde então efectivamente cobrados relativamente a todos os seguros angariados e/ou cobrados - directa ou indirectamente - em "Ramos Reais" (acidentes de trabalho, acidentes pessoais, incêndio, agrícola, transportes marítimos e aéreos, viagens, cristais, roubo, responsabilidade civil e riscos múltiplos), nas zonas acima expressamente referidas como integrantes da área da agência de Caldas da Rainha e da sua esfera de acção e responsabilidade, tendo no "Ramo Vida" essa percentagem adicional de 2,5% sido concedida apenas no seu primeiro ano de vigência; (x) em troca de correspondência com a Comissão Sindical, a percentagem adicional em causa - a que chama "rappel" - foi justificada e especificamente confirmada pela ré, nos seguintes termos (cfr. fls. 25): "O chamado «rappel» é concedido como incentivo em períodos ou zonas de difícil angariação, e tem como objectivo despertar um maior interesse e esforço nessa angariação. Passado o período considerado ou verificando-se uma melhoria da zona, a existência do «rappel» não tem qualquer justificação, mas como regalia concedida não pode ser retirada. Dos Delegados da Companhia apenas um o possui ..."; (xi) tal percentagem adicional, contudo, nunca foi paga pela ré, que, não obstante diversas vezes interpelada para o efeito, sempre foi protelando quer o seu pagamento, quer a sua liquidação, fosse por recusa de fornecimento dos elementos contabilísticos concretos necessários para o seu cálculo, fosse por respostas evasivas, fosse ainda por sugestão de compensações alternativas, a fim de não suscitar despeitas ou reivindicações similares por parte de outros funcionários, compensações essas, que, porém, nunca se concretizaram; (xii) o autor não possui elementos que lhe permitam apurar, global ou sectorialmente, os montantes anuais de produção - desde 1971 até ao presente - sobre os quais incide a percentagem adicional em causa, pelo que essa percentagem terá de ser liquidada em execução de sentença; (xiii) o seu montante global, uma vez liquidado, deverá igualmente ser tido em conta como parte integrante do ganho mensal do autor, com as legais consequências, quer em subsídios de férias e de Natal, quer no cômputo tanto da sua actual remuneração como da sua futura reforma

A ré contestou (fls. 33 a 48), defendendo-se por excepção e por impugnação. Por excepção, veio sustentar que, em anterior acção - que teria sido decidida no saneador -, o autor se limitara a pedir a comissão de 2,5% sobre os prémios de seguros efectivamente celebrados no âmbito da agência, nada reclamando, quando então já o poderia ter feito, a título de "percentagem adicional de 2,5%" ou "rappel", pelo que a dedução deste último pedido na presente acção não seria admissível por força do disposto no artigo 30.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho de 1981, que impõe ao autor o dever de cumular na petição inicial todos os pedidos que até à data da proposição da acção possa deduzir contra o réu, para os quais o tribunal seja competente em razão da matéria e desde que lhes corresponda a mesma espécie de processo. Excepcionou ainda a prescrição das comissões vencidas há mais de 5 anos ou, pelo menos, há mais de 20 anos, e dos juros vencidos há mais de 5 anos. Por impugnação, veio sustentar, em suma, que: (i) apenas se comprometeu a pagar ao autor pela sua actividade como mediador (cfr. artigo 30.º da contestação): (1) as comissões dos seguros por ele angariados no âmbito do contrato de mediação (que vigorou paralelamente ao contrato de trabalho), nos termos da tabela de fls. 15; (2) a comissão de 2,5% sobre os prémios efectivamente cobrados em todos os seguros angariados pelos outros agentes das áreas sob sua supervisão; e (3) uma comissão igual à diferença entre a comissão que fosse paga aos agentes e a constante da referida tabela, durante o primeiro ano de vigência do contrato, no ramo "Vida"; (ii) todas estas comissões foram regularmente pagas; (iii) nunca se comprometeu a pagar, para além das referidas comissões, qualquer "percentagem adicional" de 2,5%, sendo que a "comissão de cobrança" era também designada por "rappel"; (iv) as "ajudas de custo", apesar de regularmente pagas e de montante fixo, não podem ser consideradas retribuição, nos termos do artigo 87.º da LCT, quer por não terem sido previstas no contrato, quer por não excederem as despesas normais

Após resposta do autor (fls. 61 a 66), e frustrada tentativa de conciliação (fls. 90), foi proferido, em 28 de Novembro de 1994, o despacho saneador-sentença de fls. 91 a 95, que, além do mais: (i) julgou improcedente a excepção da falta de cumulação inicial de pedidos, pois "na acção proposta em 21 de Abril de 1993 não foi apreciado o mérito da mesma, mas sim absolvida a ré da instância por ineptidão da petição inicial, ineptidão esta que torna nulo todo o processo, mas não obsta a que o autor proponha uma nova acção sobre o mesmo objecto"; (ii) entendendo que o estado da causa permitia conhecer desde logo do seu mérito, julgou a acção parcialmente procedente e condenou a ré a pagar ao autor a quantia de 526000 escudos a título de subsídios "fixos" referentes aos subsídios de férias e de Natal dos anos de 1988 a 1991, bem como a percentagem de 2,5% sobre a produção total efectivamente cobrada, desde Janeiro até Dezembro de 1991, pela Agência de Caldas da Rainha e Torres Vedras, que se liquidar em execução de sentença, ambas as quantias acrescidas de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento, absolvendo a ré do restante pedido, designadamente o relativo à "percentagem adicional de 2,5%". Para tanto, após elencar os factos considerados provados por acordo das partes, por confissão e por documentos, nessa decisão foi sucessivamente entendido que: (i) a relação entre autor e ré integrava um contrato misto (um contrato de trabalho com cláusula de contrato de prestação de serviço); (ii) sendo um contrato de trabalho, não se verifica a...

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