Acórdão nº 02B3010 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Novembro de 2002 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelARAÚJO BARROS
Data da Resolução28 de Novembro de 2002
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: "A" intentou, no Tribunal de Círculo de Portalegre, acção declarativa com processo ordinário, contra B, peticionando a condenação do réu a reconhecer que a autora foi instituída pela Junta de Freguesia de ... no cumprimento da obrigação imposta pelo testamento do seu falecido pai, a reconhecer a propriedade da autora sobre os bens móveis e imóveis que fazem parte do legado, bem como a determinação do cancelamento das inscrições de nua propriedade, a favor do réu, sobre os bens imóveis. Alegou, como fundamento: - do testamento de C, falecido em 23 de Janeiro de 1971 e da decisão do Tribunal Judicial de Fronteira de 19 de Fevereiro de 1972, parcialmente alterada pelo Acórdão da Relação de Lisboa de 7 de Fevereiro de 1973 (que declararam válido o legado do usufruto por trinta anos de uma moradia com cerca de 24 divisões em dois pisos, livros e algumas curiosidades arqueológicas a que o testador deu o nome de "A" e para cuja preservação e custeio aquele destinou não apenas a totalidade do edifício da sua instalação na Vila de ..., com todo o seu recheio de mobiliário, livros, documentação e curiosidades arqueológicas, mas ainda a sua herdade de "..." e o olival denominado do "...", no sítio do Estacal, deixados à Junta de Freguesia do ...) com o encargo de instituir oficialmente, no prazo de 30 anos, a "A", alegadamente sem reversão à herança decorrido aquele prazo e agora em propriedade plena perfeita no domínio da Junta, resulta a aquisição dos bens legados pela autora; - por deliberação da referida Junta de Freguesia de 15/11/97, aquela entregou-lhe os referidos bens, os quais constituem o seu património; - o réu, filho único e universal herdeiro do testador, não reconhece o domínio da autora sobre os mencionados bens, designadamente após o termo daqueles 30 anos, tendo registado, a seu favor, na Conservatória do Registo Predial de Avis, a nua propriedade dos imóveis. Contestou o réu, sustentando que a deixa a favor da Junta de Freguesia de ... foi apenas do usufruto por 30 anos, pelo que, findo este período em 23 de Janeiro de 2001, o usufruto se extinguiu, pelo que adquiriu a propriedade plena dos referidos bens. No despacho saneador, o Mmo. Juiz, considerando-se habilitado a conhecer do mérito da causa, proferiu decisão em que julgou a acção improcedente e absolveu o réu do pedido. Apelou a autora, com êxito, uma vez que o Tribunal da Relação de Évora, em acórdão de 30 de Setembro de 1999, julgando procedente a apelação, condenou o réu B a reconhecer que ela, autora - a "A" - foi instituída pela Junta de Freguesia de ... no cumprimento da obrigação imposta por C, seu pai, no respectivo testamento; e a reconhecer a propriedade da autora - a "A" - sobre os bens móveis e imóveis que fazem parte do legado; e ainda determinou o cancelamento das inscrições da nua propriedade, a favor do réu, sobre os bens imóveis. Interpôs, então, o réu (substituído entretanto pelos seus sucessores habilitados, D, E, F, G e H) recurso de revista, pretendendo a revogação do acórdão recorrido, com a absolvição dos ora habilitados de todos os pedidos. Em contra-alegações pugnou a autora pela negação da revista. Verificados os pressupostos de validade e de regularidade da instância, colhidos os vistos, cumpre decidir. Concluíram os recorrentes as suas alegações pela forma seguinte (sendo, em princípio, pelo seu teor que se delimitam as questões a apreciar no âmbito do recurso - arts. 690º, nº 1 e 684º, nº 3, do C.Proc.Civil): 1. O cerne da presente lide tem a ver, basicamente, com a situação jurídica de determinados bens, móveis e imóveis, que integravam a herança de C e cuja propriedade plena a autora pretende que lhe seja reconhecida por a haver adquirido da legatária Junta de Freguesia do .... 2. Os pedidos que a autora, a "A", formulou na petição inicial e que o acórdão recorrido acolheu são três: 1º pedido - a condenação do filho do testador, Eng. B, a reconhecer que a "A" foi instituída pela Junta de Freguesia do ... e no cumprimento da obrigação imposta pelo testador em simultâneo com a instituição da disposição legatária do testamento deste a favor da Junta de Freguesia do ...; 2º pedido - a condenação do filho do testador a reconhecer que pertencem em propriedade plena à "A" os bens imóveis e os bens móveis identificados no art. 1º da petição; 3º pedido - o cancelamento das inscrições a favor do Eng. B da nua propriedade sobre esses bens imóveis. 3. O acórdão recorrido, embora reconhecendo expressamente que o objecto do recurso se define e delimita pelas conclusões da alegação e ainda que transcrevendo textualmente as conclusões A, B, C e D da apelante "A", acaba por não tomar conhecimento delas, pois se limita à mera condenação do réu no primeiro pedido da acção, sem para tanto enunciar quaisquer fundamentos de facto ou de direito. 