Acórdão nº 02A4726 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Fevereiro de 2003
Magistrado Responsável | PONCE DE LEÃO |
Data da Resolução | 18 de Fevereiro de 2003 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça Por apenso aos autos de falência da A, que corre seus termos na Comarca de Caminha, a B, reclamou o crédito de 18.894.795$00, tendo alegado que o mesmo goza de privilégio mobiliário geral, com o fundamento em saques de valores autorizados pela credora reclamante para evitar perturbações nos pagamentos por parte da empresa falida, durante o período de observação. O liquidatário judicial emitiu parecer no sentido de tal crédito ser reconhecido. Foi proferida sentença que julgou o crédito da reclamante "B" verificado pelo montante indicado, o qual foi graduado, quanto aos bens móveis, em 3º lugar, com os demais créditos, em pé de igualdade. Inconformada, a B, veio interpor recurso de apelação para o Tribunal da Relação do Porto, que a julgou procedente, e, em consequência, revogou a sentença recorrida (na parte impugnada), e graduou o crédito da recorrente nos moldes seguintes: a) Quanto aos bens móveis a que se refere a al.A) da sentença, logo a seguir ao crédito com o nº 101 (garantido por penhor mercantil); b) Quanto aos bens móveis a que se refere a al. B), logo a seguir ao crédito nº 112 (também garantido por penhor mercantil); c) Quanto aos veículos automóveis a que se refere a al. C), logo em primeiro lugar; d) Quanto aos bens móveis a que se refere a al. D), também em primeiro lugar. Foram dados como provados os factos seguintes: a) Na sentença tiveram-se por provados os seguintes factos, pertinentes para o conhecimento do mérito do recurso: 1. Após o despacho de prosseguimento da acção, a empresa contactou a B, dando-lhe conta das suas dificuldades económicas; 2. Para evitar perturbações nos pagamentos, a falida solicitou que a B a autorizasse a sacar regularmente valores para além do saldo que em cada momento dispusesse na sua conta bancária; 3. Obrigando-se, em troca, a falida a pagar juros de 10% sobre cada valor assim sacado; 4. B, concordou com tal proposta acreditando que a empresa viria a ultrapassar as dificuldades em que se encontrava. 5. Findo o período de observação da empresa, esta tinha sacado na B o montante de 18.894.795$00. b) Considera-se ainda assente o seguinte: 6. No requerimento de reclamação do seu crédito a B invocou que o fazia ao abrigo do disposto no artº 65º do C.P.E.R.E.F. 7. O liquidatário judicial emitiu parecer no sentido de o crédito ser de verificar. 8. O Mmo Juiz fez constar da sentença que "a reclamante conseguiu provar o que alegava quanto à forma e período como o crédito foi concedido, pelo que o mesmo deve ser reconhecido nos exactos termos da reclamação, como aliás já era admitido pelo liquidatário judicial no seu parecer". Perante esta factualidade, o acórdão recorrido fez o seguinte enquadramento jurídico: "1º...vemos ter sido suscitada a questão de saber se o crédito da apelante goza de privilégio imobiliário geral por estar abrangido pela previsão do nº 1 do artº 65º do C.P.ER.E.F.. 2º Dispõe esta norma o seguinte: "Os créditos constituídos sobre a empresa, em capital e respectivos juros, depois de proferido o despacho de prosseguimento da acção e antes de findo o período de observação, gozam de privilégio mobiliário geral, graduado antes de qualquer outro crédito, sem prejuízo do disposto no nº 5 do artº 34º, desde que o juiz, mediante proposta do gestor judicial com parecer favorável da comissão de credores, os tenha declarado contraídos no interesse simultâneo da empresa e dos credores". São, assim, requisitos para a atribuição de privilégio mobiliário geral. a) Que os créditos hajam sido constituídos sobre a empresa depois de proferido o despacho de prosseguimento da acção (de recuperação.- cfr. artº 25º) e antes de findo o período de observação (da empresa: vd. Artº 28º al. c)); b) Que esses créditos tenham sido contraídos no interesse simultâneo da empresa e dos credores; c) Que o juiz, mediante proposta do gestor judicial com parecer favorável da comissão de credores, assim declare tais créditos. Conforme salientam Carvalho Fernandes e João Labareda no C.P.E.R.E.F. Anot., pg. 209 - nota 6 - "a justificação da atribuição de privilégio aos créditos contraídos nos termos do nº 1 assenta na necessidade de garantir à empresa em recuperação os meios mínimos indispensáveis para manter a sua actividade, em termos de ficarem asseguradas as condições indispensáveis à sua viabilidade, que frequentemente se perderá se a empresa paralisar a laboração. Dada, porém, a fase em que se encontra, dificilmente haverá quem se disponha a correr risco de crédito, se este não ficar salvaguardado em condições mais vantajosas que as dos já existentes. O regime do nº 1 procura, pois, encontrar um compromisso entre a necessidade de tutela dos credores já constituídos e dos que, a final de contas, no interesse daqueles e da própria empresa, se dispõem a conceder novos apoios". 3º Vejamos, então, se os pressupostos previstos no artº 65º nº 1 se verificam no caso concreto. Relembremos os factos provados. a) No requerimento apresentado, a fls. 16/19, a apelante alegou que o dito crédito que reclamava goza de privilégio mobiliário geral, invocando, para tanto, o disposto no artº 65º do C.P.E.R.E F.. b) Esse crédito foi impugnado pelo credor - C - por falta de prova documental que o sustentasse; c) No parecer que apresentou, a fls. 20 e 21 (e onde se faz referencia à dita impugnação), o liquidatário judicial entendeu que "o crédito reclamado pela B está conforme a contabilidade da falida, havendo prova suficiente para o sustentar, pelo que é de verificar. d) Tal crédito - de 18.894.795$00, correspondente a capital e juros, foi judicialmente reconhecido nos exactos termos da reclamação por ter a reclamante provado o que alegava, a saber: e) Após o despacho de prosseguimento da acção, a empresa contactou a B, dando-lhe conta das suas dificuldades económicas; f) Para evitar perturbações nos pagamentos, a falida solicitou que a B a autorizasse a sacar regularmente valores para além do saldo que em cada momento dispusesse na sua conta bancária; g) Obrigando-se, em troca, a falida a pagar juros...
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