Acórdão nº 02B3969 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Janeiro de 2003 (caso NULL)
Magistrado Responsável | QUIRINO SOARES |
Data da Resolução | 09 de Janeiro de 2003 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. "A" e B pediram, contra C e D, a declaração de nulidade da venda que o réu C, enquanto procurador da primeira autora e de seu falecido marido (pai da segunda autora) fez à ré D, e a restituição do prédio objecto daquele negócio nulo ao património das autoras; fundamentaram na nulidade do contrato por causa de simulação e de falta de poderes de representação do declarante vendedor. Os réus opuseram que o prédio já pertencia ao réu C, por efeito de doação feita pela autora A e marido à filha, a autora B, com quem o réu era, então, casado, e posterior acordo de partilhas de divórcio, no qual o prédio foi adjudicado ao réu (actos estes realizados nos EUA, Estado de Califórnia). · As instâncias deram pleno ganho de causa às autoras, mas foram diferentes as respectivas motivações. Na sentença, a fundamental razão de decidir foi considerar que a venda, em que o réu C interveio como procurador dos vendedores, dissimulou uma doação e que, para esta última, o procurador não tinha poderes, sendo, por isso, um acto ineficaz relativamente aos mandantes; sobre os negócios e actos jurisdicionais ocorridos na Califórnia, designadamente, sobre a doação que a autora A e marido fizeram a sua filha B, e sobre a partilha dos bens do casal desta última com o réu C, a sentença é completamente omissa, não obstante a defesa dos réus assentar essencialmente aí. A Relação de Lisboa trouxe para a discussão esses elementos, que acrescentou à matéria de facto, mas considerou que a doação não vale porque não chegou a ser aceite pela donatária e que o acordo de partilhas também não, porque, na parte que toca ao prédio sito na Madeira, que fora objecto da doação, o tribunal de Califórnia era incompetente para o homologar, face à lei de processo portuguesa (artº65º-A., nº1, CPC (1)); sobre a compra e venda em que o réu C interveio como procurador dos vendedores, a Relação entendeu que foi um acto simulado, através da fictícia intervenção, como compradora, da ré D, para dissimular uma compra e venda do procurador consigo próprio. 2. O réu C pede, agora, revista, que fundamenta assim: · era das autoras o ónus da prova de que a donatária não tinha aceite a doação pela forma solene exigida pela lei portuguesa; · a invocação de nulidade da doação constitui venire contra factum proprium, que deve ser contrariado, com fundamento em abuso de direito; · nos países, como os EUA, onde a doação foi feita, esta é concebida como um acto unilateral, e, por isso, mesmo que outro entendimento seja de ter acerca do supra referido ónus de prova, sempre haveria de se ter como válida a doação, tendo em conta os artº31º, nº2 e 36º, nº1, CC (2); · o acordo de partilhas celebrado entre o réu C e a autora B, por ocasião do processo de divórcio, é válido, tanto face ao direito local (Califórnia) como face ao direito português; · a decisão homologatória do juiz californiano é, em todo o caso, um acto de jurisdição voluntária, que não carece, em Portugal, de revisão e confirmação; · a compra e venda dita simulada não passa de uma real venda, com intenção fiduciária. As autoras contra - alegaram em defesa do julgado. 3. Cumpre, agora, decidir, principiando pela matéria de facto definitivamente julgada assente pela Relação, que é a seguinte: · J, faleceu nos Estados Unidos da América no dia 19 de Abril de 1989, e sucederam-lhe A, sua viúva, e B, sua filha; · A autora B nasceu nos Estados Unidos da América, onde sempre viveu, e casou catolicamente com o réu C, irmão da ré D, no dia 9 de Setembro de 1972, na Igreja Paroquial da Freguesia da Sé, Funchal; · no dia 4 de Março de 1986, perante o notário público E, no cartório situado no nº1120 E. 14th St., San Leandro, Estado da Califórnia, Estados Unidos da América do Norte, F e o cônjuge A declararam em instrumento de procuração constituírem bastante procurador C , a quem concederam, com a faculdade de substabelecer, todos os poderes necessários para, na Região Autónoma da Madeira, ao abrigo das leis vigentes e em nome dos outorgantes, dividir, comprar, vender, partilhar e licitar, e ainda, sujeita a aprovação dos outorgantes, constituir servidões, onerando ou beneficiando prédios que lhe pertençam, aceitando quitações, outorgar e assinar as respectivas escrituras, e bem assim quaisquer contratos de compra...
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