4. Assim, pois, e nesta medida, o acórdão recorrido é nulo - CPC, art. 668º, nº 1, al. b), aplicável por força do disposto nos arts. 713º e 716º do mesmo Código. 5. A "A" foi instituída pelas 10 pessoas singulares, que, a título pessoal, outorgaram a escritura pública de 27.10.95 e não pela Junta de Freguesia do ..., que não foi parte da mesma escritura. 6. A escritura pública de 24.02.97, dita de "aclaração", é absolutamente ineficaz como alteração do acto pelo qual se instituiu em 27.10.95 a "A". 7. Tal escritura pública de 24.02.97 não vale como acto de instituição desta "A", antes de mais porque a vontade nela declarada pelos seus dez outorgantes não é a de instituir uma fundação, mas sim e diferentemente a vontade de aclarar ou rectificar um acto por eles mesmos outorgado quase dois anos antes (a escritura pública de 27.10.95). 8. Acresce que a escritura dita de "aclaração" deveria conter e não contém, no seu intróito, a denominação da pessoa colectiva que nela fosse parte e que os outorgantes representassem, com a indicação da sua sede (C. Notariado, art. 461º, nº 1, c), bem como a menção, pois se trata de um caso de representação legal e orgânica, dos documentos que justificariam as qualidades invocadas e da verificação dos poderes necessários para o acto (C. Not., art. 461º, nº 1, e). 9. A não se julgar nulo por falta de fundamentação, nos termos dos arts. 668º, nº l, al. b), 713º e 716º CPC, o acórdão recorrido, ao decretar a procedência do 1º pedido da acção, violaria frontalmente o disposto nos arts. 46º, nº l, als. c) e e) do Cód. do Notariado e 185º, nº 3, C. Civ. 10. O acórdão recorrido condenou o réu B a reconhecer a propriedade plena da autora, a "A", sobre os mencionados bens móveis e imóveis por esta os haver adquirido da Junta de Freguesia do .... 11. Todavia, o legado deixado à Junta de Freguesia do ... havia sido já declarado válido não como legado de propriedade plena, mas sim como legado de usufruto por trinta anos (por virtude da limitação imposta às pessoas colectivas nos arts. 1443º e 2258º do Cód. Civil), nos termos do saneador-sentença proferido pelo Tribunal Judicial de Fronteira na acção que ali correu seus termos sob o nº 15/71 entre o Eng. B, como autor, e como réus D. I, a Junta de Freguesia do ... e os demais legatários e do acórdão de 7 de Fevereiro de 1973 do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido no respectivo recurso de apelação, que o Supremo Tribunal de Justiça veio confirmar por acórdão de 8 de Fevereiro de 1974 (certidão de fls. 236 a 279). 12. Assim, os termos em que a sucessão de C se processou estão já definitivamente apurados, por decisão transitada em julgado, cujo sentido e alcance não pode ser posto em causa por quem quer que seja que tenha adquirido ou venha a adquirir o seu direito, na sequência da respectiva sucessão. 13. Tal decisão foi proferida em processo judicial que teve como partes todos os sucessores do testador C - seu filho e único herdeiro universal, B e todos os legatários, designadamente a Junta de Freguesia do ... - pelo que essa decisão não pode deixar de valer para quem tenha adquirido ou venha a adquirir direitos patrimoniais dele próprio testador, ou de qualquer um dos sucessores deste. 14. O legado feito por C à Junta de Freguesia do ... é, consoante se encontra definitivamente acertado, para não mais poder ser posto em causa, um direito de usufruto por 30 anos, cabendo a nua propriedade dos mesmos bens ao único herdeiro universal, filho do testador, Eng. B. 15. O caso julgado que se formou é sobre o próprio conteúdo da decisão - é um legado de usufruto pelo prazo de 30 anos e não um legado de propriedade plena à Junta de Freguesia do .... 16. É esta decisão transitada em julgado que constitui o título de aquisição do direito da Junta de Freguesia do ... sobre os referidos bens imóveis e móveis. 17. A Junta não pode ter transmitido à "A" senão o direito que tem: se a Junta é titular de um direito de usufruto temporário não poderia ter transmitido à "A" um direito de propriedade plena sobre os mesmos bens, mas apenas esse preciso direito de que era titular. 18. A "A" é, na tese do próprio acórdão recorrido, sucessora da situação jurídica da Junta de Freguesia sobre os mesmos bens, pelo que o caso julgado formado quanto a esta pelo mencionado acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 7 de Fevereiro de 1973 vale, nos seus precisos termos, para a "A", conforme resulta do disposto no art. 498º, nº 2, CPC e ao contrário do que sustenta o acórdão recorrido. 19. A não ser assim, continuar-se-ia a discutir eternamente qual o direito adquirido pela Junta de Freguesia do ... e que esta, subsequentemente, teria transmitido à "A". 20. Já foi acertado definitivamente (face à Junta de Freguesia do ..., de quem o acórdão recorrido tem a "A" como sucessora), que o direito do ora réu é um direito de nua propriedade. 21. Ao declarar que a "A" autora tem direito de propriedade plena sobre os bens móveis e imóveis que são objecto do legado do testador, por o haver adquirido da anterior proprietária plena, Junta de Freguesia do ..., viola o acórdão recorrido o disposto nos arts. 2281º, nº...

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